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Criminalizar crimes

30 Abril, 2014

Criminalizar a praxe faz tanto sentido como criminalizar o enriquecimento ilícito, ou seja, nenhum. Em primeiro lugar, não se pode criminalizar a existência de um ritual por si só sob consequência de ilegalizar o baptizado católico, o casamento gay, os discursos no 25 de Abril ou o Sócrates na RTP. Em segundo lugar porque qualquer ritual envolvendo crimes já constitui… crime.

Uma ideia melhor para o espírito regulador português seria a criação de uma lei de criminalização de crimes.

25 comentários leave one →
  1. Manolo Heredia's avatar
    Manolo Heredia permalink
    30 Abril, 2014 07:54

    É questão de semântica. Não é correto dizer “criminalizar o enriquecimento ilícito” mas sim “considerar o aumento enorme de património pessoal, em porco tempo, sem motivo à vista, ilícito”.

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    • anónimo's avatar
      anónimo permalink
      30 Abril, 2014 10:53

      Se em vez de criminalizar o enriquecimento ilícito – algo que será sempre impossível devido à irretroactividade da lei penal -, a escolha fosse a de reaver para o Estado os Patrimónios manifestamente estranhos, esquecendo-se a questão do crime e da prisão….

      Qualquer vara, por exemplo, sabe quanto ganhou em cada ano. Se agora ostenta um património desproporcionado, o Estado intenta contra ele uma acção civil por enriquecimento sem causa, invertendo o ónus da prova – em direito civil tal é possível -. E , então, o vara do exemplo prova – porque o onus é dele – que a herdade foi comprada com as mais valias da vivenda que vendeu mais a ajuda da sogra, etc e fica claro que, pelo menos aquela herdade não foi paga pela sucata.
      Ou então o vara do exemplo não consegue provar onde foi buscar dinheiro para comprar a herdade e fica sem ela a favor do Estado. Teve a oportunidade de provar a regularidade da respectiva aquisição. Se não o fez, é porque não conseguiu. Os seus diretios foram garantidos.

      E assim se iam buscar os andares dos chefes de repartição de finanças que estão em nome dos respectivos filhos, desde o tempo em que os miúdos tinham 10 anos de idade, a casa em nome da mãe, etc, etc. Tudo para reduzir a dívida pública.

      Curiosamente a questão está a ser empurrada para a sede criminal exactamente por aqueles a quem não interessa discutir a questão da corrupção institucional. Porque em sede criminal a questão não tem solução.

      Eu consigo percorrer o meu caminho patromonial desde os meus 20 anos de idade e mostrar o que recebi, comprei, vendi e realizei mais valia para ter o património – poucachinho, entenda-se, – que tenho.

      O meu ponto fraco é a sisa . Aliás, como é o ponto fraco de 99% dos portugueses. Mas com uma amnistia na parte da sisa, as pessoas já não tinham a desculpa para não explicar o património que têm.

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    • JoaoMiranda's avatar
      JoaoMiranda permalink*
      30 Abril, 2014 13:04

      Qual foi o crime cometido nesse caso?

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      • anónimo's avatar
        anónimo permalink
        30 Abril, 2014 14:22

        Qual crime ? A questão é mesmo essa. Não tem que haver crime. É abordar o enriquecimento proporcionado por actos menos éticos dos titulares de um qualquer poder funcional como mera realidade patrimonial sem causa ou fundamento válido.
        A lógica é deixar de tratar o enriquecimento ilícito como um crime e passar a ser tratado apenas como uma realidade ilegal e ilegítima.

        Porque o que interessa não é levar á prisão os “enriquecidos ilegítimos” – situação, ademais, impossível, pelo princípio da não retroactividade das leis penais. O que interessa é reaver o património abichado pelos corruptos.

