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As taxas que não são moderadoras mas que se têm de chamar assim*

27 Fevereiro, 2009

12, 43 euros foi quanto pagámos no meu agregado familiar por uma operação de urgência, em Santa Maria, a uma apendicite. Além da operação propriamente dita, foram ainda dois dias de internamento com tudo o que tal implica de alimentação e cuidados de saúde. Os 12, 43 euros também pagaram as consultas de pós-operatório. 12, 43 euros é menos do que um carregamento de telemóvel. E claro que há uma lista imensa de pessoas que nem os 12, 43 euros pagam por estarem isentas.
Dirão o PSD, o CDS e alguns deputados do PS que ninguém modera o acesso a uma cirurgia de urgência como era o caso desta. Pois não mas isso não quer dizer que não se deva pagar nada. Faria aliás muito mais sentido que o CDS e o PSD, em vez de proporem a extinção das taxas moderadoras para as cirurgias e de embarcarem na cantilena do totalmente gratuito com o PCP e o BE, apresentassem propostas mais realistas e ousassem dizer que temos de nos deixar dos artifícios de linguagem que têm mantido intocável uma das mais profundas crenças do nosso legislador: a do gratuito.
Para o legislador português, algures do outro lado do mundo ou quiçá numa extremidade do arco-íris, existe uma fábrica de dinheiro que envia o dito sob a forma de moedas de ouro para Portugal. Uma vez aqui chegadas, as bolsinhas das moedas são depositadas ao cuidado do legislador que assim provido de tais fundos legisla sempre garantindo o gratuito. De cada vez que promete algo gratuito o legislador olha-se ao espelho e sente-se uma boa pessoa. Assim temos o ensino gratuito, em que por sinal cada aluno custa em média 5 mil euros por ano, e assistimos presentemente a uma discussão bizantina sobre as taxas moderadoras na saúde.
Nesta matéria o legislador brincou aos aprendizes de feiticeiro e se hoje já quase ninguém recorda que há pouco mais de trinta anos em Portugal se defendia o fim da medicina privada sobra-nos ainda o dogma do serviço nacional de saúde gratuito inscrito na Constituição. Como até agora os contribuintes foram as únicas almas que se apresentaram para pagar tudo o que o legislador diz ser gratuito conviria um bocadinho menos de demagogia. De caminho seria também muito útil que os diversos serviços públicos que, como as escolas e os hospitais, prestam serviços oficialmente gratuitos informassem os utilizadores do seu custo real. Por exemplo quanto custou realmente aquela operação ao apêndice em Santa Maria?
É claro que tanta transparência agrada pouco. É mais tranquilo fazermos todos de conta que os duendes nos pagam o SNS e que, como somos um povo tolinho, tipo criancinhas que não páram de comer gomas, quem nos governa tem de criar umas taxas pedagógicas para nos moderar nas idas aos hospitais.

*PÚBLICO 26 de Fevereiro

24 comentários leave one →
  1. Anónimo permalink
    27 Fevereiro, 2009 15:36

    Um Serviço nacional de saúde é um sinal de civilização, o resto são fantasias liberais.

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  2. Anónimo permalink
    27 Fevereiro, 2009 15:36

    Um Serviço nacional de saúde é um sinal de civilização, o resto são fantasias “liberais”.

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  3. 27 Fevereiro, 2009 15:44

    Alguma razão. Outras, sem razão.

    O SNS é “tendecialmente gratuito”, como se diz na Constituição. Logo aqui, estamos perante uma conversa de chacha, pois o que é “tendencialmente”? É caso para dizer, “não é homem, nem é mulher”, então o que é?

    O “tendencialmente gratuito” é um arranjinho entre os “avanços” de Abril e a realidade.

    Ou é gratuito. Ou é pago, conforme os rendimentos.

    Outra questão, Helena, não se esqueça que quase todos os portugueses já pagaram os serviços de saúde, quando vão a um Centro de Saúde ou a um Hospital. Pois, se for ao Orçamento da Saúde, verifica que mais de 95% das receitas daquelas Instituições, vem do Orçamento de Estado.

    No Serviço do Prof. Manuel Antunes, em Coimbra, está lá qualquer coisa do género: “cada doente que é aqui objecto de cirurgia custa ao Hospital cerca de 10.000 euros”. Para quê? Para que os doentes e familiares saibam qual é o custo real da “coisa”.

