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25 de Abril sempre (sempre mesmo, já cansa)

24 Abril, 2019

Um daqueles lugares-comuns que se repetem por aí, como cogumelos selvagens debaixo da banheira que colocamos no quintal “para ser arrumada” quando “tivermos tempo”, é o de que a palavra ‘saudade’ é uma singularidade portuguesa. Reza o mito que em nenhum outro lugarejo desta esfera condenada às carências transcendentais dos seus habitantes há outra igual, outro alomerado de sons que transmita tão pastoral sentimento de ausência pelo irrepetível. Felizmente, tal mito é fake news*, porque, fora verdadeiro, tratar-se-ia de uma admissão pueril da capacidade única da Lusitânia para se enredar em entediante nostalgia por algo que nunca conseguiu apreciar na devida altura.

O 25 de Abril encaixa perfeitamente no mito da saudade. Andamos há quarenta e cinco anos com “Abril”, “os capitães” e “o fáxismo” na boca, brotando cravos como poesia naïf com sílabas que, há muito, mais se assemelham a verrugas.

Lá vão eles, mais selfie para aqui, mais discurso para ali, mais troca de cuecas para a big carriage acolá. Com gravata, sem gravata, despenteados ou com um Prince Albert dissimulado nas calças de terylene, graças a Deus que a televisão não tem cheiro para nos poupar à naftalina. É assim que se manifesta a ‘saudade’: não é através de uma nostalgia por algo que recordamos com afeição, é pelo prazer da exibição pública perante pobres transeuntes do pranto que torna o sofrimento da condição humana em característica exclusivamente adquirida e, em última instância, que alimenta esse mesmo sofrimento para dissimular o tão ansiado culto pelo masoquismo em indesejada maleita.

Como tudo que já foi o último grito, também a ‘saudade’ enjoa. É que se foi para isto, para carpir saudades que se fez o 25 de Abril, então já chega, já percebemos, avancem lá com isso e derrotem lá de uma vez o tal de “fáxismo”. De resto, repito: felizmente que a televisão não tem cheiro.


NOTA DE RODAPÉ
* Gostaram desta submissão ao jargão imbecil do nosso tempo?

28 comentários leave one →
  1. JMS permalink
    24 Abril, 2019 20:41

    Muito bom. Excelente. Obrigado, Vítor.

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  2. Mario Figueiredo permalink
    24 Abril, 2019 21:31

    Claro que gostei da submissão. A língua Inglesa é afinal cheia de riqueza semântica. O Vítor é cool. E é com um wink que o digo, porque sei que as duas palavras não têm tradução directa em Português.

    Mas poderíamos também falar de palavras que nem sequer existem em Português, como hustler ou serendipity. E já que falamos de sentimento, que dirão os nossos populistas da saudade acerca do awe inglês?

    Será porque somos ambos tomados por wanderlust que há muito que percebemos que a nossa língua não precisa de ser especial para ser única e rica… como muitas outras?

    Não sei. Mas quando nos dedicamos a comer uma boa sandes de bacon com ketchup e a fazer brainstorming na internet acerca da potência dos lasers, ou a contar daquela vez que vimos um “gay” a fazer ski com o seu laptop, fica tudo dito sobre a língua Portuguesa.

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    • JMS permalink
      24 Abril, 2019 22:23

      Sobre a idéia subjacente do post nem uma palavra. Esperava mais de si, Mário.

      A língua inglesa, por mais que custe a algumas pessoas, é uma forma de comunicação planetária. Podia ser o português, mas não. É o inglês. Se o Vinho do Porto é hoje a única marca “portuguesa”, consolidada, conhecida no mundo, podemos agradecer aos ingleses, como bem sabe.

      Na realidade, somos comunistas e completamente estúpidos antes do tempo. Mesmo antes de 1793. Daí, a língua inglesa ter o valor que tem. E haver, ainda hoje, uma “commonwelth”. Onde até Moçambique está.

      Às vezes, pensar, é saudável.

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  3. JgMenos permalink
    24 Abril, 2019 23:37

    De um país enquistado rebentou uma eflorescência que rapidamente foi empestada por toda a merda que o quisto continha.
    O cravo simboliza o que foi empestado não a pestilência que dá pelo nome de ‘Abril sempre’.

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  4. A. R permalink
    25 Abril, 2019 00:01

    Este é um período triste: observamos as trombas de terroristas, torturadores do CopCon e autores de muitas outras arbitrariedades -prisões a qualquer hora do dia, interrogatórios a mira de pistola, listas de fuzilamentos, humilhações públicas, queimas de livros e revistas, saneadores – como salvadores da Pária e das liberdades.

