“Porque não sou conservador” *
«O debate desvendou muito da esquerda contemporânea: a lógica determinista e historicista, plena de ilações decorrentes das “conquistas alcançadas” e em figurados “avanços civilizacionais”, que pretende descortinar o Mundo como uma estrada que se percorre mediante progressos, frentes e vanguardas, ao invés, está a provocar o resvalamento da esquerda europeia num conservadorismo perigosamente imobilista.
Tanto julgam ter alcançado que agora não querem sair do sítio – a esquerda estacionou na luta exclusiva pela manutenção daquilo que está.»
* Revista ‘Notícias Sábado’ (JN e DN), 31 de Julho de 2010
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Porque não sou conservador
O PSD apresentou uma proposta de revisão constitucional. Logo se ergueram as vozes dos sacerdotes-pontifícios da Constituição e da esquerda que tem como desígnio a manutenção de tudo como está, em uníssono, impugnando ferozmente o esforço de mudança. Essas faringes ideológicas não julgaram útil contrapor um esboço de alternativa.
O debate desvendou muito da esquerda contemporânea: a lógica determinista e historicista, plena de ilações decorrentes das “conquistas alcançadas” e em figurados “avanços civilizacionais”, que pretende descortinar o Mundo como uma estrada que se percorre mediante progressos, frentes e vanguardas, ao invés, está a provocar o resvalamento da esquerda europeia num conservadorismo perigosamente imobilista.
Tanto julgam ter alcançado que agora não querem sair do sítio – a esquerda estacionou na luta exclusiva pela manutenção daquilo que está. O seu dogma prioritário reduz-se à ideia restrita de que o modelo social europeu (não aquele que há mas o que fantasiam) é o fim da história, o paradigma mais perfeito possível de ser construído e que nada mais pode ser inventado no presente e no futuro. Depois de décadas a exaltarem “os amanhãs que cantam”, a esquerda europeia descobriu a democracia, reconsiderou a liberdade e o pluralismo e rendeu-se ao ideal da sociedade de bem-estar assegurado pelo Estado.
O modelo em que agora acreditam é simples: o Estado tudo garante desde que os cidadãos o sustentem através dos impostos. A falha principal, até agora intransponível, reside na constatação de que o dinheiro que as pessoas entregam ao Estado tem limites – ao passo que as necessidades dos poderes públicos são inextinguíveis. Hoje já ninguém sabe como pagar uma conta que não pára de crescer. A divisão passou a assentar entre aqueles que querem descobrir soluções, evoluir, e os novos-conservadores-velhos-esquerdistas em irrecuperável estado de negação que apenas querem manter estagnado o molde tal qual este foi gizado há muitas décadas.
A esquerda europeia envelheceu. Definhou intelectualmente. Recusa enxergar falhas no paradigma em que se aquietou mesmo quando estas são patentes. Sem ideias, incapaz de reinventar os seus vetustos princípios, tornou-se dogmática e passadista.
Esta esquerda, hoje, é mais conservadora e musguenta do que o chapéu preto de Oliveira Salazar.
Nomes da liberdade
Um deputado alemão propôs o agravamento dos impostos para os gordos. A coisa preocupou os meus bem fundados 110kg. Já tinha lido que a segurança social inglesa tinha retirado os filhos a um casal cujo pecado era o excesso de peso. Na verdade, a falta de senso é uma doença contagiosa que tende a avolumar-se mais do que qualquer vítima da boa mesa.
A justificação do político é de uma magreza cerebral insanável: a alimentação excessiva provoca custos acrescidos para o sistema de saúde. Pois bem – então a anorexia, a toxicodependência, os fumadores, os que adoecem com cancro de pele devido ao bronze estival, enfim, todas as moléstias comportamentais deveriam ser sancionadas fiscalmente.
A lógica do politicamente correcto esquece a história e desdenha a natureza humana: Hitler, um vegetariano arrebatado, vedava a ingestão de carne e peixe aos seus subordinados mais próximos que, depois, subornavam os criados para lhes servirem à socapa uns bifinhos…
Quem quer petrificar o homem numa tirania fisicamente saudável esquece-se que a liberdade tem muitas formas – uma delas, das mais apetitosas, pode assumir o feitio de um belo cozido à portuguesa ou de uma cervejinha com os amigos num entardecer de Verão, enquanto a conversa fustiga, o mais possível, aqueles que, zelosamente, querem proibir as pessoas de serem gente.»