        (Após o 25Abril é que parece que as coisas para serem censuráveis têm obrigatoriamente que ser criminosas. Mas isso não é verdade. Esta “leitura da vida” de ver crimes a cada esquina, é apenas o que convém ao MºPº para manter o poder excessivo que esta organização fechada, não eleita e corporativa, detém num regime que é menos democrático exactamente devido á existencia do MºPº tal como ele é).

        Exemplo típico: dois andares em nome dos filhos do chefe de repartição de finanças que tinham 10 anos de idade quando as escrituras foram outorgadas. Percebe-se que as crianças, ou receberam uma herança da avó para comprar aqueles andares, ou foi o respectivo pai, chefe de repartição que fechou os olhos ao valor declarado pelo construtor civil envolvido. Até porque este construtor era contribuinte daquela repartição de finanças. Sendo certo e seguro que o pai e a ma~e não ganhavam o suficiente para poder comprar e pagar aqueles andares.
        Intentada pelo Estado a acção civil com causa de pedir em enriquecimento sem causa, ou os filhos do Chefe de repartição provavam a herança recebida da avó, ou outra causa legítima de fortuna aos 10 anos de idade, ou não provavam coisa alguma. Se não provavam, perdiam os andares a favor do estado. Porque ninguém é dono de andares que caem do céu.

        O que é que me interessa que o chefe de repartição venha a ser julgado e preso mais de 20 anos depois (sendo a prescrição penal mais uma condicionante da eficácia) ? Interessa-me é que eu,contribuinte, seja reflexamente compensado ao ver o Estado a receber o produto de uma vigarice antiga praticada pelo tal chefe.

        Digo eu. Perante o manifesto beco sem saída em que o enriquecimento ilícito se transformou por ser abordao exclusivamente pela vertente criminal.

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      • anónimo's avatar
        anónimo permalink
        30 Abril, 2014 14:31

        mais uma coisa: o factor desencadeante seria um qualquer sistema de deteção de meios de riqueza extraordinária, por adaptação dos critérios fiscais já existentes.

        Vai-se á matriz, e está lá um andar em nome de um jovem de 25 anos (agora) que o comprou há 20 anos atrás. Isso seria o suficiente para legitimar que se lhe fizessem perguntas, em especial, onde é que aos 5 anos de idade tinhas dinheiro para comprar este andar ?

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      • Alexandre Carvalho da Silveira's avatar
        Alexandre Carvalho da Silveira permalink
        30 Abril, 2014 17:34

        Há vinte anos havia muito dinheiro debaixo dos colchões deste país. Aposto que o tal chefe de finanças se fosse questionado sobra a origem do dinheiro para comprar os andares, haveria de responder: eram as economias do meu pai, ou do meu avô, ou do meu tio, etc, de uma vida de trabalho, e como não confiava nos bancos, tinha o dinheiro guardado em casa. Já perguntar ao filho do chefe das finanças onde é que ele tinha dinheiro para o andar aos cinco anos, parece-me perfeitamente estúpido.

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      • anónimo's avatar
        anónimo permalink
        1 Maio, 2014 13:01

        O dinheiro debaixo do colchão não cai do céu. também tem uma origem. A qual teria que ser provada de forma credível. O ponto sobre a inversão do ónus da prova é mesmo esse. O que V. faz no seu raciocínio é deixar o onus conforme está, ou seja, “eu tenho o dinheiro debaixo do colchão, logo presume-se que tem origem e explicação legítima”. Mas o meu pressuposto era exactamente o contrário. Toda a gente teria que provar a origem das patacas.
        Por isso apelidar de “estúpida” uma hipótese em que V. altera as premissas lógicas da discussão, não é uma questão de “estupidez”. É uma questão de poucachismo nas sinapses. V. não percebeu a hipótese, não alcançou as variáveis potenciais, mas mesmo assim vai de escoicear qualificativos para cima do pagode..

        Ademais, a hipótese referia-se ao andar em nome do filho. Registado na Conservatória em nome do filho. Por isso o filho é que tem que responder sobre se tinha ou não meios próprios. E se (como desconfiamos) o dinheiro era do Pai, mas se o andar ficou em nome do filho, era exactamente para interromper o fluxo financeiro de que o pai beneficiara e manter este fora da estrutura negocial.