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    • Carlos Rosa permalink
      25 Abril, 2019 10:42

      Olhando para o espetáculo das comemorações do 25 de Abril o que se vê?
      Hoje os maiores entusiastas dessas comemorações são os bem instalados na vida à custa do dinheiro dos nossos impostos. Não em resultado do seu trabalho em prol de um Portugal dos 3 D. Fruto do oportunismo e da corrupção que esses democratas da treta desenvolveram à sombra dos slogans do 25 de Abril e dos cravos vermelhos. Tem sido assim que esses trafulhas têm enganado o povo e enchido os bolsos de dinheiro que não lhes pertence. Estão nos governos, na Assembleia da República, nas autarquias; na Administração Pública em geral. Por golpadas, truques ou cunhas.

      Os desiludidos, os revoltados com esta apropriação escandalosa do 25 de Abril de 1974 e muitos dos que já lutam contra este estado das coisas, viveram com entusiasmo e esperança o que pensavam que o 25 de Abril lhes traria. Foram traídos!

      Agora o caminho é em frente, rumo ao derrube deste regime podre que nos andam a vender.

      Verdadeiros revolucionários são os inquietos, os que não se acomodam com o que está mal.
      Força portugueses!
      Portugal merece!

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  5. 25 Abril, 2019 00:21

    Com os cravos isto passou de um país adiado para um país encravado.

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  6. Expatriado permalink
    25 Abril, 2019 00:44

    Eu sou mais… 25N SEMPRE!!

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  7. MIguel Santos permalink
    25 Abril, 2019 01:07

    Mais definições de “cravo”:
    – primeira pessoa do singular do presente do verbo cravar. Ex: o meu primo é ministro, vou ver se lhe cravo um lugar de secretário de estado.
    – [cravo]-da-Índia, também conhecido por cravinho, filho do pai das SCUT, ou seja, irmão das SCUT.
    – instrumento musical da família do piano, ou seja, uma espécie de entrecosto.

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  8. JMS permalink
    25 Abril, 2019 03:56

    Pelos comentários aqui expressos entendo perfeitamente o nosso atraso endémico.

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  9. Oscar Maximo permalink
    25 Abril, 2019 08:31

    Já cansa, por culpa de omissão, do PCP. Nós queremos é comemorações da liberdade e democracia como na Coreia do Norte, muito mais bonitas e espetaculares.

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    • Oscar Maximo permalink
      25 Abril, 2019 08:42

      A consequência de ainda não atingirmos esses níveis de liberdade e democracia, é que a nossa comemoração terá de ser mais pobrezinha.

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  10. Pedro Dias permalink
    25 Abril, 2019 08:32

    O 25 de abril é uma espécie de Santa Inquisição dos novos tempos.
    Com Autos de Fé e tudo!

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    • Rão Arques permalink
      25 Abril, 2019 09:52

      De um ponto de vista prático não passa de uma crédula reposição da beata Santa da Ladeira.

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  11. Pinto permalink
    25 Abril, 2019 08:57

    Comparem os feriados desta grande nação socialista com os feriados dos países nórdicos. Ao passo que nos países no norte da Europa e em quase todo o mundo democrático ocidental os feriados são esmagadoramente religiosos, nesta quintinha marxista há uma mão cheia de feriados comemorativos de golpes de Estado, estando os religiosos quase esquecidos da vida social e cultural. E porquê? Há um propósito ideológico por trás? Veja-se o papel proselitista da comunicação social, que ignora por completo os feriados religiosos (quanta gente sabe porque é que a 15 de agosto é feriado?) e faz questão de encher páginas e páginas a doutrinar a glorificação desses golpes de Estado. O JN estampa hoje na primeira página, alarmado, que os portugueses passam à tangente no teste do 25 de abril. Se calhar os portugueses ainda não sabem quantas vezes o Otelo urinou nesse dia.

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  12. Beirao permalink
    25 Abril, 2019 09:23

    Esta canalha comuna que infesta a piolhice dos médias, em especial as TVs, provocam-me vômitos a repetir ha’ 45 anos a merda do 25/A.
    Puta que os pariu!

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  13. Beirao permalink
    25 Abril, 2019 09:28

    Porra para tanto 25/A! 45 anos a bater no ceguinho já chega. Bolas!

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  14. Rão Arques permalink
    25 Abril, 2019 09:42

    Dado, arregaçado, manipulado e estoirado, nunca.

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  15. Rão Arques permalink
    25 Abril, 2019 09:46

    Vão erguer o museu da resistência e liberdade. Falta saber se também lá vai poisar a resistência à liberdade.

