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o grupo de trabalho (para o património) imaterial

6 Março, 2011
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Qualquer semelhança entre esta notícia e o texto de Vasco Pulido Valente «Uma Casa Portuguesa», com vinte anos de idade e já aqui reproduzido, não é mera coincidência. Vejamos o que se passou. O Grupo de Trabalho para o Património Imaterial foi constituído há cerca de um ano, no âmbito dessa inutilidade que dá pelo nome de Ministério da Cultura (outro ministério a extinguir com urgência). Já em altura de grave crise e de sucessivos sacrifícios impostos aos portugueses, custou ao estado 209 mil euros e, ao longo de quase 400 dias, reuniu somente uma vez. Por outras palavras: não fez literalmente nada e não serviu literalmente para coisa nenhuma, senão para gastar o dinheiro dos contribuintes portugueses com meia-dúzia de pessoas. O famigerado Grupo tinha por «missão» fazer o «levantamento sistemático e tendencialmente exaustivo do património cultural imaterial português». Repare-se no preciosismo do «tendencialmente exaustivo», não fossem os ilustres membros do não menos ilustre Grupo de Trabalho morrer de cansaço, em vez de morrerem de tédio, como acabou por suceder. Todavia, o que mais custa neste tipo de notícias nem é propriamente o seu conteúdo. É saber que nem assim os portugueses entendem por que não funciona o estado social. É não terem percebido ainda que entre o momento em que o estado nos vai aos bolsos e a famosa «redistribuição de rendimentos» para «ajudar» os mais pobrezinhos e tomar medidas para «estimular» a economia, vai um mar sem fim de desperdício, despesismo e irracionalidade, para não lhe chamarmos outra coisa. E também custa verificar que continuam sem compreender que a coisa não depende de governantes mais ou menos honestos, ou mais ou menos competentes, dos quais estão, de resto, eternamente à espera. Se lessem o artigo acima citado de VPV e conhecessem um pouco da história do seu país, não viveriam nessa amarga ilusão.

33 comentários leave one →
  1. 6 Março, 2011 14:01

    “a coisa não depende de governantes mais ou menos honestos, ou mais ou menos competentes”?
    Olhe, do que com certeza não depende é de governantes comprovadamente honestos e competentes.
    A mim parece-me que se deve exactamente a governantes desonestos e incompetentes, i.e, corruptos, como os que temos.

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  2. rui a. permalink*
    6 Março, 2011 14:05

    «como os que temos» há vinte anos? Leia lá, outra vez, se faz o favor, o texto do VPV. Acha que ele inventou aquilo do nada? De facto, o paradigma do «perfeito governante» é uma coisa com consequências extraordinárias. Se ler os primeiros capítulos do «Conjecturas e Refutações», o Popper explica porquê.

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  3. 6 Março, 2011 14:11

    Meu caro, li tudo isso e presumo que antes de V.

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  4. 6 Março, 2011 14:15

    O Estado social não funciona por causa das elites e de muitos dos militantes e simpatizantes dos partidos políticos do “arco governativo” que ocupam muitos institutos, comissões, grupos de trabalho duvidosos, e até escritórios e empresas aos quais são pedidos ilustres pareceres, pagos a peso de ouro com o dinheiro dos contribuíntes.

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  5. 6 Março, 2011 14:17

    Que ilusão. É da natureza de qualquer estado, independentemente da qualidade dos governantes, ceder a grupos de pressão, sempre em nome de bons princípios.

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  6. Francisco Colaço permalink
    6 Março, 2011 14:18

    O «arco governativo» é matafórico: a governação é o violino com que nos dão música. O arco realiza a vibração das cordas que acalmam a besta enquanto se lhe esfola a pele.

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  7. Francisco Colaço permalink
    6 Março, 2011 14:18

    A palavra «matafórico» pode ser gralha ou não.

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  8. 6 Março, 2011 15:10

    menos mal que durante milénios não houve ministérios da cultura . se tivesse havido , duvido tivessemos tanta Arte de qualidade para disfrutar.

