Xanax flambê
“Saia de casa, conviva com os outros, viaje, corra, pratique desportos de combate”. Qualquer pessoa que já tenha lido um daqueles textos levezinhos com dicas para lutar contra a ansiedade, o stress ou a depressão, sabe que estes são alguns dos ingredientes sempre presentes nessas receitas. Embora não tenha nada a apontar a estas actividades, sinto por vezes alguma dificuldade em conciliá-las e encaixá-las na agenda semanal: se vou viajar, não posso levar o saco de boxe para descarregar uns murros; se aceito o convite para uma festa, no dia seguinte estou de ressaca e não consigo ir dar uma corrida; se passo umas horas a aliviar as frustrações no ringue, fico sem energias para sair à noite e conviver; e assim sucessivamente, como dizia o João César Monteiro.
Estava eu sentado no sofá a reflectir sobre estes dilemas (em casa, longe dos amigos, parado e sem estar a bater em ninguém – ou seja, a chocar uma coisinha ruim), quando me chegam pela televisão as imagens da batalha campal de Hamburgo, enquadradas no âmbito da Cimeira do G20 realizada naquela cidade alemã. Fez-se luz: ali estava uma carreira profissional, a de activista ambiental, anti-guerra, anti-sistema, anti-globalização e anti-capitalismo, que, exercida com seriedade, pode salvar a minha saúde mental. Viajar por todo o mundo, seguindo os vários encontros do G20, do G7, da OMC, do FMI, da NATO, em harmonioso convívio com milhares de outros activistas, correndo desalmadamente à frente das forças policiais e praticando todo o tipo de artes marciais contra pessoas, viaturas, montras comerciais e mobiliário urbano diverso, é uma forma coordenada e coerente de aplicar de uma só vez toda a terapêutica recomendada. A coerência é, aliás, um dos principais atributos deste tipo de movimentos. Atravessam fronteiras físicas e virtuais para combater a globalização, espalham o caos e o terror para afrontar a guerra e deixam as cidades por onde passam literalmente a arder para tentarem contrariar o aquecimento global.
Em Hamburgo, e considerando as inclinações proteccionistas de Donald Trump, senti apenas falta de uma marcha contra o comércio livre liderada pelo Presidente norte-americano e acolitada por Black Blocs e pelo Boaventura de Sousa Santos. E gostava que tivessem feito ainda mais fogueiras. Para mim, que sinto sempre alguma dificuldade em acender a lareira lá de casa, é um consolo assistir a tão rápidas e eficazes tácticas de ignição.
O que há mais é fogueiras a arder
http://observador.pt/2017/07/27/zeinal-bava-o-dr-ricardo-nao-me-estava-a-dar-nada-que-nao-tinha-oferecido-a-outros/
Até alguém se queimar uns vão à missa e outros são condecorados.
Vocês gostam de cinema?
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óptimo comentário, bem “condimentado” !
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Finalmente um texto de agradável leitura.
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Morte e Vida Severina
de João Cabral de Mello Neto
«Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida: na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas e iguais também porque o sangue, que usamos tem pouca tinta. E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte Severina
que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte Severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida). Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina: a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima, a de tentar despertar terra sempre mais extinta, a de querer arrancar alguns roçado da cinza. Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias e melhor possam seguir a história de minha vida, passo a ser o Severino que em vossa presença emigra
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Entre estes e os liberalóides defensores do “comércio livre”, mas que assistem impávidos e serenos à injecção de milhares de milhões de dinheiros públicos em empresas que eram ex-libris desse mesmo tipo de comércio, não fazem um de jeito.
Toda a liberdade tem limites ou deixa de ser liberdade…
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“É proibido proibir !”
Liberdade com limites equivale por exemplo a vc. foder uma tipa boazona vendo-a no calendário.
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Não, liberdade sem limites é libertinagem, e a maioria das vezes viola a liberdade dos outros.
Tudo tem limites, foda incluída…
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Très chique, este artigo.
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Já não é a primeira vez que tentas escrever em francês e dás erros. Desiste, pá!
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Excelente, VCunha !
E JCésar Monteiro, sempre !
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Sim “excelente”, ou talvez “muito bom”.. mas não foi o VCunha a escrever…
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