    Mas, esta questão da saúde é muito abrangente e difusa (por exemplo, valerá a pena ter um doente durante 12 meses, que está a padecer de uma doença crónica, e que custa a “alguém” cerca de 150.000 euros/ ano, ou investir esses 150.000 euros em prevenção na cárie ou com gfins oftalmológicos?).

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  4. lucklucky permalink
    27 Fevereiro, 2009 15:57

    “Um Serviço nacional de saúde é um sinal de civilização, o resto são fantasias liberais.”

    Vejo que favorável á exploração dos trabalhadores pelos não trabalhadores…

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  5. Anónimo permalink
    27 Fevereiro, 2009 16:01

    Factura da água deste mês = Água + Tarifa de Disponibilidade + Tarifa de Utilização de Águas Residuais + TRSU Fixo + TRSU Variável + TRH Água + TRH UT.AG.RE + TRH Retroactivo + TRH UT.AG.RE + IVA.

    Um destas é a taxa substituta do custo do contador que o Governo da República anulou.
    Informa a Indáqua coelhónica que há que pagar com retroactivos uma taxa de perdas pelo caminho.
    Queremos nós discutir a saúde.

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  6. 27 Fevereiro, 2009 16:14

    “12, 43 euros foi quanto pagámos (…)”

    E, antes, nunca descontaram para a Segurança Social?
    Nunca pagaram impostos?

    Francamente…

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  7. jupiter permalink
    27 Fevereiro, 2009 16:23

    O SNS continuará a ser a vaca sagrada durante mais algum tempo. Quem não está por dentro pensa que a degradação dos serviços é uma quimera, infelizmente é uma realidade pungente.
    Se eu for reparar o meu carro e no dia seguinte ele funcionar ainda pior reclamo e terão que me dar uma satisfação. Com a doença a coisa fia mais fino, ainda bem que o tuga não se apercebe dos erros frequentes cometidos durante os internamentos e do facto de na maior parte das vezes ser melhor tomar o cházinho do que esperar na fila do centro de saúde onde os enfermeiros fazem 90% dos actos tão bem ou melhor, sempre mais barato do que os clinicos gerais como se passa em muitos países sub desenvolvidos. O SNS na tugolândia é uma utopia que dá de comer a muita gente. Se quizerem realmente saber como funciona relativamente a países europeus perguntem aos nossos concidadãos na holanda, frança, alemanha. Eles explicam.

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  8. fernando permalink
    27 Fevereiro, 2009 16:25

    Ó minha senhora, ao menos correu bem? Trataram bem a pessoa em causa? Pior que isso é pagar e ser mal servido, como me aconteceu a mim… Assim tipo 2 anestesias gerais em menos de 72 horas.

    Confesso, também, que achei o hospital mais “vazio”, sem aquela chusma de gente que vai lá por tudo e por nada, ocupando os médicos e restante pessoal por causa de quase nada. Alguns em busca de companhia…

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  9. lucklucky permalink
    27 Fevereiro, 2009 16:30

    muito bem Da-se

    A Helena comete o erro de todos os jornalistas: quando há alguma coisa fornecida pelo Estado aparece sempre nos jornais: Grátis ou gratuita. Devia ser substítuida por “pago pelos contribuintes” uma vez que recursos foram tirados á economia para fornecer esse serviço.

    Aliás é aí que este artigo falha: O aumento de taxas pode bem ser aumentos de impostos encobertos. Uma vez que é tudo arbitrário.

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  10. ordralfabetix permalink
    27 Fevereiro, 2009 16:41

    “Por exemplo quanto custou realmente aquela operação ao apêndice em Santa Maria?”

    Estou totalmente de acordo e já defendo isso há muitos anos. Tal como na farmácia em que sabemos qual é a comparticipação do Estado, também deveríamos levar para casa a conta discriminada do Hospital. Para percebermos que uma simples ida a a um SU, com observação por mais de uma especialidade, umas análises e um Rx custa umas centenas de euros.

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  11. ordralfabetix permalink
    27 Fevereiro, 2009 16:45

    “E, antes, nunca descontaram para a Segurança Social?
    Nunca pagaram impostos?

