E agora já só falta a campanha eleitoral
Apesar de escrito antes do debate Passos-Sócrates, julgo que este texto mantém toda a actualidade. Ou até ganhou mais actualidade:
1. Está na moda, entre os comentadores políticos, salientar a importância das “narrativas”. O importante, dizem, é os candidatos terem uma boa “narrativa” e, em campanha, não se desviarem do guião. Nesse exercício algo ficcional o campeão seria, claro, José Sócrates.
Eu, que sou um bocado antiquado, prefiro olhar para os programas em vez de me deixar deslumbrar com as “narrativas”. É que os programas, se levados a sério, traduzem os compromissos dos candidatos enquanto as “narrativas” não passam, as mais das vezes, de meras efabulações, de construções sem qualquer contacto com a realidade mas com muito marketing, só marketing.
2. Ora nestas eleições há dois partidos que se candidatam com base em programas consistentes e três que andam mais preocupados com as suas “narrativas”.
Os dois partidos com programas palpáveis são o PCP e o PSD. Os comunistas porque não pretendem criar ilusões: eles foram, são e serão o “partido da resistência”, pelo que as suas propostas, mais do que concretizáveis, foram, são e serão as dos que já estavam contra a troika mesmo antes de se falar em troika. Sem surpresas, sem grandes novidades, mas coerentemente.
Já os sociais-democratas apresentaram o único programa realmente novo e concreto para que andemos todos a discuti-lo. É um programa coerente com o Memorando de Entendimento e que tem, para o país, uma visão que implica “mudar de vida”. Para o PSD, Portugal não sairá da actual crise repetindo as receitas do passado, é antes necessário pensar em novas fórmulas para a relação entre o Estado, a economia e os cidadãos, Isto se quisermos voltar a crescer e não apenas continuar eternamente a anunciar programas de mais cortes e mais austeridade. Goste-se ou não das propostas do PSD, elas são corajosas e tratam os portugueses como eleitores adultos a quem se deve falar verdade. Só é pena que, para alguns desses comentadores, dizer a verdade seja dar tiros no pé.
3. A apresentação, sábado passado, do Manifesto Eleitoral do CDS constituiu uma tremenda desilusão. No lugar de um programa surgiram-nos “ideias”, muitas “ideias”, todas suficientemente vagas para não comprometerem a campanha eleitoral ou, até, criarem a ilusão de que o CDS poderia colocar-se entre um PSD mais “ideológico” e um PS que enche a boca com temas sociais. E isto em nome de quê? Da “narrativa” que Paulo Portas criou para estas eleições, ou seja, a de que ele próprio é o líder mais bem preparado para suceder a Sócrates na cadeira de primeiro-ministro. Essa quimera, alimentada por sound-bytes cirúrgicos, convive bem com um manifesto que é cobarde onde o programa do PSD é corajoso.
Mais complicada é a posição do Bloco, um partido que perdeu a “narrativa” e não pode mostrar o programa, muito mais radical e revolucionário do que é palatável pelo seu eleitorado da classe média urbana. E perdeu a “narrativa” porque, se já não tem causas fracturantes para incomodar o PS, é incapaz de evoluir para ser um partido de governo. O erro fatal foi a decisão de não comparecer aos encontros com a troika sem perceber que o seu eleitorado, ao contrário do eleitorado comunista, tem o sentido do pragmatismo em política. O Bloco poderia recolher o voto de todos os que, à esquerda, não suportam mais Sócrates mas querem influenciar a governação – porém, com a posição em que se colocou, verá muitos desses eleitores fugirem para o CDS e, também, para o PSD. Quanto aos que estão “contra isto tudo”, esses sabem bem que a “resistência” é mais eficaz quando se alicerça no movimento sindical e não nas noites do Lux.
4. Chegamos por fim ao partido onde tudo é “narrativa” e onde o programa, de tão inexistente, até foi esquecido: o PS. A “narrativa”, como nos explicaram os doutos comentadores, foi construída no conclave de Matosinhos: de um lado estava um primeiro-ministro que tudo fez e fará para “defender Portugal”, do outro lado uma oposição “irresponsável” que provocara uma crise política à qual se atribuíam todos os males de Portugal. O resto da “narrativa” era completado pela invocação da “crise internacional” e pela exploração dos receios de mudança. A realidade, porém, está a afundar essa “narrativa”.