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  16. Prova Indirecta permalink
    25 Abril, 2019 13:35

    O zé de Évora , o quarenta e quatro , foi ao almoço ?

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  17. Artista português permalink
    25 Abril, 2019 14:22

    Cambada de ingratos! Nem sequer deram conta do Protocolo que a CML esteve a ponto de celebrar com a Associação dos Amigos dos Cemitérios de Lisboa (AACL) para transformar aquilo em local de festas e, muito provavelmente, pôr os mortos a votar. No Panteão é que nâo! Só nos cemitérios. Ainda a proposta não tinha sido aprovada e já o “subsídio” (sempre o subsídio nesta República de Parasitas) tinha sido aprovado. A lista dos membros da Associação, essa então, é de morrer a rir. Estão lá todos: desde o João Soares aos familiares do César dos Açores. Estamos a ver que cá na terra já nem os mortos podem estar socegados. Cambada!

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  18. Os corruptos que se cuidem permalink
    25 Abril, 2019 19:00

    E o farsante do Pablo Iglesias a cantar Zeca Afonso no comício na Galiza? Ao que isto chegou! Nunca os povos foram tão enganados! Nem parece que vivemos na era da informação! Um chavista oportunista daqueles, que já se aviou com uma mansão na Serra de Madrid e faz vida de burguês, com criadagem para lhe tratar do jardim e da piscina e segurança à porta, a cantar fechando os olhos. Já se está a deliciar com a antevisão do quanto vai lucrar chegando ao Governo em Espanha!

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  19. Os corruptos que se cuidem permalink
    25 Abril, 2019 19:02

    Levantem-se, Povos do Mundo, e livrem-se de quem vos suga o sangue com historietas de embalar!

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  20. Arlindo da Costa permalink
    26 Abril, 2019 01:52

    Dêm graças a Deus por ter havido quem vos libertou da ditadura e da opressão.

    Agora até podem falar contra quem vos libertou e vos tirou da servidão, seus servos da gleba.

    Se o país estivesse à espera da vossa coragem e parlapier, ainda estávamos pior que o Alto Volta!

    Tenham tino nessa cabeça e não sejam ingratos!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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    • sam permalink
      26 Abril, 2019 06:35

      Falou o Arlindinho, o Amigo dos Cemitérios.

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    • Carlos permalink
      26 Abril, 2019 11:23

      Quem nos libertou? Ou quem se libertou… A mim não me libertaram. A mim enterraram-me.
      Por acaso esteve atento a umas gravações apresentadas na RTP 1 onde aparecem 3 ditos que continuam a engordar à custa dos seus e meus impostos e de caneta na mão a descrutinar quem eram as vozes audivéis sobre os pseudo-fusilamentos que queriam e já fusilar. Eles chegaram a coronéis… mas nunca vi o lucro que me deram.Pelo contrário.Só tive prejuizos. Até no tempo de trabalho e já lá vão 45 em 64 anos de idades e me continuam a roubar para que estes engordem. E termino sobre uma frase audível nessa gravação. Então vamos libertar o país de umas garras e vamos anestesiá-los com novo modelo de garras? Mais ou menos sobre os fusilamentos

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  21. Carlos permalink
    26 Abril, 2019 09:18

    O meu povo gosta de ser enganado. E sabendo que continua enganado bate bate palmas mas hoje é outro dia e vamos dizer que o IMI aumentou.

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  22. Carlos permalink
    26 Abril, 2019 11:35

    Dêm graças a Deus por ter havido quem vos libertou da ditadura e da opressão.
    Em 25 de abril de 1974, com 19 anos, vestia uma farda. Não fugi. Se fui enganado…é outro tema. Milhares de jovens, marchámos. Demos o corpo ao manifesto. Um diploma alterou o regime de uns mas não libertou o povo trabalhador. Este, cansado, ainda labuta para alimentar uma certa escumalha da sociedade. Antes eu respeitava e era respeitado. Hoje tenho receio de andar na rua e olhe que tenho 190cm de altura e 98 Kilos de peso.
    Atenção… respeito a opinião de todos desde que respeitem a minha.
    Antes o meu registo criminal estava limpo. Hoje não está. Sabe porquê? Por indignação escrevi um mail e difundio no local de trabalho. Cometi um crime. O crime de escrever um mail e escrever o que me á na alma. Pena 150 dias de multa a 10 euros/dia, fora as mornomias judiciais. No entanto outros casos que não vale aqui divulgar.Mas termino. Em julho de 1973 um capitão gozava com a s praças. Foi um herói do 25 de Abril e chegou a coronel

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