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  9. rui a. permalink*
    6 Março, 2011 15:41

    « li tudo isso e presumo que antes de V.»
    É capaz de presumir mal, mas, também, é assunto secundário. Deixo-lhe, então, como sugestões de leitura, caso V. se não tenha já antecipado, a generalidade dos trabalhos da Public Choice, sobretudo dos seus fundadores, o James Buchanan e o Gordon Tullock, muito úteis para compreender o funcionamento e a racionalidade do estado. Em Portugal encontra bons trabalhos de divulgação desta Escola da autoria do André Azevedo Alves.
    Cumps.

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  10. tina permalink
    6 Março, 2011 15:50

    É extraordinária a imoralidade que mina os governantes apontados pelo PS.

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  11. rui a. permalink*
    6 Março, 2011 15:54

    «É extraordinária a imoralidade que mina os governantes apontados pelo PS.»
    Com os do PSD não tem sido diferente e com os do CDS, das poucas vezes que lá têm passado, também não. Com os do PCP não sabemos, porque desde o Vasco Gonçalves nunca mais foram para o governo, mas segundo o Bgão Félix deve ser melhor, porque é gente séria e muito cumpridora. Agora a sério, Tina: «A ocasião faz o ladrão». Não se esqueça disso.

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  12. CARLOS permalink
    6 Março, 2011 16:32

    viva o xuxialismo. Aguqntem-se pq o socas não vai largar o poder tão cedo e para o manter ele vai continuar a aumentar impostos, a alimentar a sua clientela, a distribuir prendas e fazer a propaganda do sucesso xuxa diáriamente. Ele sente que quase metade do eleitorado tuga acredita nele e tem razão……só assim se percebe que as ultimas sondagens está acima dos 30%, um tipo que levou o país à bancarrota.

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  13. tina permalink
    6 Março, 2011 16:37

    “A ocasião faz o ladrão”.
    .
    De maneira nenhuma. Nunca houve maior exibição de corrupção e imoralidade como no actual governo PS. Basta começar com os escandâlos em que o próprio Sócrates esteve envolvido, para perceber que o exemplo vem de cima. Tal como as empresas têm a sua própria cultura, a cultura do PS é esta, compadrio, corrupção, imoralidade e incompetência.

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  14. lucklucky permalink
    6 Março, 2011 17:02

    “A mim parece-me que se deve exactamente a governantes desonestos e incompetentes, i.e, corruptos, como os que temos.”
    .
    Os Governantes não são de geração espontânea, os Governantes são o espelho do povo Português.
    O Soci@lismo é corrupto por natureza, junte-se a isto a cultura paternalista portuguesa e tem a receita para o estado das coisas.
    Se quer menos corrupção tem de haver menos poder – leia-se para começar dinheiro- nas mãos do Estado e mais competição em tudo.

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  15. 6 Março, 2011 17:13

    Obrigado pelas dicas, caro Rui.
    Há sempre coisas que ainda não li, apesar da minha provecta idade…
    Cumps também.

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  16. 6 Março, 2011 17:19

    O minstério da cultura é, sempre foi, um dos mais permeáveis a lobbys e simultâneamente um dos mais laxistas na supervisão dos destinos do dinheiro público por si aplicado.
    Não se insurge contra as fracas produtividades subsidiadas, nalguns casos voltando a apoiar os seus inócuos protegidos (amigos, amigos dos amigos, e compinchas partidários; muito raramente está atento aos criadores desafectos aos corredores do ministério e das delegações regionais; valoriza a ‘moda’ estética e discursiva, e não a verdadeira criatividade; despreocup-se com os patrimónios não-mediáticos; distribui indiscriminadamente apoios em anos eleitorais; não possui um projecto global para o país; etc, etc.
    O caso (grave) hoje noticiado no Público é, um entre muitos outros casos (graves) de incompetência e de irresponsabilidade de quem circula pelos gabinetes na Ajuda. “Normal”, portanto.
    Nada a fazer: o ADN tuga no seu esplendor…
    (Desde, e antes de MMaria Carrilho, é um ministério não reestruturado, descoordenado e obediente ao PM e ao partido-do-PM, seja social-democrata ou “socialista”).