e por que isso não interessa a ninguém senão ao próprio, tema para outra crónica
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Um deputado alemão propôs o agravamento dos impostos para os gordos. … A justificação do político é de uma magreza cerebral insanável: a alimentação excessiva provoca custos acrescidos para o sistema de saúde. Pois bem – então a anorexia, a toxicodependência, os fumadores, os que adoecem com cancro de pele devido ao bronze estival, enfim, todas as moléstias comportamentais deveriam ser sancionadas fiscalmente.
Pois bem, quando faço um seguro de saúde/vida para habitação em Portugal tenho de apresentar análises e dizer se sou fumador. Se algum dos indicadores nas análises estiver acima do normal (por exemplo colesterol) ou for fumador o seguro que pago agrava-se. Mais ainda se algo estiver mesmo muito mal (por exemplo 160kg) provavelmente não me dão o crédito porque o seguro não me aceita. E isto é em Portugal, pois em países sem SNS como nos EUA os seguros são pagos de acordo com as questões de saúde da pessoa, aliás há empresas nos EUA que não contratam nem fumadores, nem obesos (pessoas com 110kg e menos de 1.85m) pois os seguros de saúde de empresa aumentam muito.
Se um sistema em que o Estado não garante a saúde e a deixa aos seguros e à liberdade de escolha é como o deputado alemão quer, porque é que um sistema nacional de saúde garantido pelo Estado não o pode ser?
É exactamente por o Estado não colocar as regras/incentivos tal como os privados nos bens que fornece que se criam um conjunto de ineficiências, que podem ser maiores ou menores do que aquelas geradas por o sistema ser deixado na mão de privados (ver por exemplo externalidades em qq livro de Microeconomia, embora existam outras falhas de mercado).
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Um texto muito bem escrito. Acerta no alvo: afinal quem são os conservadores? Quem é imobilista?
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A não existir um gráfico sobre o conservadorismo à esquerda e à direita, baseado num qualquer sistema de medidas, ficamo-se pelo impressionismo.
Genericamente o conservadorismo está relacionado com a posse.
Quem nada tem, vai conservar o quê?
Pickles?
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Piscoiso ou o analfabetismo militante.
“Ficamo-se”…
Nem com as “novas oportunidades” aprendeu a escrever.
Ora, bolas para a socretinice!
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Porque a direita quando ” avança” na realidade recua, recua em direitos, quer tirar ao povo o SNS para de uma forma “esmolástica” nos dar qualquer coisinha, isto para não falar no resto.
Eu que tenho 57 anos tou farto de aturar pseudo democratas com tiques arrivista e que parecem ter o rei na barriga.
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#4.
Já o António P. Castro é o professor militante, que vem para uma caixa de comentários corrigir erros dos teclados.
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6,
Não é do teclado. Aconselho-o a esforçar-se por aprender a ser grato a quem tenta ensinar-lhe o que manifestamente não sabe.
É certo que, quando não se bebeu chá em pequenino, isso é difícil. Mas, com vontade, talvez consiga.
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Estas coisas ( “conquistas alcançadas”, “avanços civilizacionais” ) ganham luito em ser consideradas face a um planisfério.
Toda a sua relevância,interesse e verdadeira dimensão ficam imediatamente em perspectiva.
Claro que todos nós temos noção da importância do nosso umbigo – sobretudo no “Marrocos de Cima”, onde a cultura umbigal é de se lhe tirar o chapéu…
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Tem toda a razão, CAA! A esquerda parou, não serve como alternativa em crises políticas e não faz (melhor, não sabe fazer) oposição quando é preciso. Mas julgo que o problema é, no mínimo, europeu. Aqui na Holanda,por exemplo, tentaram que os cidadãos tivessem um dossiê médico completo e que poderia ser consultado por quaisquer médicos, enfermeiros ou farmacêuticos… Ninguém ouviu a esquerda alertar para o perigo disto! Fiquei de boca aberta! E o Geert Widers, de extrema direita, anda a defender os direitos dos trabalhadores… onde é que já ouvimos esta história?
Aqui, como aí, não me encaixo em lado nenhum politicamente!
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#7.
Ó Castro, vá aconselhar para a sua paróquia e deixe-se de presunções ridículas.
Quanto ao chá, experimente um AKBAR, que irá certamente reduzir a sua cagança à insignificância denotada.
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