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o verdadeiro problema que as offshores ocultam

11 Abril, 2016
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As últimas três décadas foram pródigas na criação dos chamados «crimes económicos contra o Estado», mais popularizados por «crimes fiscais». As consequências dessa overdose legislativa foram diversas e graves: criaram-se verdadeiros abortos jurídicos com os quais se entupiram os tribunais (o «crime de abuso de confiança fiscal», por exemplo) e se impede o julgamento de assuntos verdadeiramente relevantes;  puseram-se  em causa direitos fundamentais existentes em qualquer estado de direito democrático (com a inversão do ónus da prova em questões tributárias ou a impossibilidade prática de defesa no crime de abuso de confiança fiscal, por exemplo); e desvirtuou-se e relativizou-se a verdadeira função do Direito Criminal, que deve ser a da prevenção e castigo dos actos que verdadeiramente põem em risco os valores individuais e sociais fundamentais, a saber, a vida, a propriedade e a segurança dos cidadãos.

Na génese desta fúria legislativa e criminalizante está a ideia estatista de que um crime contra os interesses do estado é duplamente grave, porque põe em causa, simultaneamente, esses interesses directos e os interesses indirectos de todos os cidadãos que o estado os representa. Ora, esta ideia é absurda, porque um crime de falsificação de documentos será sempre um crime de falsificação de documentos, seja contra um cidadão, uma empresa privada ou o fisco; porque um crime de furto será sempre um crime de furto, seja contra quem for, e por aí em diante. Pelo que não há qualquer razão para tipificar – e agravar – distintamente os actos que são cometidos contra o estado e, pior do que isso, há todas as razões para o não fazer, visto que, nessa posição privilegiada, o estado acaba por ter primazia sobre as pessoas, descurando a defesa dos interesses destas, e sobrepondo-lhes – a montante e a jusante – os seus.

E aqui está a questão de fundo que explica esta intensa actividade legiferante e a eterna perseguição às offshores, ao sigilo bancário e a outros supostos atentados aos interesses tributários do estado. Como, nas últimas décadas, os estados europeus têm, na generalidade, sido geridos de modo despesista e perdulário por governantes que nunca são responsabilizados pelas graves consequências dos seus actos, as contas públicas estão cada vez mais desequilibradas por parte da despesa, e os estados, para taparem os buracos da sua péssima gestão, aumentam as cargas tributárias de modo absurdo, impondo aos cidadãos impostos directos e indirectos que deveriam ser inconstitucionais. Deste modo, boa parte de quem recorre a essas contas offshores fá-lo porque, na origem dos seus capitais, encontram-se estados rapaces e com uma voracidade contrária a tudo o que é admissível. Estas pessoas defendem, no fim de contas, o seu legítimo direito de propriedade contra governos que o põem em causa em vez de o defenderem, como seria sua obrigação constitucional e moral. E quem, por outro lado, vai para as offshores esconder dinheiro de actos verdadeiramente criminosos, só está a beneficiar da inoperância preventiva de estados que, em vez de aplicarem os seus recursos na prevenção do crime, andam preocupados em extorquir dinheiro às pessoas para limparem os seus balanços. Sendo que, muitas vezes, uns e outros, criminosos e governantes, são os mesmos. Como bem se está a ver dos papéis do Panamá, agora revelados.

30 comentários leave one →
  1. procópio permalink
    11 Abril, 2016 11:15

    No ventre pútrido dos estados estão os verdadeiros promotores das offshores.
    Pela frente seriedade, por detrás sagacidade. Em cima de nós a extorsão.
    Os panama papers vieram emprestar colorido, mas são os jornalistas que selecionam quem deve ser exposto à populaça. Um jornalismo a preceito.
    A cia e soros a encostar à parede quem se atreve a opor-se à nova ordem mundial (nwo).
    Os pategos que comprem os pasquins e as donas de casa que se escandalizem com os desaforos. Entretanto escondem-se as verdadeiras questões.

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  2. honi soit qui mal y pense permalink
    11 Abril, 2016 11:24

    O que quer dizer é que se tenta libertar da extorção fiscal .
    Tal como o destino dos impostos parece se destinar cada vez mais a praticar á compra dos sagrados votos … não admira que os srviços das offshores sejam necessárias .

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  3. Almeida permalink
    11 Abril, 2016 11:28

    Do texto do Rui a. conclui-se que o fundamental é controlar o modo como os impostos são gastos pela direcção política da estrutura Estado. Isto, porque um offshore introduz sempre uma injustiça: mesmo que por motivos legais, só dele pode beneficiar quem tem mais dinheiro. Assim sendo, isso faz recair o peso dos impostos em quem tem menos.

