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Mariana: Contabilidade e Falta de Senso

17 Junho, 2016
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A imagem que tenho da Mariana Mortágua é a de alguém que consegue dizer os maiores absurdos mantendo uma calma olímpica. A Mariana faz afirmações aparentemente fundamentadas. A forma como o diz faz com que se acredite e muita gente quer  mesmo acreditar nela. Mas a verdade é que das poucas vezes que tentei confirmar afirmações quantificadas feitas pela Mariana nada batia certo.

Vem isto a propósito de um artigo que a Mariana publicou há uns dias no JN chamado Caixa: Sensibilidade e Bom Senso, já aqui referido pelo Gabriel.

Um dos primeiros parágrafos reza assim:

“A necessidade de recapitalização da Caixa é normal. A crise desvalorizou os ativos e as exigências regulatórias de capital apertaram muito. O BPI (9% dos ativos do sistema), reforçou o seu capital em 1400 milhões. O BCP (15% dos ativos) reforçou em 4500 milhões. A Caixa (24% dos ativos) aumentou o capital em 850 milhões. O acionista único da CGD, o Estado, recebeu 2700 milhões em dividendos na década antes da crise. Agora deverá também recapitalizar o seu banco.”

Quando li isto, devo ter feito uma expressão de surpresa interrogativa, do género “mas onde é que eles vão desencantar estes números?” Só podem ser inventados. Virei a página e rapidamente esqueci. São tantas e tantas as invenções que nos surgem daqueles lados que era apenas mais um cão a morder um homem. Mas hoje vi um debate em que a Mariana Mortágua, com ar doutoral, plena de sapiência, cada vez mais arrogante, despejou todos estes números outra vez – leu o parágrafo – em debate com Adolfo Mesquita Nunes. Este, sempre bem educado, contestou apenas levemente o caso do BPI e recordou que o estado meteu mais na CGD em aumentos de capital do que o que recebeu de dividendos.

O Adolfo tem razão. Os números da Mariana não fazem nenhum sentido. O BPI não reforçou o seu capital em 1400 milhões coisa nenhuma. O BPI reforçou o seu capital em 200 milhões de euros, em 2012 e converteu 110 milhões de dívida subordinada em capital em 2013. Total: 330 milhões. Muito longe dos 1400 que a Mariana sugeriu. O empréstimo do estado (CoCos) no montante de 1500 milhões de euros já foi reembolsado na íntegra. E durante este período (desde 2011) pagou quase 170 milhões de juros dos CoCos ao estado, outro tanto de IRC e ainda teve que contribuir com 60 milhões para os fundos de resolução e de garantia. Ou seja, pagou ao estado mais do que aquilo que reforçou em capital.

Disse a Mariana que a Caixa aumentou o Capital em 850 milhões. Também não, Mariana. Também não. Desde 2011, o estado aumentou o capital da Caixa em 750 milhões e deu-lhes mais 900 milhões de CoCos que não pagou nem quer pagar. Pretende convertê-los em capital.

Em resumo, nestes anos a Caixa recebeu 1.650 milhões de euros dos contribuintes. Mas não fica por aqui. A Parpública, empresa pública, comprou à Caixa as participações na EDP por 960 milhões de euros. E durante estes 4 anos, a Caixa tem alienado participações a bom ritmo. A mais relevante foi a venda do grupo segurador por 1000 milhões de euros. Mas depois de tudo isto, ainda faltam 4000 milhões.

A Mariana não acerta uma. E também não acertou esta:

“O acionista único da CGD, o Estado, recebeu 2700 milhões em dividendos na década antes da crise.”

A sério, Mariana? Os contribuintes portugueses foram bafejados com este sucesso empresarial? Vamos lá ver. A década anterior.

Ano Dividendos Aumentos de Capital Vendas à Parpública

2001

265 40

2002

313

2003

319
2004 320

400

2005

350

2006

195
2007

260

150

2008 340 400

390

2009

300

1000

2010

170 550

292

Total Década 2482 2890

682

Numa década em que os contribuintes deram à CGD 3 572 milhões de euros, esta teve a gentileza de devolver-lhes 2 482 milhões.

Afinal, Mariana, os 2700 milhões que o estado recebeu são 1100 milhões que o estado pagou. E isto na década de ouro da banca, enquanto o Bloco gritava nas ruas contra os lucros milionários da banca. Lembra-se?

Isto quando era bom. Quando passou a ser mau, foi assim:

Ano

Dividendos Aumentos de Capital CoCos

2011

Zero
2012 Bola

750

900

2013

Nada
2014

Buraco

2015 Niqles

2016 (est)

Vácuo

4000

Total 6 anos 0 quarks 4750

900

Valores em milhões de euros. Fonte: Relatórios e Contas

Nestes 6 anos, os contribuintes dão à CGD  5 650 milhões de euros. A CGD devolve aos contribuintes um saco cheio de palavras sobre as virtudes da banca pública.

