Estimulação programática
A análise dos dados dos projectos aprovados pelo Portugal 2020 é muito interessante e curiosa. Não posso dizer que seja surpreendente, embora nalguns casos o humor me tenha apanhado desprevenido.
Não tenho vocação para caça às bruxas nem quero ser injusto, mas depois de uma breve leitura deste documento, partilho convosco exemplos dos fundos de incentivo alocados a projectos de investimento aprovados por este Programa.
Desde logo o Banco de Fomento tem 250M€ atribuídos. Duas empresas produtoras de pasta de papel conseguem 65M€ de apoios, a Embraer pode receber 34M€ e a Bosch 50M€. Só para hotéis vão mais de 100M€. Existe a “concessão de apoio à criação e ao alargamento de capacidades avançadas de desenvolvimento de produtos e serviços” a um fabricante de mobiliário para o seu projecto Cama Matriosca no valor de 17M€. Uma unidade industrial do sector metalomecânico tem incentivos equivalentes a 92.500€ por cada novo posto de trabalho que crie em Aveiro e Viana (25M€). Destaque também para os 79% de taxa de comparticipação do projecto submetido pelo Hard Rock Café no Porto (4M€); 24M€ para uma associação empresarial que para não entrar em insolvência além de ter tornado os seus credores bancários em accionistas, entregou activos ao Estado. Para terminar o rol de exemplos, digo-vos que 14M€ foram destinados a uma associação cujo maior projecto é organizar desfiles de moda.
Já todos ouvimos o sermão de empresários sobre a necessidade da baixa de impostos e da redução do déficit público. Mas alguém já ouviu esses mesmos empresários reivindicarem o fecho da Aicep, o fim das garantias subsidiadas, o termo aos bail-outs, o desaparecimento das medidas anti-dumping, o acabar com os “estímulos”, a cessação dos “apoios” ou a extinção dos “incentivos”? Pois…
Com tanto dinheiro a circular em programas deste género, será legítimo interrogarmo-nos se os lucros não serão determinados mais pela habilidade e capacidade de acesso a ajudas públicas do que por rasgos de empreendedorismo ou excelência da gestão.
É que não se pode querer que o Estado nos deixe em paz e, ao mesmo, ter apetite por favores especiais ou condições competitivas privilegiadas atribuídas pelo governo ou suas agências.
Estes benefícios não existiriam num verdadeiro mercado de livre concorrência. Antes são capturados por um número limitado de entidades distorcendo a economia e causando prejuízo a todas as outras empresas, aos contribuintes e aos consumidores em geral.
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Não será o lucro “incentivo” suficiente? Se os admito em casos excepcionais, para projectos de comprovado interesse nacional, no actual sistema parecem servir apenas para inclinar o campo onde se joga, em determinado sentido.
Muitos parabéns pela reflexão…
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Reghnar, tem razão. Um exemplo: Vale do Lobo. É só preciso haver
um “camarada” na CGD e a “massa” aparece sem controlo, sem estudo prévio
por entidade independente, e fica ela ao “Deus dará” . Depois a Tugalhagem
cleptónica trata de lhe dar destino: para os bolsos, claro.
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Parabens por esta denuncia.
Precisamos de mais e precisamos de explicar porque é que os subsidios são uma das maiores maleitas deste país (http://marques-mendes.blogspot.pt/2013/12/a-armadilha-dos-subsidios.html).
É por estas e por outras que os verdadeiros liberais em Portugal se contam pelos dedos de uma mão!
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Em relação a subsídios há duas escolas de pensamento:
– subsidiar projectos viáveis, que já deram garantias e têm lucros (e não precisam de subsídios),
– subsidiar projectos falidos para aguentarem mais um tempo (o que é um desperdício de subsídios).
As grandes empresas têm sido sempre privilegiadas, as Câmaras Municipais cedem terrenos, apressam licenças, constroem acessos. O Estado por seu lado isenta-as de quase todos os impostos e mesmo pagamentos à Segurança Social.
Já as PMEs e micro-empresas esperam anos por licenças, e mal começam a laborar levam com toda a fúria fiscalizadora do Estado.
Como já tenho dito, em Portugal há duas fases na vida de um empresário – na primeira tem que lamber o cú a todos, se sobreviver e se tornar grande todos lhe lambem o cú.
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Também fui dar uma espreitadela à lista, parecendo-me que:
• É louvável a decisão de publicar todos os subsídios concedidos pelo Estado – se não estou em erro foi o Cavaco que deu início a esta boa prática;
• Parece-me errado que apareça o Estado Central a abichar tantas e tão elevadas verbas destes programas, desviando fundos, que deveriam servir para estimular a economia, para fins que, a serem co-financiados pelo Estado, deveriam ser suportados pelos nossos impostos;
• Presumo que a lista está cheia de erros, uma vez que regista dezenas de subsídios de valor inferior a 1.000 euros, dez abaixo de 500 euros e um com um subsídio de apenas 0,01 euros;
• Presumo ainda, mas posso estar errado, que a apresentação de candidaturas a estes fundos é um negócio-da-china, de que estarão a beneficiar uns quantos chicos-espertos.
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Esse tipo de empresário que não prescinde de subsídios, são um dos males da sociedade e um insulto ao capitalismo. Mas, por outro lado, têm a atenuante de o estado ainda estar tão presente, intrometido, na economia.
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