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  17. 6 Março, 2011 17:27

    Quando temos um PM que “acha bem” que “o mais adequado” para tutelar o ministério da cultura seja uma mulher…
    Quando tivémos um indigente ministro cujo nome foi confundido com outro, este sim, inicialmente “pensado” e que provavelmente seria um óptimo ministro…

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  18. 6 Março, 2011 17:45

    Olhando para trás, ainda que possamos – e devamos – distinguir governos e governantes (sou daqueles que acha que “eles” não são todos iguais), é factualmente indisputável que todos os governos (mesmo recuando a Salazar e especialmente a Caetano) contribuiram para uma escalada do peso do Estado na sociedade portuguesa na satisfação, incessante, de cada vez mais “direitos” a cada vez mais beneficiários. E mesmo quando o programa das privatizações se iniciou e desenvolveu, tudo se fez para que o Estado continuasse a influenciar a gestão dessas empresas na pretensa defesa da manutenção de centros de “decisão nacional”. E ai de quem se atreva a tentar perseguir actividade empresarial com escala sem prestar “vassalagem” aos governantes de ocasião pois sabem, como refere António Barreto, que um decreto-lei pode ser vital…
    .
    Quando ontem no Expresso li 12 justificações de jovens e já não tão jovem adultos para participarem na próxima manifestação de 12 de Março, fiquei ainda mais desanimado pois renovei a convicção de que ainda não batemos no fundo pois permanecem as ilusões de que a solução dos seus problemas – os da “geração *a rasca” – passa pelo Estado, por mais Estado. Como sou dos que defendem que a solução é exactamente a inversa, creio que a dor proveniente da verdade, da inevitabilidade das coisas será, muito provavelmente, lancinante.

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  19. lucklucky permalink
    6 Março, 2011 17:46

    Fica provado- mais uma vez- como seria fácil- os portugueses a trabalharem só 4 dias por semana. Com tão baixa produtividade talvez até três dias bastassem.
    É só estes parasitas irem para as empresas trabalharem – essas produzem coisas com valor – e quem lá está ter um dia de folga.
    Ou preferem ganhar mais para que o 5 dia de trabalho se vá em impostos para parasitas?

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  20. 6 Março, 2011 18:06

    Nota:
    Não há um único país (e se há, desconheço) que não tenha um ministério da cultura accionado com dinheiros públicos. Bem ou mal administrados, eis a questão.
    A cultura, o património dum país tem de ser inevitavelmente zelado, protegido e divulgado pelo Estado. As elevadas verbas públicas para tal podem ser, ao longo do tempo, reduzidas, se esse ministério (e o das finanças) sensibilizarem a “iniciativa particular” para o mecenato. O que já aconteceu em Portugal. Mas, a incultura (e uma certa falta de patriotismo…) de muitos potenciais mecenas, a desmotivação duns quantos não só face às relativas deduções fiscais mas também à ‘fraca’ visibilidade dos seus nomes ou empresas e, sobretudo o desleixo do ministério da cultura para re-activar esses apoios ou conquistar mais A e B, tem “deixado cair” essa possível ligação do empreendedorismo particular à cultura e ao património.
    São raros, neste país, os casos de sucesso e de contínuo interesse do mecenato. A Fundação de Serralves é um bom exemplo.

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  21. Arlindo da Costa permalink
    6 Março, 2011 20:00

    Há muito tempo que eu digo, este «Estado Social» só tem feito bem a uma determinada «elite» de funcionalismo público, empresários subsidiados, gestores públicos, bancários e construtores civis.
    É um sucialismo topo de gama.
    Bem faria Sócrates em acabar com este cagaçal e pôr toda essa malandragem fina que cupa no Estado Social a trabalhar e se alguns se ascham muito bons que vão para fora daqui ou para o raio que os parta!
    Socialismo sim, mas para quem precisa e trabalha!