    Francamente…”

    A despesa em descontos para a ADSE p.e é cerca de 1% do orenado. Uma cirurgia como essa não terá custado menos de 4.000€.

    Quantos anos de descontos de um português médio são precisos para pagar essa despesa?

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  12. Daniel permalink
    27 Fevereiro, 2009 17:00

    Gosto muito quando os moralistas liberais se escudam “no que já descontaram e descontam nos impostos” da mesma forma que usam como salvaguarda o “Estado de Direito” e outros chavões do género.

    É indicativo da falta de solidariedade para com o concidadão, e, acima de tudo, um atestado de ingenuidade face à realidade em que vivemos. Se todos pagassem os seus impostos (e estes a quem me dirijo, são sempre os mais esquivos)haveria espaço de manobra mais do que suficiente para não se recorrer a estas taxas moderadoras, propinas, entre outros “impostos encobertos”. Como não é assim que Portugal funciona, não me choca que as pessoas paguem por este serviço um preço simbólico, adequado e escalonado, desde que se faça à luz de critérios eficazes e publicamente discutidos.

    Muito mais dinheiro seria preciso para aumentar a qualidade e a universalidade do SNS, e a estas pessoas só lhes interessa a mesquinhez de quanto deste bolo é amortizado por preços como 12,43. Pessoas que seguramente têm no bolso um seguro privado que lhes leva, por mês, o triplo, ou mais, do que o valor que estão a discutir. E que, de certeza, não têm um familiar a precisar de cuidados paliativos, como foi aflorado pelo J.

    Quando não estamos atentos aos outros, chega-se a proposições descabidas, como saber o preço destes tratamentos, desviar esses fundos para “prevenção” e, consequência lógica: o melhor é matar já o empecilho, que para além de não trabalhar, ainda nos rouba a todos, os 10 milhões de honestos e fiáveis contribuintes.

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  13. Amonino permalink
    27 Fevereiro, 2009 17:13

    .
    Estado Social já foi um Sistema. Hoje são Direitos Sociais: Educação, Saúde, Reforma, Maternidade e Subsidio de Desemprego são Direitos Sociais intocáveis. Não circunstancialismos constitucionais ou partidários. Razões absolutas de Cidadania e Estado.
    .
    O Serviço Nacional de Saúde é pago por cada e por todos os Cidadãos. Taxa moderadora é mais um novo Imposto para ‘pagar’ aquilo que já está pago pelos outros Impostos pagos.
    .
    A Educação não é universalmente gratuita. Aparentemente é. Mas não é. A propina é mais um novo imposto para ‘pagar’ o que já está pago pelos outros Impostos pagos.
    .
    Porém gratuita para uns Portugueses mas paga a dobrar por outros. Quem tem um filho numa Escola não publica, contribui com os seus Impostos para os tais 5.000€/ano dos filhos dos outros e paga mais 5.000€ pela Educação do seu filho !!
    .
    E há muita gente menos rica com Filhos que abdica de muito para ter o filho na Privada e gente muito rica que não abdica de nada e põe os filhos na Publica. O resto é demagogia eleitoraleira sem qualquer interesse político ou nacional, tretas.
    .
    A ideologia política subjacente não é o Estado para Cidadão, pessoas, mas para coisas, Estruturas. Descriminação dos Portugueses ao sabor de fantasias e modas do momento.
    .
    Gasta o dinheiro dos Cidadãos para financiar Coisas (Escolas ou Hospitais). “Cimento, Maquinetas, Despesas&Cª Lda”. Em prejuízo de pagar só o PREÇO DE CADA SERVIÇO à respectiva Estrutura Publica ou Privada beneficiando o País com a redução da Despesa Publica, aumento de produtividade e eliminação de abusos que automaticamente acarretaria.
    .
    É este o erro direccional que nada tem a ver com Socialismo, Social Democracia, Liberalismo, Trotquismo, Comunismo, Conservadorismo etc.´Só com os Direitos Sociais Individuais e Universais para todo e qualquer Cidadão do Estado Português. E aparentemente é. Mas não é.
    .