Para a Mariana, importante é a forma como se diz. Essa forma é excelente. O conteúdo é zero.

E não venham dizer que isto não merece uma CPI. Merece sim. Merece.

35 comentários leave one →
  1. 17 Junho, 2016 23:10

    Para o típico eleitor do BE, chega e sobra.

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  2. 18 Junho, 2016 00:02

    A sociopatia é hereditável. Filha de peixe sabe nadar…

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  3. 18 Junho, 2016 00:39

    Económicamente falando, uma sociopata.

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    • antónio permalink
      18 Junho, 2016 18:23

      Não é só economicamente, tem que se analisar quem ministrou a educação da menina Mortágua…

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  4. Miguel Neto permalink
    18 Junho, 2016 01:40

    Eu acho que talvez a exma. deputada esteja inconscientemente a pedir desculpa ao Povo Português pelo assalto que, em Maio 1967, o seu paizinho realizou à filial do Banco de Portugal na Figueira da Foz. Foram 30.000 contos que equivaleriam a uns 10 milhões de euros, se fosse hoje. Pode ser que a exma. deputada Mariana Mortágua queira compensar um banco público dos prejuízos que o seu revolucionário paizinho provocou a um banco público, mais uns juros. Só que o dinheiro que o revolucionário paizinho retirou (e que, dizem alguns, não beneficiou só o financiamento da revolução) era real, em notas; hoje, a exma. deputada Mariana Mortágua talvez queira compensar o Estado “injectando” noutro banco público dinheiro imaginado.

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  5. Miguel Neto permalink
    18 Junho, 2016 02:19

    Vamos ficar à espera que a SICN, que supostamente está apostada em informar o público e em apresentar a realidade aos seus telespectadores, faça a sua investigação e apresente os números correctos?

    Não sendo verdadeiros, será que a exma. jornalista, moderadora do debate, e os exmos. diretores de informação da SICN não se importam de ser “enganados”, uma vez que parece que não estudaram o assunto e que não questionando os números os sancionou?

    Não sendo verdadeiros, será que a SICN não se importa de ser utilizada para desinformar os seus telespectadores?

    O objectivo (e o negócio) da SICN é dar-nos notícias ou transmitir-nos tretas?

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  6. Manuel permalink
    18 Junho, 2016 08:56

    Se a tese de doutoramento da deputada tiver a mesma concisão, objectividade e qualidade científica, fico esclarecido.

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  7. Ricardo Santos permalink
    18 Junho, 2016 09:37

    JCD, indique as fontes dos seus números, por favor.

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  8. Fernando S permalink
    18 Junho, 2016 09:39

    t1

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  9. Rui permalink
    18 Junho, 2016 10:14

    Gosto muito da Mariana Mortágua. Mesmo que a fundamentação do seu discurso seja apenas aparente acho que é uma grande mudança em relação ao típico discurso oco da maioria dos outros deputados. Espero que esta mudança venha para ficar e que os próximos deputados percebam que para sobressaírem têm de se mexer, explicar os assuntos em vez de debitar uma série de ideias feitas sobre todo e qualquer tópico.
    Relativamente a este tópico especifico acho que o autor do post tem toda a razão. Os maus investimentos da CGD têm de ser escrutinados, ainda por mais sendo um banco publico e a recapitalização de 4000 milhões no período pós troika não pode ser vista como “normal”.

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    • lucklucky permalink
      21 Junho, 2016 19:17

      Mentir descaradamente é melhor que ideias feitas portanto.

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  10. piresdacruz permalink
    18 Junho, 2016 11:22

    Só um detalhe, eu lembro-mede ter consultado as contas da CGD e o estado nunca foi buscar o dinheiro. Ou seja, os aumentos de capital foram sempre por incorporação de resultados. O que significa que, na realidade, teria sido muito fácil aumentar uns pós às contas públicas….

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    • 21 Junho, 2016 19:53

      Não, não foram. Estes aumentos de capital foram por entradas em dinheiro.

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  11. Filipe Costa permalink
    18 Junho, 2016 11:54

    Esta esganiçada sabe assaltar Bancos e convence o povo que é para o seu bem. Tal pai, tal filha.

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  12. 18 Junho, 2016 17:18

    E o que é que aquela oposição está a fazer no parlamento ?
    E onde estão os comentadores de centro direita, nos jornais e na TV ?
    Engana-se assim o país e a Mariana continua com aquela carinha de anjo ??

