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Coligações

12 Setembro, 2009

A situação normal em democracia, incluindo a nossa, seria que os partidos mais à esquerda, embora disputando eleitorado entre si, num cenário em que nenhum alcance sozinho maioria no parlamento, se dispusessem a realizar coligações entre si. O mesmo se diga para os partidos ditos à direita. Coligações pós-eleitorais é o que de mais natural existe, não tem nada de extraordinário.

É verdade que em Portugal os partidos tem algumas características que os diferenciam do panorama geral. Em primeiro lugar, não existe nenhum partido assumidamente conservador, à semelhança dos britânicos, do PP espanhol, da CDU alemã e similares. Por cá, o partido de alternativa de poder designa-se, e os seus dirigentes assumem-se, como «sociais-democratas», (ou seja dentro do corrente do socialismo democrático, partilhando tal característica com o seu principal opositor e com os partidos sociais-democratas e trabalhistas europeus). O CDS/PP por sua vez, diz-se «democrata-social» e da «democracia-cristã» (corrente histórica em desuso, sendo uma espécie de social-democracia mas mais queque).

Apesar ou também por isso, e considerando sobretudo o perfil do seu eleitorado (mais conservador que os discursos e práticas dos respectivos partidos), ambos os partidos não tem tido especial dificuldade em realizarem coligações pós-eleitorais de governo.

Na esquerda, também existem desvios à norma europeia. Se é verdade que o PS se insere dentro da família tradicional social-democrata/trabalhista, já os partidos à esquerda da esquerda são distintos dos seus congéneres europeus: o PCP é provavelmente o único bastião de características soviéticas e estalinistas com peso parlamentar na Europa ocidental. E os anticapitalistas  do BE  tem actualmente um peso muito mais elevado que os seus irmãos Die Linke  alemães e os franceses do Novo Partido AntiCapitalista.

Uma coligação PS/PCP, ainda que apenas parlamentar, parece de impossível concretização, seja pelo lastro histórico de ambos os partidos, seja sobretudo pelo PCP estar habituado a liderar e fomentar a contestação social de rua, não se prevendo que se dispusesse a desistir da mesma, a troco de praticamente nada, pois que a margem socialista seria pequena.

Com o BE as coisas, apesar da retórica agressiva, serão provavelmente mais fáceis. Embora expressamente apostados na transformação radical do espaço tradicional do PS, as suas reivindicações eram até há pouco tempo sobretudo «coloridas», (ainda que perniciosas), e não de todo incompatíveis com a agenda socialista. Não seria especialmente difícil abdicarem das «grandes transformações» que agora enunciam, se reconhecerem pretender evitar a concretização de um governo «centrão». Empurrar o PS para «a grande coligação» é um preço que o BE já não poderá com facilidade aceitar pagar. O facto de pela primeira vez o BE apresentar meia dúzia de medidas estruturantes, incompatíveis com os socialistas, demonstra precisamente que pretende deixar a marca do «nós somos diferentes». Ao eventualmente aceitar uma coligação com PS, abdicando daquelas grandes pretensões «para quando formos os mais votados» (ou na sua expressão «reconfigurarem a esquerda», estaria em condições favoráveis de assegurar a mais modesta agenda «fracturante»,  sabendo que esta será a única que o PS poderá aceitar.

E o «centrão» é possível? Sim, mas apenas na insuficiência dos resultados do BE ou PP servirem de complemento a quem seja o mais votado. Embora não esquecendo que tal hipótese seja o cenário que Cavaco de longe sempre prefiriria em detrimento de qualquer outro, parece mais realista prever que um eventual «centrão» se confinasse apenas a um acordo parlamentar (orçamento e pouco mais).

Perante isto, ao eleitor tradicional de «direita» coloca-se o dilema entre optar por reforçar o psd para este alcançar uma vitória, mas com o risco de se tal não for alcançado ver tal partido obrigado a suportar um governo socialista, ou, em alternativa apostar no PP. Esta última hipótese parecerá para tal eleitor certamente a solução mais segura, pois em qualquer caso reforçará o peso de uma eventual vitória do centro-direita e sempre evitará contribuir para a existência de um governo socialista suportado pelo psd.