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  14. 27 Fevereiro, 2009 17:15

    Muito bem.
    A Senhora Drª acerta sempre em cheio (menos na questão das bicicletas, mas não se pode ter tudo)

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  15. Fernando de Oliveira permalink
    27 Fevereiro, 2009 17:26

    Parece que o lógico seria como nas A.E. ter o princípio do “utilizador/pagador”! Mas é certo que em geral, estes serviços, como educação, vias de transporte, etc,deverão ser assegurados pelo Estado. Eu pessoalmente, vejo com bons olhos que se podia perfeitamente pedir ao cidadão que participasse de acordo com as suas possas (idem propinas, etc.) Mas então devia haver um recálculo dos impostos que tenderiam a diminuir! E a mentalidadezinha do povo que se habituou já a ter como certo que tudo lhe é devido pelo Estado? E como garantir que as declarações de rendimento estão correctas? etc. etc. Parece difícil criar um sistema equilibrado em que todos participem de acordo com as necessidades ou proveitos.

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  16. permalink
    27 Fevereiro, 2009 17:50

    Peraí! Então tiveram de ir ao Serviço Nacional de Saúde como os outros pindéricos?
    Então o privado não é a panaceia? Porque não o Hospital da Luz? Não operam de urgência?

    E o pior é que os liberais já nem têm a noção do ridículo.

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  17. Amonino permalink
    27 Fevereiro, 2009 18:21

    #15,
    O principio “utilizador-pagador” faria algum sentido se estivesse já em vigor o IMPOSTO UNICO NACIONAL incidindo apenas sobre o Consumo, eliminando todos os outros Impostos. Mesmo assim discutivel: para que servem os Impostos ? Quais as prioridades para gastar o dinheiro publico ? Que despesas estão vedadas para o gastar ? etc
    .
    Não sendo esta a verdade, o tal principio “utilizador-pagador” logicamente debaixo do robe das “Des/Igualdades sociais” não passa doutra “chico-espertice” para tentar criar “pela porta do cvalo” novos e mais Impostos. Repare-se seriam novos e mais Impostos para todos directa ou indirectamente. Mas todos os acabariam por os pagar, os “socialmente Desiguais e os socialmente Iguais”. Não faz, nem tem, qualquer sentido na realidade actual.
    .

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  18. 27 Fevereiro, 2009 18:25

    Pois, pois… e então para que são os pesados impostos que pagamos?! Ah… já sei:- são para suprir (aos milhares de milhões) as “manigâncias” da Banca e seus agentes, infiltrados nos diversos governos desta “jovem, maravilhosa, explêndida e exemplar democracia” de quase 35 aninhos…
    Pois, pois… e, também, a muito jornaleiro contratado para garatujarem umas lérias para este “tolinho pagode” soletrar… pudera!

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  19. 27 Fevereiro, 2009 20:44

    Zé (#16):
    Tirou-me as palavras do teclado! Maior treta que os “liberais” da praça, isso não há.

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  20. Ricardo permalink
    27 Fevereiro, 2009 23:31

    Se faz tanto gosto em pagar, pode ir ao privado.

    E já agora, não há nenhum liberal que me explique o que acontece num mundo sem SNS a quem não pode pagar o seu tratamento? Eu não me importo de pagar mais para evitar esse tipo de dúvidas…

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  21. joão costa permalink
    28 Fevereiro, 2009 01:29

    olhe meu caro se gosta de pagar venha ate aqui , ao brasil , q se nao tiver dinheiro morre a porta do serviço de suade
    ora merda tão mal dizem do serviço de saude em portugal, e o q da ideia e q nao conhecem outra coisa ou outro pais onde pagem menos de 13 euros por uma operação
    tentem ir fazer isso num pais com medicina privada,
    joão costa
    e-mail
    jjrcosta@gmail.com

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  22. Anonimo permalink
    28 Fevereiro, 2009 10:46

    .
    O excelente SNS Canadiano, também totalmente gratuíto:

    http://www.thiscantbehappening.net/?q=node/276
    .

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  23. anti-liberal permalink
    1 Março, 2009 03:28

    Como em todas as coisas, Portugal precisa urgentemente de gente capaz para organizar e gerir os serviços de que tanto carece.
    Mão podemos deixar que se brinque com a nossa saúde – que, depois da alma, é o nosso bem mais precioso.
    A verdade é que quem não tem capacidade para se proteger com um seguro de saúde – que é caríssimo – está sujeito a condições de tratamento muito deficientes e mesmo à impossibilidade de obter alguns em tempo oportuno.

    Nuno

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