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    • honi soit qui mal y pense permalink
      11 Abril, 2016 12:03

      o que nesse caso faria sentido era saber e denunciar com rigor para onde o dinheiro dos impostos vai para além da compra de votos …
      e caso a coisa se verifique desiquilibrada , para a compra de votos , forçar a agenda offshore a preços baixos para todos o cidadão …
      a Caixa Geral de Depositos o nosso banco de todos nós facilitaria como broker a todos os cidadãos independentemente das posses a possibilidade de colocação das poupanças num qualquer tax heaven , ao invés deste nosso tax hell
      assim os partidos “compra votos ” teriam tb de se ver forçados a reconhecer que as suas ditas politicas de expanção não são mais que um “esquema” para manter toda a gente na pobreza , e garantir os votos …

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  4. LTR permalink
    11 Abril, 2016 11:35

    Com os RERT a decorrerem periodicamente, depois a gente admira-se que apareçam artistas na TV com cara de pau dizer que têm tudo legal porque pagaram os 7%, como passou há dias na TV.

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  5. ali kath permalink
    11 Abril, 2016 12:05

    ou Panamá ou cofre em casa

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  6. piscoiso permalink
    11 Abril, 2016 12:37

    Muita dessa “fúria legislativa”, insere-se na luta contra o terrorismo.

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  7. Arlindo da Costa permalink
    11 Abril, 2016 12:55

    O dinheiro nunca esteve no Panamá. Anda aqui, na Europa, e está ao dispor dos sacrossantos «mercados». Mas há gente tola que pensa que o dinheiro voou para lugares longíquos…

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  8. piscoiso permalink
    11 Abril, 2016 15:02

    O verdadeiro problema que as offshores ocultam é o financiamento do terrorismo.
    O resto são peanuts.

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  9. 11 Abril, 2016 15:59

    Excelente post.
    Os Estados, pelo lado da cobrança de impostos, não têm grande preocupação em ser justos. Pelo contrário: cobrar com controlo -não equitativamente- é apenas uma semi-obscura ferramenta de domínio e proveito político.
    Em tempo de um obsoleto formato de IRS pergunta-se qual é a despesa do Estado -em meios humanos, informática associada e património- para cobrar 1.000 Euros?.
    E as despesas, e outros incómodos, do próprio contribuinte?.
    Curiosa a bandeira da “flat tax” apregoada por candidatos a PR nos EUA, neste momento.

    Os Estados, pelo lado de redistribuição, só fomentam, a seu interesse, iniquidades que destroem insofismavelmente equilíbrios sociais. Será mesmo indispensável tanta “dispendiosa”, e politicamente orientada, intervenção do Estado em actividades que melhor podiam estar, e continar a estar, no privado?.
    Quanto mais num burocrático supra-Estado, a dita “europa”. Obviamente que não.

    Entretanto tudo, o País e a “europa”, em crescentes crises sentidas pelas populações em geral. Tudo isto politicamente numa aterradora impunidade eleitoral.

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  10. 11 Abril, 2016 17:06

    JSócrates está cada vez mais pifado:
    Ao El Pais, volta a declarar que a sua detenção e averiguações foi para impedir que se candidatasse à Presidência da República e, estabelece um paralelismo entre o que lhe está a acontecer e o as “perseguições” ao Lula e à Dilma.
    (in blog da Rádio Renascença).

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  11. Fernando S permalink
    11 Abril, 2016 17:19

    Almeida (11 Abril, 2016 11:28) : “um offshore introduz sempre uma injustiça: mesmo que por motivos legais, só dele pode beneficiar quem tem mais dinheiro. Assim sendo, isso faz recair o peso dos impostos em quem tem menos.”

    Começando pelo fim : em Portugal, 80% do imposto sobre o rendimento é pago por apenas 16% dos contribuintes e quase metade … não paga imposto !…
    O problema não é portanto que os que têm menos pagam mais porque os que têm mais pagam menos.
    O problema principal é que os que pagam pagam muito porque o Estado gasta muito.
    E toda a gente sabe que uma carga fiscal excessiva é péssima para a economia, logo para as pessoas, a começar pelas que têm menos (e não pagam impostos).
    As “offshores” são ainda uma das poucas escapatórias que existem à voracidade e rapacidade fiscal dos Estados.
    Através delas as pessoas e as empresas tentam evitar a tributação excessiva de tudo o que mexe, contornar duplas e triplas imposições, concentrar recursos e património em contas e holdings preservadas e a partir das quais podem gerir aplicações e investimentos nos melhores negócios e nas melhores localizações.
    E tudo isto, pelo menos até vêr, legalmente.
    Na verdade, as “offshores” não são proibidas e uma parte muito significativa do dinheiro que nelas é posto já foi tributado na origem.
    Diz o Almeida que “só os ricos podem beneficiar delas” …
    Bom, formalmente não é verdade : qualquer pessoa e empresa, rico ou pobre, pode abrir uma conta “offshore” e pôr lá o seu dinheiro.
    Se quizer e tiver dinheiro para lá pôr, naturalmente.
    Como é evidente, uma verdade de La Palice, os ricos têm mais dinheiro do que os pobres (ou não ?!…) pelo que é perfeitamente natural que sejam aqueles e não estes os principais (ou mesmo exclusivos) utilizadores daquelas contas.
    Não é nenhuma “injustiça”, é a ordem das coisas.
    De resto, os pobres, a quem não sobra dinheiro, não têm própriamente o problema de o gerir e de o aplicar. (Imagino que não se importassem de ter um “problema” destes mas a verdade é que não têm).
    Esse é portanto um problema dos ricos.
    Mas os pobres também podem beneficiar, indirectamente, pelo facto dos ricos terem a possibilidade de acumular e aumentar fortunas e conseguirem aplicá-las em investimentos e consumos produtivos, que criam empregos e riqueza, que contribuem para o aumento do bem-estar geral.
    Querer acabar e esvaziar de sentido as “offshores” é o pior serviço que se pode fazer aos pobres !!