À esquerda, para o eleitor parcialmente descontente com o governo, o dilema será apostar ou no BE, reforçando-o para negociar um governo socialista mais à «esquerda» ou um voto nos socialistas para evitar vitória do psd.  No entanto, entre as duas hipóteses, a segunda (voto no ps) parecerá mais eficaz do que a primeira, na medida em que sendo actualmente incerto o resultado final, o voto no BE tem o risco de poder contribuir directamente para uma vitória da «direita».

Dito isto, que se pretende mera análise, na verdade o facto mais significativo do actual panorama político será que, à direita, se desperdiçaram, por estupidez e incompetência, 4 anos e meio onde teria sido possível reorganizar esse espaço eleitoral no sentido de construção de verdadeira alternativa ao lastro social-democratizante dos últimos 30 anos, ao invés de pretender contribuir para a sua continuidade, como se a realidade não tivesse já provado exaustivamente a sua inutilidade e efeitos desastrosos.

19 comentários leave one →
  1. VFS's avatar
    12 Setembro, 2009 16:15

    Tanto para o país como para o PS, será muito mais benéfico um bloco central do que uma convergência de esquerda. Claro que tal só acontecerá sem a MFL.

    Para o país, uma convergência de esquerda será desastrosa, mas não é impossível.

    Garantias

    No entanto, quem mais arrisca com a chegada ao poder é o BE. Há muitos portugueses a procurar uma alternativa em partidos que não estiveram no poder. Infelizmente, à direita, não é possível.
    Como tal, o BE pode perder o seu “estado de graça” com a passagem pelo poder.

    Resta saber se o país aguenta uma legislatura destas.

    A ver vamos

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  2. Desconhecida's avatar
    K2ou3 permalink
    12 Setembro, 2009 16:15

    Por uma questão de solideriedade.
    Ao que parace, nimguem lhe liga.

    http://pontadelgadaemboasmaos.blogspot.com/

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  3. Pascoal's avatar
    Pascoal permalink
    12 Setembro, 2009 16:20

    Quando que um bloger resolve comentar quem casa com quem saem posts pífios como este.

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  4. Desconhecida's avatar
    K2ou3 permalink
    12 Setembro, 2009 16:31

    Meu caro pscoal 3,

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  5. Mani pulite's avatar
    Mani pulite permalink
    12 Setembro, 2009 17:28

    Os comunistas Stalinistas e os comunistas Trotskistas são inimigos irreconciliáveis desde os anos 20 do Sec.passado.Nunca poderão estar juntos num Governo.Qualquer dos outros que se coligar com Sócrates cometerá um suicídio político.Seria um Governo para poucos meses.A única alternativa realista é um Governo PSD/CDS dirigido por MFL.É para isso que apontam as sondagens e pouco falta para essa coligação ter a maioria necessária na Assembleia.Qualquer Português sensato percebe isto e votará MFL em 27.9.

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  6. chessplayer's avatar
    chessplayer permalink
    12 Setembro, 2009 18:41

    Boa Mani Pulite
    “Qualquer Português sensato percebe isto e votará MFL em 27.9.”
    ainda há quem acredite no papai noel.

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  7. Oraporra's avatar
    Oraporra permalink
    12 Setembro, 2009 18:55

    Para muitos socialistas a solução passa po PS/BE.

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  8. Oraporra's avatar
    Oraporra permalink
    12 Setembro, 2009 18:58

    PS/PSD, volta ser mais do mesmo quando existiu o Bloco Central como primeiro ministo. PSD No Governo, PSD a fazer oposição ao governo. Só Cavaco vei por fim à maior maioria de sempre.

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  9. Oraporra's avatar
    Oraporra permalink
    12 Setembro, 2009 19:00

    PS/PSD, volta ser mais do mesmo quando existiu o Bloco Central com Mário Soares como primeiro ministo.
    PSD No Governo, PSD a fazer oposição ao mesmo governo ao qual pertencia. Só Cavaco veio por fim à maior maioria de sempre

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  10. José Barros's avatar
    José Barros permalink
    12 Setembro, 2009 19:11

    Não concordo muito com as conclusões do Gabriel Silva pelas razões que tentarei dar:

    1) Os partidos de direita não conseguiram – até ver – assegurar uma vitória contra um governo asfixiante (em todos os sentidos, não apenas no que respeita às liberdades individuais). Falharam do ponto de vista eleitoral e, por isso, tudo está dependente dos próximos dias e de decisões de último momento por parte dos indecisos.