        Querer explicar a situação incluindo na narrativa uma figura cuja exclusão do circuito foi a primeira preocupação do negócio simulado, é de uma estupidez lógica que não lembra ao diabo.
        Vá, vá lá, ler outra vez a hipótese a ver se agora já lá chega sózinho em vez de vir para aqui chamar estupidos aos outros.

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  2. Bento 2014's avatar
    Bento 2014 permalink
    30 Abril, 2014 09:10

    Portugal ás avessas disfarça a buracada.

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  3. Ricciardi's avatar
    Ricciardi permalink
    30 Abril, 2014 09:28

    No ritual do baptizado católico parece que não se bate com a cabeça do caloiro na pia baptismal.
    .
    Rb

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    • vitorcunha's avatar
      vitorcunha permalink*
      30 Abril, 2014 09:39

      OK: bater com a cabeça na pia baptismal passa a ser criminalizado. Ou talvez até já seja.

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    • CondeGil's avatar
      condegil permalink
      30 Abril, 2014 15:02

      No ritual da praxe também não se bate com a cabeça do caloiro na pia baptismal.

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  4. rhianor's avatar
    30 Abril, 2014 09:29

    A castração feminina é um ritual…

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    • vitorcunha's avatar
      vitorcunha permalink*
      30 Abril, 2014 09:38

      Fazer uma tatuagem manhosa enquanto bêbado em Benidorm também.

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  5. Ana Vasconcelos's avatar
    Ana Vasconcelos permalink
    30 Abril, 2014 10:35

    Uma praxe que dê para o torto já está criminalizada. É crime de ofensas á integridade fisica. Não me parece que valha a pena criar um novo tipo de crime

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  6. António's avatar
    António permalink
    30 Abril, 2014 11:16

    VC faz sentido. Mas a lei e os costumes têm de se adaptar criando um feedback positivo.

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  7. @!@'s avatar
    @!@ permalink
    30 Abril, 2014 11:28

    Há por aqui gente que se diverte com as “praxes” e com a “justiça”.Não compreendo por isso o seu contra a criminalização da praxe. Até fez um manual de comportamento que foi mandado às malvas qual rainha das copas.

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    • Joaquim Amado Lopes's avatar
      Joaquim Amado Lopes permalink
      30 Abril, 2014 14:33

      Quando entrei para o ISEL fui praxado duas vezes.
      A primeira, ao fazer a inscrição, foi-me exigido o comprovativo da micro (que tinha deixado de ser necessário precisamente a partir daquele ano). Segui as indicações para uma sala dentro do ISEL, onde a tirei e me deram o respectivo comprovativo. Só mais tarde soube que a tal “micro” foi na realidade uma fotocópia do meu peito. Passados quase 30 anos ainda conto esta história com um sorriso nos lábios. (nota: o pessoal da Secretaria alinhou nesta praxe)
      A segunda praxe foi na primeira aula. Um aluno do último ano fez-se passar por professor. A sala estava cheia, com os caloiros e os alunos do 2º ano. Ficámo-nos a conhecer e ofereceram-nos conselhos, apontamentos e enunciados de testes de várias cadeiras.

      Creio que no ano seguinte, circulou a história (não posso afirmar se verdadeira) de que no IST tinham fechado uma turma de caloiros numa sala e despejaram extintores lá para dentro. Em pânico, os caloiros partiram janelas e alguns sofreram cortes.

      Acha mesmo que praxes como as que me foram feitas devem ser criminalizadas?