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  22. BST permalink
    6 Março, 2011 20:47

    Um ano? E com uma reunião? 209 000 euros? Acho pouco, ainda assim.

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  23. 6 Março, 2011 21:06

    aqui no tasco onde moro , cidadezinha provincia pequena , há 9 museus , 3 de sempre , o resto inventado para dar ” charme” : todos a gastarem recursos ( pessoal . luz , manutençao e patati patata ) , para estarem às moscas. fui ver quantos havia em santiago de compostela , cidade que recebe milhares de turistas. pois lá há 13…

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  24. 6 Março, 2011 22:16

    O nosso Estado não é muito diferente dos Estados dos outros países. O problema é que o nosso país é demasiado pobre para o Estado que temos. Se fossemos mais ricos não havia problema nenhum. Agora conseguir empobrecer o Estado é que me parece que vai ser muito difícil.

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  25. 6 Março, 2011 22:55

    Continua a mistura de alhos com bugalhos. Qualquer problema no estado serve para atacar o estado social e o apoio aos mais pobres. É como se alguém usasse qualquer comportamento menos próprio de um empresário para atacar toda a iniciativa privada. Com este nível de argumentação não admira que o país esteja onde está.

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  26. 6 Março, 2011 23:32

    Lá na Suécia , país modelo do estado social , parece que há também caça às bruxas. deviam falar com pessoas que vivem lá , assim saberiam que andam a vigiar e a cortar em tudo o que é subsidio a malta que não contribui e dolosamente se aproveita .. e que os suecos estão fartos de emigras. anedota popular é esta : há um incendio , de dia , num prédio , morrem todos que lá vivem ( famílias inteiras de negros , árabes e mais não sei quem do politicamente correcto ) , menos uns brancos. é para lá um regabofe , a associação xpto de negros , a dos árabes , e a da do não sei quantos : morreram todos menos os brancos!!! racismo !!. pois as autoridades tiveram que fazer um desenho : os brancos não morreram porque àquela hora estavam no trabalho..

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  27. 7 Março, 2011 00:15

    Carlos, a iniciativa privada e o estado não podem ser analisados da mesma forma. Num caso temos uma entidade que se arroga o direito de controlar as nossas vidas, usando o monopólio da força. No outro caso temos indivíduos ou empresas que assentam a sua actuação nas trocas voluntárias. Posso criticar de muitas formas inúmeros indivíduos ou empresas, mas essa critica tem de ser de natureza muito diferente das críticas que faça ao estado. Alhos e bugalhos. Depois, é evidente que o estado social está ligado à questão levantada, que não foi sequer a da cultura subsidiada. O problema é mais genérico: o estado, pela sua natureza, responde apenas incentivos perversos.

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  28. Leme permalink
    7 Março, 2011 04:50

    A moda é dizer: “É assim: muita gente a falar muito e muita gente a não fazer nada”.
    Ou ainda mais à tira: “Ó meu, isto é assim, tás a ver: A gente é que sabe e é quem manda os bitaites e quem faz são os trabalhadores qu’eles é que ganham a gaita, olaté. Tás a ver, ó meu?”.

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  29. 7 Março, 2011 09:57

    Manuel

    O estado democrático controla as nossas vidas na medida em que o decidimos. E tem o monopólio da força porque a alternativa seria que a força pudesse ser exercida pelos mais fortes, independentemente do controlo de todos.

    As trocas entre indivíduos e empresas não são necessariamente voluntárias e muito menos livres. As empresas têm todos os vícios dos estados, com a diferença que o seu controle está nas mãos de muito poucas pessoas. E parte do problema que estamos a ter em Portugal e no mundo tem precisamente a ver com o facto dos estados estarem a ser controlados por empresas.

    A notícia que serve de base ao post não tem a ver com estado social nem sequer com cultura subsidiada pelo estado. Tem a ver com desorganização e irresponsabilidade. Coisa que ocorre em qualquer organização. Daí que a notícia não tenha nenhum valor argumentativo para atacar os apoios do estado aos mais pobres.