    2) Isto dito, os discursos de Portas e de Ferreira Leite são mais liberais do que alguma vez o foram nos respectivos partidos ao longo dos últimos 15, 20 anos. O que, desde logo, me parece inquinar um pouco a ideia de que o PSD é social-democrata (cada vez menos) e de que o PP é democrata-cristão (rótulo também cada vez mais obsoleto). As tendências estão a mudar no sentido de os partidos à direita se tornarem mais liberais. O que não se pode esperar é que mudem de um dia para o outro. Principalmente, sendo a história do país a que é.

    3) À direita, há sondagens que dão 32% ao PSD, mantendo o CDS cerca de 8%. O que sugere que a vitória do partido social-democrata não depende necessariamente dos votos dos eleitores do CDS. Não dependeram, por exemplo, nas europeias, em que o PSD ganhou, obtendo o CDS uma votação razoável. Já para a maioria absoluta de uma eventual coligação seria necessário mais do que isso. E é esse o drama: não é previsível que aconteça, sendo certo que, do outro lado, qualquer coligação será muito difícil.

    4) O próximo governo durará dois anos (ou menos). Ver-se-á quem, depois do dilúvio, conseguirá colher votos de mais um governo falhado. O poder ou a oposição? Ganhar estas eleições poderá significar receber um presente envenenado.

    5) Certo é que o perdedor não sobreviverá. Sócrates ou MFL, um deles perderá a liderança do partido. Isto é mau, sobretudo, para o PSD, em que a alternativa pode resumir-se a Passos Coelho, um candidato com um percurso parecido com o de Sócrates e, ou muito me engano, um tipo perigoso como o PM. Já se Rangel se candidatar a coisa pode mudar à direita. E era bom que assim fosse. No PS, pelo contrário, qualquer mudança será positiva: Costa, Seguro ou qualquer outro candidato deverão ser melhores que Sócrates. Pelo menos, menos “chavistas”, o que, nos tempos que correm, já não é de todo mau.

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    • Gabriel Silva's avatar
      Gabriel Silva permalink*
      12 Setembro, 2009 19:18

      Caro José Barros,

      1) pois não, e perante um tão mau governo, é significativo….
      2) mudou pouco, ou quase nada. Nem podia ser de outra forma, as lideranças são quase as mesmas de 2003/2005.
      3) há uma diferença: até há dois meses, qualquer sondagem, dava ao cds/pp 2, 3 ou com sorte 4%. E depois via-se que era bastante mais. Agora dá entre 6, 8 ou 9%. Ou houve correcção técnica, o que não foi anunciado, ou de facto está a subir bastante.
      4) Certo.
      5) Vamos ver, embora confesse ser-me relativamente indiferente quem seja líder, pois a essencia da coisa, nos dois, está la, sendo obviamente mais preocupante no psd e não vejo que seja com rotatividade de líderes (como se provou nos últimos 4 anos) que alguma coisa mude.

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  11. Mani pulite's avatar
    Mani pulite permalink
    12 Setembro, 2009 19:12

    Com MFL Nunca Haverá Bloco Central.Uma mulher séria nunca se “casa” com um vigarista e mais alguma coisa que não digo.Agora, já imaginaram o que seria um Governo Sócrates-Passos”Ângelo” Coelho,ou Sócrates-Santana Lopes,ou ainda Sócrates- Luís Filipe Menezes?A bem do nosso futuro,há mesmo alguma alternativa à Manela?

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  12. Desconhecida's avatar
    Anti-Chulos permalink
    12 Setembro, 2009 19:28

    Desde que seja para pôr o socretino na rua, eu apoio uma coligação do PSD com a CDU.
    Dois partidos conservadores e que defendem quem trabalha e produz.