    Dito isto, é verdade que existe um outro problema : as “offshores” são também utilizadas para actividades ilegais e criminosas (evasão fiscal, corrupção, tráficos, terrorismo, etc).
    Como tantos outros meios e intrumentos que são úteis e progressos na vida dos homens podem ser também utilizados para fins ilegais e criminosos.
    Mas não é por isto que se acabaram com esses meios e instrumentos e que se recusaram esses progressos.
    O que é preciso, como em tudo o mais na vida, é separar o trigo do joio e combater e reprimir as más utilizações dos bons instrumentos de progresso e bem-estar.
    Os governos dos Estados nacionais e das organizações internacionais devem naturalmente procurar combater essas utilizações logo apartir dos seus proprios territórios e estabelecer mecanismo de colaboração com os paises onde existam “offshores” no sentido de evitar que estas sejam utilizadas para fins ilegais e criminosos.
    Mas, atenção para não deitar fora o bébé juntamente com a água suja que serviu para o lavar !!

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    • Almeida permalink
      12 Abril, 2016 11:25

      “O problema não é portanto que os que têm menos pagam mais porque os que têm mais pagam menos”.

      Falso! Não é possível tirar essa conclusão do raciocínio avançado como suporte.

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      • Fernando S permalink
        12 Abril, 2016 14:13

        O problema principal é que a carga fiscal em Portugal é já globalmente demasiado elevada.
        Baixar esta carga global não tem a vêr com cobrar mais aos ricos e menos aos pobres.
        Basicamente tem a vêr com cobrar menos a quem paga.
        Acontece que quem paga e quem paga mais são precisamente os que têm mais.
        Isto porque o imposto é excessivamente progressivo e concentrado.
        O que é um problema em si, na medida em que é uma situação injusta, contraproducente em termos de receitas fiscais, e negativa para o investimento e para a economia (logo, indirectamente, para as receitas fiscais).
        Ou seja, para que a carga fiscal em Portugal possa baixar é preciso, em primeiro lugar, que o Estado seja menos gastador e possa baixar os impostos em geral e, complementarmente, que os impostos sejam mais repartidos (menos progressivos) de modo a serem mais favoráveis ao crescimento da economia.
        Ou seja, mais do que pedir ainda mais aos que já pagam mais, o que é preciso é, quando muito, repartir melhor de modo a que uma parcela maior dos que pagam menos ou não pagam passem também a pagar algo mais.
        O imposto deve ser menos progressivo e ter uma base mais alargada.
        Quando fôr assim poderemos então voltar a falar de “offshores” !!….

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      • Almeida permalink
        12 Abril, 2016 15:06

        “Acontece que quem paga e quem paga mais são precisamente os que têm mais”.

        Não é verdade. Paga mais, quem DECLARA mais.

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      • Fernando S permalink
        12 Abril, 2016 15:31

        E quem declara mais são os que TÊM mais.
        (incluindo a maioria de uma minoria que procura optimizar e fugir ao fisco colocando APENAS UMA PARTE do respectivo património em contas e sociedades “offshore”)

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  12. Joao permalink
    11 Abril, 2016 18:05

    Só existem paraísos fiscais porque temos estados terroristas fiscais.

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  13. Tiradentes permalink
    11 Abril, 2016 19:02

    A luta continua…contra os estados “fássistas” fiscais é dever de todo o proletariado fazer um depósito numa off-shore.
    E quem não o faz é um reaccionário

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  14. lucklucky permalink
    11 Abril, 2016 20:13

    É o ataque das Democracias à Liberdade.

    Estamos assistir à formação das Democracias Totalitárias.

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  15. silva permalink
    11 Abril, 2016 20:31

    Rir no Casino Estoril o maior antro de corrupção e de traficância de influencias, investiguem o pagamento de casas a juízes através de OFFSHORES para desmantelar o despedimento colectivo ilegal.e como o homem do cachimbo tenta nos média dar ar de boa pessoa.

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  16. 12 Abril, 2016 09:40

    “está a ideia estatista de que um crime contra os interesses do estado é duplamente grave”

    Ponto muito relevante, pois parece-me existir em Portugal uma lacuna muito grave na compreensão da regra de que num estado de direito todos são iguais perante a lei, incluindo o Estado.

    Faz-nos muita falta um inventário dos casos em que nos mais variados dominios se viola este princípio de um estado de direito. Temo que tal dará um rol muito extenso, mas mesmo assim esperemos que alguns juristas que leiam este blogue prestem esse serviço relevante a Portugal. Aqui fica o desafio.

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