Missão 100% Português
Por mero acaso, durante o intervalo do noticiário, vi uma promoção da RTP a um seu programa dedicado a incentivar o consumo de produtos “100% portugueses”.
Investiguei um pouco e cedo percebi que a respectiva empresa produtora é uma afiliada ibérica do grupo internacional EndemolShine, curiosamente com sede na Holanda. A sucursal em Portugal, aparentemente, nem sequer teve papel de relevo no desenho deste produto televisivo.
Em coerência com o propósito deste programa, felizmente os patrocinadores da série são tradicionalíssimas empresas lusas como a Europcar e o Jumbo (Grupo Auchan). Outras portuguesíssimas marcas se associam à empreitada e apresentam-se orgulhosamente na língua de Camões: Vitrine-All About You; Ideia Hub-Empowering People; Reboques Amadora – Bus & Truck Service; Giovanni Gali; More Results; Seaside.
Só isto bastaria para demonstrar ao limite do risível o logro e a fantochada pegada que é este programa.
Num olhar mais substantivo dou-me conta de que há, no entanto, uma tentativa de doutrinação sobre o tema. Tristemente nenhuma das 40 pessoas que constam da ficha técnica se apercebe da confrangedora iliteracia económica que exibem.
Vejam bem que na apresentação de estreia uma voz-off interpela-nos da seguinte forma: “será que realmente precisamos de consumir produtos importados; ou podemos apostar no consumo nacional, ter um papel activo e ajudar a economia portuguesa?” (sic)
A mesma locutora informa que “vai desafiar um português para a mais importante missão: durante 6 meses esse português só poderá consumir produtos nacionais, porque practicamente tudo o que actualmente consome e utiliza é importado.” (sic). É este o crime do homem e esta a sua penitência!
Calma, há mais: uma das convidadas da primeira emissão foi Filomena Cautela que diz ser “parva” (sic) “porque poderia ter em casa só produtos nacionais e afinal não tem” (sic).
O “Missão 100% Português” tem uma produção tão esmerada que dispõe de “equipa de auditores” (sic) para inspecionar casas e pessoas com o intuito de “determinar a sua percentagem de portugalidade” (sic). Tem até um especialista em consumo que “ensina como comprar português” (sic).
Pensava eu que isto seria considerado algo perigosamente fascista, típico de regimes e sociedades retrógradas e anti-democráticas, mas parece que agora é progressista e moderno, sobretudo se fôr emitido como serviço público da RTP.
Esta narrativa tem sempre subjacente a ideia de que as exportações são virtuosas e as importações um dano ou um mal menor. É discurso recorrente e traz consigo um misto de demagogia e falta de conhecimento.
Slogans como “compre o que é nosso” ou “Portugal sou eu”, além de pura parolice, não passam de sofismas. Os produtos “nacionais” já não existem. Tudo é feito no mundo. A fragmentação geográfica das cadeias de produção e o comércio internacional tornaram sem sentido maniqueísmos do “nosso” versus “deles”. A fabricação de um produto final ocorre muitas vezes em vários países e implica a compra de componentes de múltiplas proveniências.
A ladainha do substituir as importações por produção nacional é vomitiva. Apelos ao patriotismo das preferências por produtos nacionais em vez de escolhas por produtos mais baratos ou melhores, independentemente da sua origem, é uma irracionalidade económica. O proteccionismo é discriminatório e privilegia alguns interesses com prejuízo do cidadão comum e da sociedade como um todo. É injusto, empobrece-nos, reduz o emprego e limita a liberdade individual.
As importações resultam da livre escolha e opções autónomas dos consumidores. Estes têm todo o direito a não pagar um preço mais elevado para usufruírem de produtos que valorizam e lhes traz bem-estar.
As importações são tão benéficas quanto as exportações.
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Colbert ainda é vivo?
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Caro Telmo,
Imagine quem enverga fato italiano, camisa francesa, sapato inglês, relógio japonês, tablet chinês, e que, durante um almoço onde se come picanha argentina e feijão preto brasileiro, lamente a falta de empregos e de empresas que existem em Portugal.
Na minha família a caridade começa em casa.
Desde que não me OBRIGUEM a consumir nacional através de imposições legais — e imorais — ou de tarifas alfandegárias, acho muito bem que os consumidores comecem a levantar a pestana. Eu já levantei há muito: só encomendo de fora aquilo que não consigo obter em Portugal ou o que o papel de portugueses seja apenas de mediação comercial com o consequente encarecimento — apenas canais de distribuição, portanto.
Quem compra paga horas de trabalho dos outros. Prefiro que, voluntariamente, as horas pagas sejam de perto de mim. Quanto de mais perto forem, mais depressa me comprarão horas de trabalho a mim.
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Isso.
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Uma patetice destinada a cerebelos de adolescentes e de adultos parvos.
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Imagine ingleses americanos e até italianos a comprarem sapatos tugueses…..deviam ser proibidos e procurarem sapatos de cada país…senão proibidos pelo menos procurarem e só comprarem em última instância. Outro exemplo é o da pêra rocha…..com tanta pêra na Alemanha, os estupidos são senão o maior compradorde pêra rocha tuguesa. Não o deviam fazer para bem da saúde dos saloios tugas . A mesma coisa deviam os ingleses fazer com o vinho do Porto já que os ingleses tem os melhores “licores” do mundo……porquê importar a porcaria de um vinho com aguardente ( ainda por cima francesa) apesar de terem sido ingleses a o inventar, mas produzido na tugolândia? Até diria mais……aqueles gajos da AutoEuropa nunca deviam ter vindo para cá já que fabricar carros é mesmo com os alemães e os alemães só deviam comprar carros fabricados lá…… e por aí fora até comermos broa de milho importado
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Tiradentes,
O alemão trata melhor dos alemães do que o português dos portugueses.
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Discurso muito actual, tendo em conta a doutrina Trump. Só que ele é um malandro e os de cá … uns patriotas.
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importa-se 80% dos alimentis
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fantochada pegada é este texto.
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