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  13. Oraporra's avatar
    Oraporra permalink
    12 Setembro, 2009 19:30

    “Uma mulher séria nunca se “casa” com um vigarista e mais alguma coisa que não digo digo”

    Em meu entender esta afirmação é uma ofensa.Mesmo que aquilo que afirma pode ser verdade qual seria a sua opinião à seguinte frase:
    Um vigarista nunca se casaria com uma rameira e mais alguma coisa que não digo.
    Gostaria de ver isto? Eu não!

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  14. Anti-liberal's avatar
    Anti-liberal permalink
    13 Setembro, 2009 04:07

    .

    Creio que o grande problema é Portugal ter uma população com uma enorme ignorância política.
    As pessoas não sabem o que é a Direita. Chega a chamar-se de “direita” o Cenrtro Democrático Social.
    Se o hemisfério de Esquerda se decidir por qualquer coligação, não resulta porque ninguém se entende. A hipótese mais saudável seria o PSD com o CDS, mas, mesmo assim, es seus verdadeiros objecivos políticos são diferentes.
    Aparentemente, a Direita não quer apresentar-se como partido e nem pensa misturar-se com os outros.

    Nuno

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  15. balde-de-cal's avatar
    balde-de-cal permalink
    13 Setembro, 2009 06:33

    no verão de 1948 morei um mês na travessa das almas em frente da casa de Maria Clara. tive oportunidade de ver o pai de Júlio. Desapareceu uma Senhora.

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  16. GLORIOSO SLB's avatar
    13 Setembro, 2009 14:56

    Tendo em conta que a vitória do PSD não é certa, também para o eleitor de direita a melhor solução passará se calhar por votar PSD para evitar nova vitória da esquerda (por oposição a votar no CDS).

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  17. Desconhecida's avatar
    Eleitor permalink
    14 Setembro, 2009 08:38

    .
    Isto já está resolvido ?
    .
    “(04.06.2009 – 08h22 Sofia Branco) Número dos que podem votar não bate certo com os recenseados.
    Quase um milhão de pessoas separa o número de cidadãos maiores de 18 anos e, portanto, com capacidade para votar, e o número de recenseados. O primeiro, fixado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), é de 8.642.681, enquanto o segundo sobe para 9.562.141. Os especialistas ouvidos pelo PÚBLICO dividem-se nas explicações para este hiato.”
    .
    http://aeiou.expresso.pt/cadernos-eleitorais-irregularidades-nao-prejudicam-verdade-do-recenseamento-considera-o-governo=f529317
    .
    650 mil “votos fantasma” nos cadernos eleitorais
    http://jn.sapo.pt/PaginaInicial/Nacional/Interior.aspx?content_id=1335878
    .
    http://www.oprimeirodejaneiro.pt/artigo.asp?ed=1974&id=3&page=10
    .
    Cadernos eleitorais com 650 mil “eleitores fantasma”
    http://tv1.rtp.pt/noticias/index.php?t=Cadernos-eleitorais-com-650-mil-eleitores-fantasma.rtp&article=271313&visual=3&layout=10&tm=8
    .
    http://tv1.rtp.pt/noticias/index.php?t=Governo-rejeita-urgencia-nos-cadernos-eleitorais.rtp&article=268611&visual=3&layout=10&tm=9
    .
    http://www.correiodominho.com/noticias.php?id=11141
    .
    Peso deste número de ‘votantes fantasmas’ nas vitórias e resultados eleitorais:
    (Resultados Eleitorais desde 1975)
    http://eleicoes.cne.pt/sel_eleicoes.cfm?m=raster
    .
    A SERIEDADE e CONFIABILIDADE NOS CADERNOS ELEITORAIS têm de assegurar a impossibilidade de Fraude Eleitoral lesando Eleitores e Partidos. Tem a palavra a Comissão Nacional de Eleições.
    .

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  18. Tiago Mouta's avatar
    14 Setembro, 2009 15:44

    Venha o Bloco de Esquerda sem coligações, este País precisa de outros “desastres” diferentes além dos que já teve nos últimos 35 anos, a queda do “centrão” é o objectivo… Fim de xuxas e ditadores, abaixo os compadrios e os betos da coca democratas cristãos… Venha a revolução social!!!

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