Saltar para o conteúdo

O Imposto Europeu.

29 Maio, 2009
by

A polémica estalou agora, novamente, durante a campanha para as eleições para o PE, em resultado das declarações de Vital Moreira. A tempestade no copo…, vá lá, garrafa de água  que imediatamente se desencadeou, era previsível. Por isso, a forma como tais declarações foram proferidas por Vital Moreira pareceu-me muito precipitada!

 Tudo era previsível, até mesmo se nos tivessemos recordado do respectivo antecedente histórico: a polémica de agora é um déjà vu,  da discussão subsequente a umas declarações semelhantes de Mário Soares, proferidas há uns poucos anos atrás (não sei mesmo se, também, durante uma campanha para as eleições europeias).

Sobre a questão, em tese geral e a nível informativo, é interessante ler este  breve estudo e descrição de António Carlos Santos, sobre o estado da (virtual) fiscalidade europeia.

Há, no entanto (mesmo considerando a informação contida no estudo referido), algumas questões eminentemente políticas que se podem e devem colocar:

1) Se o problema é posto (como, de facto, foi, por VM) em termos de um novo imposto europeu de substituição, total ou parcial, de algum imposto nacional, quem é que – sem existir uma verdadeira política fiscal comunitária – irá, então, controlar a tentação dos Estados-membros (principalmente, de Estados como o português) de não só compensarem a perda de receitas internas que, pela via do imposto europeu, se geraria, como ainda de aproveitarem a oportunidade para sobrecarregarem  mais os contribuintes?

Sem o controle efectivo da União (que seria sempre difícil no estado actual da integração, inexistindo uma política fiscal comum), está-se mesmo a ver o que é que os governos tentariam, logo a seguir, fazer… repito, sobretudo, governos de Estados que têm, em termos de tradição e de história recente, revelado uma voracidade bulímica pela obtenção de (cada vez mais) receitas!

Dito de outro modo, a discussão sobre um imposto europeu deveria ser sempre precedida de uma profunda discussão e consequente consenso político, intergovernamental, sobre a construção de uma efectiva política fiscal comum.

2) Não sendo muito crível que os Estados-membros queiram mesmo perder parte da sua soberania fiscal (o que, de resto, até seria muitíssimo saudável em Estados com tiques de má-fé e de totalitarismo fiscais e viciados em despesa pública, como o nosso!), então, a proposta de VM – ainda que tivesse sido bem fundamentada e menos vaga – será mesmo uma proposta para levar a sério?

Quer dizer, o que é que aconteceria se o PSE (partido socialista europeu) até ganhasse estas eleições? Se chegar a existir proximamente uma maioria de governos socialistas na europa comunitária, haverá mesmo a criação do dito novo imposto europeu? Ou será que, mais uma vez e como em tantas outras matérias, na hora da verdade (ou seja, no âmbito do processo de decisão comunitário), os governos (neste caso, maioritariamente socialistas) recuariam … porque existe crise e não há condições para que os Estados percam receitas?  E isto – bem entendido – já pressupondo que tais governos tinham aceitado previamente vincular-se a uma política comum e concordado com a hipótese de um novo imposto europeu que fosse mesmo de substituição de algum outro imposto nacional.

3)  Se tem sido politicamente  impossível  aumentar o orçamento da União – que se fixa, actualmente, nuns míseros 1,24% do Rendimento Nacional Bruto – então, como é que poderemos acreditar que os mesmos governos que inviabilizam sistematicamente tal aumento (e a capacidade de acção da União), iriam, agora, felizes e contentes, aumentar as receitas comunitárias à custa de uma diminuição das suas próprias receitas fiscais?

11 comentários leave one →
  1. Gabriel Silva's avatar
    Gabriel Silva permalink*
    29 Maio, 2009 13:56

    «Se o problema é posto (como, de facto, foi, por VM) em termos de um novo imposto europeu de substituição, total ou parcial, de algum imposto nacional»

    Sucede que isso não é um «facto», não foi o que VM sugeriu inicialmente (só agora, à posteriori e ainda assim, contra o que ele mesmo dissera e por causa das reacções, embora lhe custe a admitir).

    Vital falava na absoluta necessidade de aumentar os recursos da UE, sugerindo então um imposto europeu, dizendo ao mesmo tempo que não haveria aumento carga fiscal.
    Quiçá alguém possa descobrir, mas julgo difícil «aumentar recursos» sem aumentar carga fiscal, a não ser que ele defenda redução de despesas do estado, o que seria uma outra interessante contradição do habitual discurso dogmático despesista do candidato.