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      • CondeGil's avatar
        condegil permalink
        30 Abril, 2014 15:12

        Eu sou hoje aluno do ISEL e repare: quando me inscrevi também me “exigiram” que fosse para um determinado lugar para ser praxado. Eu disse que não queria, “eles” fizeram de tudo para me convencer (não mais que qualquer testemunha de Jeová). Eu mantive-me firme e fui para casa. Hoje tiro fotocópias ao mesmo preço que os outros, ninguém me obrigou a nada. A tradição não deve acabar só porque alguns idiotas que não gostam de praxe não querem que ninguém seja praxado (não acredito que seja isto mas pronto). Estou consigo, o que é crime deve ser criminalizado, o resto é brincadeira.

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      • @!@'s avatar
        @!@ permalink
        30 Abril, 2014 16:24

        Olhe, acho que depende dos humores. Se na altura estivesse chateado era capaz de ficar furioso e a coisa poderia dar para o torto, como estava no deixa andar ficou numa de porreiro pá pois nós somos assim e prontos não há volta a dar-lhe o pior é quando nos querem fazer de assados então aí é que a conversa pia mais fino e parece que não há castigo suficiente para os que se portam mal, dependendo dos angulos.

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      • Joaquim Amado Lopes's avatar
        Joaquim Amado Lopes permalink
        1 Maio, 2014 19:27

        @!@,
        E se “desse para o torto” o resultado poderia justificar uma participação às autoridades e eventual processo-crime.

        Há muitas coisas que podem “dar para o torto”. Por exemplo, oferecer uma bebida num bar ou chamar “feio” ou “gordo” a alguém pode facilmente “dar para o torto”.
        Deve tudo isto passar a ser crime porque podem “dar para o torto”?

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  8. John's avatar
    John permalink
    30 Abril, 2014 12:06

    Mais um que não sabe da existência da Filosofia do Direito…

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  9. joao lopes's avatar
    joao lopes permalink
    30 Abril, 2014 15:32

    as praxes,genero escola agricula santarem apenas servem aos famosos marialvas,os tais muito corajosos em rebanho,mas que sozinhos nao passam de umas aves raras…

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  10. BELIAL's avatar
    30 Abril, 2014 21:25

    Ao código da praxe sobreponha-se o código penal.

    Se existirem condutas ilícitas na aplicação desses “ritos”, punam-se aquelas.

    Sempre haverá facínoras que usarão a praxe para uso e abuso de sevícias.
    Porém, mesmo sem praxe, terão os mesmos comportamentos – noutros envolvimentos e ambiências de grupo.

    Que o pretexto da praxe não sirva de pretexto.
    A culpa não é do tijolo, mas de quem o atira à cabeça alheia.

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  11. JorgeGabinete's avatar
    JorgeGabinete permalink
    30 Abril, 2014 21:53

    Como não cursei direito devo estar a leste…
    Criminalizar um ilícito não é uma redundância, um ilícito não é necessariamente crime mas todo o crime é um ilícito. No caso do enriquecimento ilícito temos que as actividades não lícitas que podem levar ao enriquecimento não são necessariamente crimes e os que o são podem ser de prova difícil, com a criminalização pretende-se que o próprio enriquecimento em si seja passível de análise independentemente dos factores que o originam, o mesmo que dizer que inverte-se o ónus da prova e a não são suficiência de comprovação de origem da riqueza se supõe como prova de culpa.
    O que está verdadeiramente em causa é saber que raio de justiça temos que precisa. nas praxes e no enriquecimento dito ilícito, de novas molduras porque os ilícitos necessários para incorrer no novo putativo crime ficam sempre por provar.
    As praxes pertencem à categoria de ritos iniciáticos que pressupõem quase sempre a transgressão (moral, social, legal) como forma de atestar uma cumplicidade acima da lei para com uma organização. Mais do que coesão de grupo, estas práticas permitem assegurar ascendente e integridade hierárquica que se sobrepõe a quaisquer deveres fora da própria organização (uma demonstração de impossibilidade prática de conjugar a pertença a estes grupos com o cumprimento honroso da lei e deveres é ter um Maçon na Presidência da República, primeiro jura obediência acima de tudo aos pedreiros e depois vai jurar devoção aos deveres constitucionais).

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