Primeiro, o diabo vestia a pele do FMI, como quem Sócrates jurou não estar disponível para governar. Ora o FMI revelou-se o bom da fita. Depois, o pedido de ajuda implicaria males tenebrosos “como na Grécia e na Irlanda”, mas isso não aconteceu. Por fim, se todos os males tinham nascido com a crise política, os números do INE foram o balde água fria fatal pois a entrada em recessão e a explosão do desemprego ocorreram ainda antes do chumbo do PEC IV. A “narrativa” do herói solitário não está pois a funcionar.
5. Sobra a “narrativa” do defensor do Estado social contra as investidas neoliberais. Mas também esta está em dificuldades. Afinal mais de metade dos quase 700 mil desempregados já não estão a receber qualquer subsídio. Afinal o único hospital que havia para inaugurar era um privado em Braga. Afinal os 500 mil ofendidos das Novas Oportunidades não compareceram em peso em Vila Franca de Xira, obrigando os serviços públicos, num momento de descarada confusão entre o Estado e o Partido, a enviarem emails para conseguirem quem lá fosse manifestar a sua gratidão. Afinal, cereja venenosa no topo do bolo das ilusões, a ideia de privatizar as Águas de Portugal, essa “aventura irresponsável”, foi de José Sócrates nos idos do ano 2000.
6. Sem programa e com a “narrativa” em ruínas, o “grande actor”, começa a ficar sem deixas. Nessa altura surgem-lhe os tiques salazaristas, como esse de sugerir que na oposição não se faz nada pelos portugueses. O ditador por certo diria o mesmo de Mário Soares.
Faltam agora duas semanas de campanha eleitoral. Começo a suspeitar que a dura realidade da crise vai ser fatal para as belas “narrativas”. Mesmo assim não me iludo: as ficções podem esgotar-se, mas os truques e os golpes baixos nunca terão fim. Aguardemos.
Público, 20 Maio 2011

Finalmente, Coelho saiu da toca.
E, finalmente, Sócrates viu inutilizada a sua cassete.
http://notaslivres.blogspot.com/2011/05/o-pec4-era-o-milagre-socialista.html
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Mais horas de trabalho diário é proposta para aumentar a produtividade.
Não tem sentido… Mais desemprego e desestabilização social inviabilizaria qualquer efeito dessa medida.
http://notaslivres.blogspot.com/2011/05/economistas-as-avessas.html
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Oh!… a “narrativa”…
http://lishbuna.blogspot.com/2011/05/somar-ao-resgate-implementacao-ao.html
Mas há outras:
http://lishbuna.blogspot.com/2011/05/eufemismo-do-ano-podera-ser-um-motivo.html
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Desde há uns 8 meses, quando se percebeu que o Passos Coelho tinha agarrado o Sócrates pelo cú das calças, ficou claro aos olhos de alguns portugueses que o Sócrates tinha os dias contados. Era e é só uma questão de tempo.
Penso que o Sócrates vai ter uma votação muito acima do que devia ter, mas também creio que o Passos Coelho sabe bem o que tem a fazer.
Digo mais, se não matarem o Passos Coelho como fizeram ao Sá Carneiro, podemos ter homem para colocar Portugal no lugar que merece.
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Os comentários, em geral, equivalem ao tão esperado debate. De facto, parece que o coelho saiu da toca mas, infelizmente, não deu o o ensaio que devia e podia ter dado ao “canalizador técnico”. Os socretinos, como toda a cambada socialista, precisa de ser posta a nú perante o nosso pagode que, espantosamente é tão estúbido que ainda não deu pelo engano em que está encharcado.
Foi curioso ver o canalizador da Câncio – agora substituida por um infante – a auto flagelar-se.
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Não estou a ver comparação possível
do Carneiro com o Coelho.
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É verdadeiramente irritante esta mania dos pseudo-analistas políticos (pseudo, porque verdadeiramente não o podem ser se não forem absolutamente imparciais) apelidarem de “inteligente” e de “boa comunicação” a utilização de argumentos vazios de conteúdo e até de verdade! Para mim este tipo de argumentos é um insulto à minha modesta inteligência! O pior, é que nesta pobre sociedade portuguesa, sempre que aparece alguém sério, que diz a verdade, e assume as suas próprias ideias, é sempre impopular, logo tido como um incapaz!