    Já agora, porque deveria existir uma «efectiva política fiscal comum»?
    Ou porque deveria o orçamento da união ser aumentado?

    Gostar

  2. PMF's avatar
    29 Maio, 2009 14:06

    “Já agora, porque deveria existir uma «efectiva política fiscal comum»?
    Ou porque deveria o orçamento da união ser aumentado?”

    É uma questão de perspectiva! Quem defenda um aprofundamento da integração no sentido “para” ou “pró-federal” (como é o meu caso e não é o do Gabriel), esse aumento faz todo o sentido, até mesmo porque isso significaria mais acção da União e menos dos Estados (sobretudo, em matéria fiscal e, particularmente, do nosso…coisa que afectivamente também me é particularmente grata, quer dizer, a limitação da acção – nomedamente, da acção fiscal – do Estado português!).

    Mas, sobre esta questão, os pressupostos são antagónicos e, nessa medida, a discussão torna-se de surdos…..

    Gostar

  3. Desconhecida's avatar
    Sylvia Andrade permalink
    29 Maio, 2009 14:25

    Leiam isto na comunicação estranjeira

    “””escreveu Jordi Joan (La Vanguardia)¹:

    ‘Mención especial merecen los carteles de Ferreira Leite que jalonan las carreteras portuguesas. “Não desista. Todos somos precisos”, reza. Pero la desolada foto en blanco y negro de la candidata, sin maquillar, podría hacer pensar a los turistas que visitan el Algarve que se trata del mensaje de una asociación de apoyo a la tercera edad o de prevención del suicidio.’””

    Gostar

  4. CAA's avatar
    29 Maio, 2009 15:13

    Excelente texto. Um contributo para se perceber o quadro do problemas em que o Ps e o PSD se têm (e nos têm) baralhado.

    Gostar

  5. lucklucky's avatar
    lucklucky permalink
    29 Maio, 2009 15:19

    Lamentável, nem a mais básica noção de que é impossível controlar os gastos federais, como aliás se vê nos EUA que ainda assim têm muito mais defesas legislativas.

    Fica também patente como para os Pró-União como PMF nunca há visão alguma, nunca há alguma perspectiva dos motivos de os Estados se comportarem desta maneira e de esses motivos estarem ainda mais presentes numa eventual União.

    Quanto mais União tivermos menos livres seremos. A Escolha torna-se impossível.

    Gostar

  6. Gabriel Silva's avatar
    Gabriel Silva permalink*
    29 Maio, 2009 15:28

    «Quem defenda um aprofundamento da integração no sentido “para” ou “pró-federal” (como é o meu caso e não é o do Gabriel)»

    ora aí está uma permissa que falha redondamente, certamente por desconhecimento.

    Acresce que certamente será entendido, pelo menos na boa teoria da ciência política, que qualquer sistema federal, assume competências delegadas pelos estados. Assim sendo, havendo um delegação de competências próprias numa outra entidade (a federal) não se vê porque existindo simples transferência de competências não haveria de suceder o mesmo em termos de transferências financeiras correspondentes. Pelo que em termos globais não haveria azo (pelo menos com o fundamento federalista) para aumento de carga fiscal.

    Vejo recorrentemente entusiasmo (dito «federalista») sobre o aumento de competências da UE, e pelos vistos até com o aumento do seu orçamento. Mas sem excepção, ninguém é capaz de argumentar porque tais competências seriam melhor executadas pela ue e não pelos estados.

    O argumento fiscal que PMF apresenta é também interessante: de que a melhor forma de limitar a acção fiscal de um estado como o português seria transferir essas responsabilidade para a UE. Sucede que não indica porque inspiração de origem desconhecida ou quiçá graça congénita a UE seria melhor administradora fiscal ou menos interventiva, sendo que a sua prática poderá eventualmente indiciar comportamento ainda mais pernicioso,
    e que a boa prática liberal sempre indica que quanto mais próximo for o grau de decisão sobre despesas/receitas melhor controle e beneficio existirá.

    Sobre a eventual bondade da introdução de uma «política fiscal comum», própria de estados centrais e inversa aos estados federais, nada se disse.

    Gostar

  7. PMF's avatar
    29 Maio, 2009 16:42

    Gabriel,

    “ora aí está uma permissa que falha redondamente, certamente por desconhecimento”.

    Não percebi!! Desconhecimento de quê?

