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Dia mundial das inimigas – Estórias a propósito do Dia Mundial da Mulher

8 Março, 2018
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Em 2005, uma empresa indiana que já prestava serviços a empresas americanas decidiu atrair clientes europeus. Na falta de recursos humanos locais com conhecimento de línguas europeias que não o inglês, decidiu contratar uma série de estagiários de vários países europeus, incluindo o humilde autor deste texto. Aterrando num ambiente corporate ocidentalizado, alguns dos/as estagiários/as levaram o seu tempo a integrar-se na cultura indiana. Ao fim de algumas semanas, as estagiárias europeias são chamadas a uma sala de reuniões. Foram aconselhadas a vestir-se de forma mais modesta (leia-se, mangas compridas com 35 graus e um ar condicionado dado a falhas). Quem se tinha queixado? As chefias? Os homens conservadores que sentiam tentados ao ver cotovelos nus? Não. As estagiárias indianas, também elas na casa dos vinte e poucos anos.

Uns anos mais tarde, passei uma longa temporada num dos países árabes mais conservadores. Na empresa onde estava trabalhava um casal oriundo de um país ainda mais conservador que ocupavam ambos cargos de relevo. A certa altura convidam-me para a sua casa (um palácio quase no centro da cidade). Na sala de estar conversávamos como o fazíamos na empresa, mas ela, mais à vontade, retirou o lenço que lhe tapava o cabelo. Passado alguns minutos passa um homem mais velho que lhe diz qualquer coisa em árabe meio a sorrir. Continuamos a conversar como antes. Passado uns minutos ouve-se alguém a entrar. O mesmo homem mais velho entra na sala e diz qualquer coisa. A mulher coloca o lenço. Tinha chegado a mãe.

Numa reportagem sobre mutilação genital feminina num país africano a repórter quase só consegue encontrar mulheres disponíveis para falar. Entre as mais velhas, a opinião é unânime de que as mulheres que não são excisadas são menos higiénicas, menos fertéis e menos fieis. Uma dessas mulheres diz mesmo que sabe quando uma mulher não é excisada pelo cheiro: “cheira a bode”, segundo a tradução da repórter. Uma especialista diz à repórter que a excisão feminina é também uma forma de defesa das mulheres mais velhas: ao tornarem o sexo uma actividade dolorosa para as mulheres mais novas, torna-se menos provável que elas se predisponham a fazer sexo com os seus maridos.

Recentemente, algumas feministas mais radicais protestaram pela existência das chamadas “grid girls”, mulheres jovens e bonitas empregadas na Formula 1 para dar um colorido a um desporto maioriatariamente seguido por homens, que na sua maioria gostam de mulheres jovens e bonitas. Apesar de as próprias grid girls defenderem o seu papel e afirmarem que não se sentiam objectificadas, o protesto de outras mulheres que não grid girls levou a que perdessem o seu emprego. As feministas não entram todas na mesma categoria e há lutas bastante justas, mas não será por acaso que entre as mais radicais estejam quase sempre mulheres mais velhas. A ala feminista “all sex is rape” (como hiperbolicamente descrita num episódio de Family Guy) tem um fundo evolucionista (que não consciente!!) semelhante ao da excisão feminina: o de baixar as oportunidades de encontros sexuais das mulheres mais jovens e bonitas de forma a diminuir as oportunidades de infidelidade dos homens.

Finalmente, dois estudos já referidos neste artigo do Luis Aguiar-Conraria. Num deles, feito em Espanha, conclui-se que quando há mais mulheres num juri de selecção é menos provável que a pessoa escolhida para o emprego seja… mulher. Dito de outra forma, quantos mais homens estiverem na posição de escolher, mais provável é ser escolhida uma mulher para a posição. Num outro estudo, em que os investigadores enviavam CVs semelhantes com e sem fotografia, conclui-se que os homens bonitos beneficiavam em enviar CV com foto, mas as mulheres bonitas não. Motivo? A selecção dos CVs é maioriatariamente feita por mulheres e estas discriminam outras mulheres quando elas são bonitas.

9 comentários leave one →
  1. weltenbummler permalink
    8 Março, 2018 11:18

    ‘meninas à sala!’

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  2. Bal permalink
    8 Março, 2018 11:40

    Boa posta!

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  3. Adriana Lima permalink
    8 Março, 2018 12:14

    Excelente artigo, que só disse aquilo que todos e todas sabem mas que todas têm vergonha de assumir, preferindo – como habitualmente – arranjar forma de passar as culpas para o “homem branco, heterossexual e cristão”, tudo isto com o beneplácito dos comunistas e socialistas via marxismo cultural, academia e comunicação social. É o triste mundo dos dias de hoje, que só está a renegar e a destruir o nosso presente e o nosso futuro.

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  4. André Miguel permalink
    8 Março, 2018 12:43

    Leiam Pedro Arroja, que há anos anda a bater nesta tecla, alguns dos seus textos são dos mais assertivos e lúcidos sobre a matéria.

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  5. Juromenha permalink
    8 Março, 2018 13:00

    O ´”óbvio ululante” – equivalente ao “Rei vai nu”.
    Parabéns pelo texto.

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  6. Procópio permalink
    8 Março, 2018 14:19

    Isto de homens e mulheres já foi.
    Eu só leio Karl Marx, Friedrich Engels, Sigmund Freud, Simone de Beauvoir, Alfred Kinsey, Wilhelm Reich, os filósofos Adorno, Horkheimer o Marcuse, da escola de Franckfurt.
    Libertemo-nos sexualmente para exterminar de raíz os valores tradicionais, rebelemo-nos contra toda a autoridade.
    É preciso desconstruir a identidade masculina e a femenina. Topam?
    Agradeçamos às berlocas a desregulação das normas sexuais, a promoção das LGTB, o matrimónio entre personas do mesmo sexo e os “direitos” transgénero.
    Neutralize-se a família por meios ideológicos e económicos mediante impostos e sistemas da Segurança Social que penalizam as mães e as familias; empurremos as crianças para as creches do estado. Eliminem-se os “estereotipos de género”nas escolas e jardims de infancia. A estratégia das Nações Unidas, Unicef, da Apple e da Microsoft estão a funcionar.
    E assim serão todos muito felizes. Já se nota.

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  7. Juromenha permalink
    8 Março, 2018 14:32

    Atenção ao “umbiguismo” – a “porção” do globo onde estas merdas carnavalescas ( com desculpas pela linguagem vicentina ) têm lugar e algum público é manifestamente reduzida.
    Basta apanhar o “ferry” em Algeciras ( e do lado de lá continua oficialmente em Espanha…) para ver que ” a cada um (a) a sua verdade”…
    Definitivamente, o ecran televisivo não corresponde exactamente ao mundo real e o eurocentrismo , e as suas excrecências, nada mais é que uma memória histórica.

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  8. José Rodrigues permalink
    9 Março, 2018 22:32

    Olá Carlos, é possível fornecer um link para os estudos que citas no último parágrafo? Obrigado!

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