Enfim, premeie-se a ignorância e a falta de seriedade! Resultado um país de ignorantes e corruptos!
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1 e 2. Parabéns pela excepçao. Mas como o meu caro vai reparar até essas etiquetas de vencedores da narrativa mudam.
Assistimos hoje a essa mudança. O debate Socrates/Coelho correu de forma normal.Um típico debate em que nenhum sairia vencedor. E o que aconteceu? PPC é proclamado vencedor. É um inicio de uma nova era. O nosso pequeno Obama está a nascer.
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3.Nao vejo desilusão nisso. O CDS transformou-se num Bloco de direita. Vive do líder. Algo eficaz nas criticas.Uma ou outra bandeira de cartaz (c.facturantes num lado ; partido d contrinuinte/da policia etc no outro) E populismo qb nas ideias de governo. É, para mim,confrangedor ver que cada proposta do cds não significa outra coisa que aumentar despesa.
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4.5e6. O PS vive assim há 4 anos. Eu desconto os primeiros dois porque aí foi um governo ao nivel dos anteriores. Mesmo ao nivel do Cavaco. Apenas medíocre ou insuficiente mas não mais que isso.
( a mudança veio depois e não pensem os mais apressados que teve a ver com a crise. Antecedeu-a ;vide Saude.Educação.Etc).
Depois disso o Ps/Socrates vive apenas dessas tais “narrativas”. Cada vez mais simplistas e infantis mas vive delas. Até ao dia( hoje? ) em que a mare irá mudar. Aí, e depois de passar uns tempos, vamos todos sentir vergonha em ter suportado um individuo destes tanto tempo no poder.
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Seguindo o brilhante raciocínio do distinto autor, Portugal acordou neste sábado trivial com mais uma «narrativa» empolgante.
Esta «narrativa», preparada minuciosamente pela «agit-prop» ao serviço do ex-futuro Presidente do PSD, consiste numa ideia bastante peregrina: fazer-nos crer que Passos Coelho «ganhou» o debate de ontem.
O mais interessante é que já «rolava» pela internet, e muito antes da hora do debate, essa «narrativa».
Até o MST caiu nessa ratoeira dos marketeiros….
Como somos um país de «lendas e narrativas», ontem foi criada mais uma.
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«terem uma boa “narrativa”»
O mais indicado para o entendimento da plebe.
Junto com “pão e circo”.
A plebe, com as devidas excepções:
Sociais demo socialistas como Rui Pedro Soares ou Armando Vara.
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A ver…
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A LER..
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a reflectir..bom fim de semana…
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Foi uma vitória indiscutível do Passos Coelho.Aliás a sondagem que RTP encomendou à Universidade Católica dá uma vitória clara de 46% contra 33%. Já escrevi à RTP a pedir a ficha técnica desta sondagem,que estranhamente quase não é referida pela CS.A própria RTP nem fala dela no seu site.Já enviei um mail a solicitar a ficha técnica bem como os resultados totais.Imaginem que o resultado tinha sido ao contrário! De qualquer maneira sugiro ao BLASFÉMIAS que a publique na íntegra,ou seja,que faça o que a RTP está obrigada por lei a fazer!
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Não há narrativa nenhuma no PS nem em Sócrates.
Pelo contrário.
Para se ter narrativa seria preciso ser consistente.
Mentiras e contradições aparecem a cada semana.
.
O que há é uma comunicação social sem vergonha.
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Sr. Arlindo Costa:
Certamente não se importará que lhe abrevie o “Da” do seu nome, pois não? É que lhe dá um aspecto distinto e até pomposo, que pela forma como escreve, imagino que não lhe agrade. E além disso, estamos em crise, devemos poupar no que pudermos.
Só para lhe perguntar duas ou três coisinhas, que com prazer me responderá:
1. Onde vive?
2. Onde trabalha?
3. Que tipo de contrato de trabalho tem?
3. Qual o seu salário?
4. Qual o seu agregado familiar?
5. Vê televisão?
6. Lê jornais?
7. Apresenta capacidade cognitiva dentro da média?
Respondendo a estas pequenas questões talvez possamos todos perceber de onde lhe vem a sua admiração icónica e sádica pelo nosso mui estimado PM.
Um bem haja!
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agora parecem que se quer que assassinem Passos Coelho, para o elevarem ao lugar que merece: ao nível de Sá carneiro…
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parece
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