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  30. lucklucky permalink
    7 Março, 2011 11:50

    O estado democrático controla as nossas vidas na medida em que o decidimos.
    -Não, não controla como nós decidimos. O Estado Democrático controla as nossas vidas como a maioria decide, é uma coisa diferente. Por isso é que a Constituição deve limitar mais o Poder da Democracia protegendo também as posses e os ganhos dos Portugueses da rapina da maioria. Incluíndo proteger os Portugueses que ainda não nasceram da rapina dessa maioria com as dívidas que estão criando.
    .
    “tem precisamente a ver com o facto dos estados estarem a ser controlados por empresas.”
    Hahha. Piadão diga-me lá quem é que pode fazer aquilo que o Estado faz? Maddoff foi para a cadeia e o Estado faz pior: Obriga todos a contribuir para o Maddoff estatal.
    .
    “Tem a ver com desorganização e irresponsabilidade.
    Coisa que ocorre em qualquer organização.”
    Precisamente, e como o Estado é organização única. Os incentivos ainda são mais fortes devido ao seu poder. O seu poder deve ser muito mais restrito. O poder imenso que tem de taxar e impostar e endividar sem limites Constitucionais é a certeza que os vai usar.

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  31. 7 Março, 2011 14:38

    “Por isso é que a Constituição deve limitar mais o Poder da Democracia protegendo também as posses e os ganhos dos Portugueses da rapina da maioria. ”

    Portugueses são todos: as minorias e as maiorias.

    Há regimes que protegem as minorias ricas e poderosas do poder da maioria. Quando as coisas se complicam usam e abusam da violência, seja do estado, seja de mercenários. Não se chamam democracias e às vezes acabam muito mal. Infelizmente as democracias ocidentais estão a ir nesta linha.

    Para ver o poder das empresas em usar o estado no seu próprio interesse basta ver três casos:
    – TGV, imparável mesmo agora;
    – lei das rendas: que seria da construção de casas novas se as antigas pudessem ser alugadas com segurança?
    – IRC dos bancos e distribuição dos riscos: se dá lucro, é privado; se falir o estado nacionaliza e paga.

    Qualquer organização de grande poder pode ser subvertida e usada contra as pessoas. Há muitas empresas com mais poder do que um estado. Queremos ser governados por uma organização privada que não controlamos ou por um estado em que ainda temos uma palavra a dizer?

    “O poder imenso que tem de taxar e impostar e endividar sem limites Constitucionais é a certeza que os vai usar.”

    Claro que os estados usam o poder de cobrar impostos e de se endividar. Mas isso não significa que o façam para além do razoável. Pois se assim fosse estavam todos os estados da Europa com as finanças no estado das portuguesas hoje, mesmo antes da crise. E é óbvio que não era o caso.

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  32. 7 Março, 2011 16:04

    Carlos,

    Quando dizes que o “estado democrático controla as nossas vidas na medida em que o decidimos” esqueces que não existe essa primeira pessoa do plural. Não há decisões colectivas que o sejam, verdadeiramente. Mais ainda quando não há votações directas. Por exemplo, não faz qualquer sentido eu dizer que “nós decidimos que o TGV será construído” se eu próprio não concordo com essa decisão, se ela foi tomada por supostos “representantes”, e se para a eleição desses representantes o meu voto tem um peso totalmente desprezável. (Vê os textos que o Rui A. recomendou em resposta a um comentário mais acima.) É por isso mesmo que a democracia é apenas e só uma ferramenta aceitável para fazer escolhas num conjunto de casos que deve ser tão pequeno quanto possível, com limites estritos fixados constitucionalmente de modo a garantir tanto quanto possível a nossa liberdade individual.

    Dizes que o estado “tem o monopólio da força porque a alternativa seria que a força pudesse ser exercida pelos mais fortes, independentemente do controlo de todos”. O ónus da prova de uma tal asserção cai em ti, estatista. Afinal, és *tu* que defendes que deve existir uma tal entidade que tem poder sobre *mim*. Ainda assim, tomando como válido o que dizes, terás naturalmente de reconhecer que esse monopólio da força só poderá ser compatível com um mínimo de liberdade se a aplicação dessa força for claramente limitada. Coisa que não acontece, claramente, quando o estado consome quase metade do que produzimos e se permite decidir acerca de quase tudo quanto às nossas vidas.