    – “(…) havendo um delegação de competências próprias numa outra entidade (a federal) não se vê porque existindo simples transferência de competências não haveria de suceder o mesmo em termos de transferências financeiras correspondentes. Pelo que em termos globais não haveria azo (pelo menos com o fundamento federalista) para aumento de carga fiscal”.

    Pois não! Apesar dessa perspectiva de jogo de “resultado nulo” esquecer a própria dinâmica e evolução permanentes das organizações políticas e, naturalmente, na perspectiva da construção comunitária, entender-se (até mesmo por causa da subsidiariedade que é invoacada, também, algures no comentário) principalmente como monitorização e fiscalização da aplicação, por parte das entidades nacionais, de tal política comum! De resto, isto já existe e está em marcha em inúmeras políticas (vg., concorrência); agora, importa não esquecer, nem confundir a esfera das atribuições exclusivas, concorrentes e exclusivamente nacionais. O que me parece que, nesse tipo de raciocínios feitos à imagem e semelhança do modelo de estado (basicamente) bodiniano com que ainda vamos vivendo, se esquece permanentemenet de fazer!

    Mas, uma questão: leste bem o post?! A ideia, apesar de tudo, é a de que falar-se de um imposto europeu (já existem alguns, porém, sem o impacte e a importância que os tornem sentidos pelos contribuintes) não faz sentido sem uma política fiscal comum. Só depois é que se passa ao que pode ser o desenho (global) de uma política fiscal…que, pelos vistos, já antecipas, à imagem e semelhança de uma mera política fiscal estadual!!

    Gostar

  8. Desconhecida's avatar
    Tribunus permalink
    29 Maio, 2009 16:51

    Existem uns rapazes, neste blog, que falam na independencia de Portugal! Coitados, deem uma volta pelo capital social das maiores empresas implantadas neste país e verificam que a nossa capacidade de decisão sobre as mesmas è praticamente nula……………portanto cada vez a UE tomar mais decisões sobre Portugal, será maior………o que são as directivas?
    decisões impostas à revelia de governamentos que temos tido sem eira nem beira! Claro que vem sempre uns politicos, tipo ministro das finanças com umas fumaças, que no dia seguinte estão desmentidas! não foi a UE que nos levou a ter uma das maiores dividas dos 27!

    Gostar

  9. PMF's avatar
    29 Maio, 2009 16:51

    “Sucede que não indica porque inspiração de origem desconhecida ou quiçá graça congénita a UE seria melhor administradora fiscal ou menos interventiva”

    O exemplo comparado – sobretudo, comparando e atendendo à administração portuguesa (desde logo, na gestão do primeiro quadro comunitário de apoio)- acho que legitima essa esperança. Na realidade, é mais do que esperança, tem sido uma evidência recorrente!. Quer dizer, além do mais, pior (do que tem sido a nossa administração) nunca poderia ser!!

    Agora, “a inspiração de origem desconhecida” a que aludes é a mesma que leva à conclusão contrária (por exemplo, a que insinuas), já por antecipação ou prognose!! (bom, na realidade, não é, desde logo pelo que referi atrás, mas pronto…. vamos aceitar que é!!). E digo isso, evidentemente, sem ponta de ironia, sobretudo no caso do “eficiente”, “justo” e “não violador das liberdades individuais” Estado português e, sobretudo, à luz do que tem sido a experiência histórica (infelizmente).

    Gostar

  10. Desconhecida's avatar
    Araujo Vintem permalink
    29 Maio, 2009 16:57

    Está lá a tralha do PSD.

    BPN e BPP.

    Há dúvidas.

    Resta saber, se o Freeport não cai no telhado da S. Caetano.

    Não sei porquê mas o sentimento puxa-me…

    Vereador de Setubal

    Mar da Palha.

    Vamos nadar.

    Vai ser um “porradão”

    Gostar

  11. PMF's avatar
    29 Maio, 2009 17:29

    Sobre a eventual bondade da introdução de uma «política fiscal comum», própria de estados centrais e inversa aos estados federais, nada se disse.

    Sobre a bondadade (melhor, conveniência) de tal política fiscal, nada se disse, porque, dentro de determinados pressupostos (evidentemente muito discutíveis!), não é de difícil compreensão…quer dizer, resultaria claro do que foi dito e do discurso estribado nesses pressupostos. Porém, voltaremos adiante e oportunamente a isso!

    Agora, o que me parece dever ser esclarecido é a afirmação de que “(…) uma «política fiscal comum», (é) própria de estados centrais e inversa aos estados federais”!…… Porventura, o entendimento de “política comum” – que intuio não dever ser o mesmo!

    Gostar

Indigne-se aqui.