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    • Manuel permalink
      18 Junho, 2016 17:37

      Considero inadmissível que esta senhora depois do interrogatório assertivo que fez ao Ricardo Salgado e bem, venha agora com um discurso desculpabilizante para a gestão pública da CGD, onde poderá ter havido: dolo, compadrio, corrupção, etc. Os administradores devem ir ao parlamento (pode ser à porta fechada) explicar tudo aos nossos deputados e se houver matéria criminal, a mesma deve ser conduzida ao Ministério Público.

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  13. José Domingos permalink
    18 Junho, 2016 20:34

    Nunca é de mais referir, que o jornalixo nacional, mais o telelixo, fazem fretes a estes iluminados, são incapazes de pedir desculpa, só sabem fazer o que lhe mandam.
    A liberdade dos meios audiovisuais, com os comités a censurar o que é preciso.
    Vergonha.

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  14. Daniel Oliveira permalink
    19 Junho, 2016 04:29

    Não Ii o post com atenção mas a crise financeira rebentou dm 2008 e por isso a década antes da crise não é suando um homem quiser mas entre 1998 e 2008. Refaça lá isso.

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    • 19 Junho, 2016 08:40

      Daniel, se o que está em causa é antes e depois de 2008, então a Caixa já foi fortemente reforçada porque depois de 2008 já recebeu 3600 milhões em aumentos de capital fora as alienações à Parpública. Ou seja, nesse caso não faz sentido nenhum que a Mariana diga: “Agora deverá também recapitalizar o seu banco”. O agora já foi.

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    • Anarcocapitalista permalink
      19 Junho, 2016 12:07

      Para o Daniel Oliveira o agora é quando a gente quiser! E pelo comentário, o DO não vê problema nenhum na forma desleixada e errada como a Mariana informou as contas da CGD. Eu entendo, e concordo, com o Daniel quando afirma que não é a altura certa para discutir o assunto da CGD, mas também não é a altura certa para nos enganarmos a nós próprios.

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    • Narciso Soares permalink
      20 Junho, 2016 14:12

      De tudo o que o é indicado no texto, mesmo não o tendo lido com atenção, a única coisa que lhe salta à vista é uma diferença de de 3 anos? de 1998 para 2001?

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  15. nunotmcgoncalves permalink
    20 Junho, 2016 00:09

    Numbers don’t lie… Dummies do…

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  16. 21 Junho, 2016 15:10

    O Blasfémias não é sério.

    A CGD gerou 5.726 milhões em lucros na década de 2001 a 2010.

    Parte deste lucro foi usado para aumentos de capital do banco: 2.890 milhões e foram entregues aos cofres do Estado 2.700 milhões de euros entre impostos e dividendos.

    Não me digam que não sabiam que os reforços de capital foram feitos por aplicação de resultados?????? Que lata. Ponham lá no quadro os lucros antes de impostos, os impostos e os lucros depois de impostos!!!

    Que tretas!

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    • 21 Junho, 2016 19:55

      Errado. Esses lucros não foram usados para aumentos de capital. Os aumentos de capital referidos foram sempre por entradas de dinheiro fresco. (por vezes no mesmo ano de pagamento de dividendos, o que quer dizer que recebiam com uma mão e pagavam com a outra).

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      • 24 Junho, 2016 11:35

        O que significa que na prática o Estado pagou zero, porque pagava com uma mão e recebia com a outra! Está demonstrado!

        Obrigado pela ajuda!

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  17. 21 Junho, 2016 15:14

    Bom post, mas já que realçam as vendas à Parpública, então também devem evidenciar a venda dos HPP por 80 MEUR à Amil (2012), 1.000 MEUR da Caixa Seguros à chinesa Fosun (2014), venda (via Caixa Capital) da participação de 10% no Grupo Vila Galé por 33 MEUR (2015) e, já este ano (via Fundo de Pensões), alienação do Campus de Justiça de Lisboa por 223 MEUR, o que agrava ainda mais a fotografia do desempenho da cgd, uma vez que todas estas operações de alienação de ativos podem ser equiparadas, grosso modo, a aumentos de capital.

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  18. 21 Junho, 2016 16:07

    O Blasfémias não percebe nada de contas.

    Entre 2001 e 2010 a CGD acumulou 5.726 milhões de lucro bruto!
    Deste lucro, 2.890 milhões foram usados para aumentos de capital.
    Deste lucro, foram entregues ao Estado entre impostos e dividentos 2.751 milhões.

    O Blasfémias do alto da sua arrogância não sabe que os aumentos de capital se fazem por utilização dos resultados?!? Ou prefere omitir?

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