    Dizes que “as trocas entre indivíduos e empresas não são necessariamente voluntárias e muito menos livres”, mas não explicas de todo como pode isso ser verdade (suponho, naturalmente, que estás a excluir as trocas em que há fraude ou crime).

    Dizes que “as empresas têm todos os vícios dos estados, com a diferença que o seu controle está nas mãos de muito poucas pessoas”, mas esqueces que não podes comparar uma empresa e o estado. Não são comparáveis porque, como disse, as empresas não podem recorrer à violência, ao contrário do estado. Se dissesses que os gestores são tão humanos quanto os governantes, não discordaria. Mas pôr empresas e estado no mesmo plano e compará-las é misturar alhos com bugalhos. Por outro lado, também não é verdade que as empresas estejam “nas mãos de muito pouco pessoas”. Primeiros por há muitíssimas empresas, e depois porque muitas dessas empresas são detidas por uma enorme quantidade de accionistas. Mas, como disse, isso é irrelevante: nenhuma empresa me pode forçar a adquirir qualquer produto ou serviço (excepto se o estado lhe conferir algum privilégio). Finalmente, não é verdade que ser contra o estado seja ser a favor das empresas. É ser a favor dos indivíduos, o que inclui naturalmente ser a favor da liberdade para empreenderem, contratarem e trocarem entre si o que entenderem.

    Dizes que “parte do problema que estamos a ter em Portugal e no mundo tem precisamente a ver com o facto dos estados estarem a ser controlados por empresas”, mas isso é totalmente falso. O poder político controla as empresas, regula-as, limita-as e, finalmente, coopta-as, tornando-as parte de um estado corporativo semelhante, em alguns aspectos, ao defendido pelo fascismo. E há empresas que vão nisso? Pois claro que vão. Os incentivos são enormes. Ter o poder efectivo do estado do nosso lado pode trazermos muitas vantagens.

    Dizes que “a notícia que serve de base ao post não tem a ver com estado social nem sequer com cultura subsidiada pelo estado”, mas não é verdade. Tem tudo a ver com o estado social. Trata-se de um estado que vive de oferecer vantagens evidentes a uns à custa de pequenas desvantagens para todos ou para muitos, pelo menos. Como as vantagens são conferidas a grupos bem definidos e são significativas, enquanto as desvantagens são incrementais e disseminadas, produzindo enormes efeitos comulativos, mas tornando difusas as suas verdadeiras causas, ninguém se revolta. Escolha pública, mais uma vez.

    Dizes que a entrada do Rui A. “tem a ver com desorganização e irresponsabilidade”, que é “coisa que ocorre em qualquer organização”. Sim, também tem a ver com isso. Mas quando um indivíduo ou uma empresa privada é desorganizado ou irresponsável, isso afecta-a só a ela. Se afectar terceiros, por violação de contratos, etc., temos sempre a justiça a quem recorrer. Se for o estado, a quem recorres? Que fazes? Trocas o teu sentido de voto? E se nem isso podes fazer, porque nunca votaste nos responsáveis?

    Finalmente, não é verdade que “a notícia não tenha nenhum valor argumentativo para atacar os apoios do estado aos mais pobres”. Tem todo o valor. É que o “apoio do estado aos mais pobres” é, na realidade, apenas uma desculpa para criar uma burocracia enorme, gastadora e criadora de clientelas e apoios eleitorais, e muito menos para apoiar “os pobres”. Isto sem falar da profunda imoralidade que seria “apoiar os pobres”, mesmo que isso acontecesse, usando dinheiro roubado aos cidadãos. Os cidadãos devem poder ser livres de apoiar ou não quem entenderem, e de criticar não coercivamente os cidadãos que não apoiarem quem eles julgam merecer apoio.

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