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o mito dos independentes

11 Abril, 2011
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Desde os seus primórdios que a IIIª República Portuguesa considerou a representação política um monopólio dos partidos. Isto excluiu, desde 1976 até hoje, a possibilidade de cidadãos independentes apresentarem candidaturas à Assembleia da República, sem serem obrigados a fazê-lo nas listas dos partidos, estas, por sua vez, condicionadas e ratificadas pelos respectivos directórios em função de interesses de mera contabilidade eleitoral. Consequentemente, sempre que um partido político português integra nas suas listas de deputados uma personalidade «independente», fá-lo não exactamente em busca dos eventuais méritos revelados por essa pessoa na vida civil, mas a pensar nos votos que esse «exemplo» poderá trazer para o partido. Por outras palavras, os partidos não procuram verdadeiros independentes para melhorarem as suas listas com o mérito pessoal e cívico, mas simples caciques eleitorais, isto é, pessoas que, por uma ou outra razão, possuem alguma reserva de votos que possam ajudar o partido a reforçar o seu poder e a aumentar as suas votações.

 

 

A isto chama-se partidocracia e caciquismo, duas tradições muito antigas da política portuguesa, que se manifestaram exuberantemente na Monarquia Constitucional, na Iª República e, agora, na democracia em que vivemos. Os «independentes» que, desde 1976, têm marcado presença nas listas dos partidos são sempre personagens que pertencem à periferia da política, ou que já lá estiveram e querem regressar, ou, até, que sempre por lá andaram e nunca a abandonaram. Galvão de Melo, Lucas Pires, Paulo Portas, António Barreto, Vasco Pulido Valente, Medeiros Ferreira, Luís Beiroco, Rui Pena, Lucas Pires, Maria do Rosário Carneiro, Bagão Félix e muitas outras pessoas que, em algum momento das suas vidas, protagonizaram candidaturas «independentes», foram ou são políticos profissionais e não exactamente pessoas que a sociedade civil trouxe para a política.

 

O mesmo se passa com o agora candidato do PSD Fernando Nobre. Nobre não foi catapultado para as listas do PSD pelo meritório trabalho que fez à frente da AMI (se assim fosse, já se podiam ter lembrado dele há mais tempo), mas pelo facto de ter obtido 14% dos votos nas últimas presidenciais. O PSD não foi, por isso, buscar um «independente» à sociedade civil, mas um cacique eleitoral à periferia do sistema partidário, desejoso, de resto e como se viu, de passar para o seu núcleo. É evidente que o PSD, como grande partido de governo que é, deve ser suficientemente abrangente para poder incluir nas suas listas pessoas de centro-esquerda que, de algum modo, tenham audiência no país e que aceitem rever-se nas linhas gerais das políticas do partido. Mas escolher Fernando Nobre para candidato à segunda figura do estado e pô-lo a chefiar a lista de deputados do maior circulo eleitoral do país, quer dizer que foi o PSD quem aderiu à augusta personagem e àquilo que ela eventualmente poderá representar, e não o contrário. Tem mal? Claro que tem. Numa altura em que o país necessita de uma clara alternativa de centro-direita não socialista ao regime estatista do PS, o PSD escolheu para o representar em dois postos políticos da maior importância, um cidadão «independente» que ainda há dois anos se revia no socialismo do Bloco de Esquerda, que criticava aqueles que defendiam menos estado para Portugal, e que fez, como não poderia deixar de fazer face ao que dele temos ouvido ao longo dos anos, uma campanha para as presidenciais a dizer que o seu coração está à esquerda. Estas coisas, em política, pagam-se, porque contribuem para densificação do pântano, em vez de auxiliarem à tão necessária clarificação das políticas e dos projectos alternativos de poder, isto é, a uma higiénica separação das águas. Mas veremos o que as urnas têm a dizer a 5 de Junho.

7 comentários leave one →
  1. Pi-Erre permalink
    11 Abril, 2011 17:35

    Com atitudes deste tipo, o PSD já perdeu as próximas eleições.

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  2. Jose Domingos permalink
    11 Abril, 2011 17:42

    Claro. Os partidos, tratam da vidinha deles, admitindo um democrata, desde que seja á maneira deles. os partidos, todos os com representação parlamentar, assumiram-se, “donos” da domocracia, quando, na realidade, são meras agências de emprego, com uma contabilidade, no minimo, nebulosa, e onde, se pagam favôres, como temos assistido.
    É vergonhoso e criminoso que trinta e tal anos, depois do vinte e cinco, terem colocado Portugal, no estado miserável, em que está, tenham a distinta lata, de dizer agora, que o vão tirar, do buraco onde o colocaram. É um caso de policia, isto é gestão danosa.

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  3. Zegna permalink
    11 Abril, 2011 17:46

    O PSD com esta cartada mais parece que vai jogar a roleta russa ……… Fernando Nobre de iluminado passa a apagado……….enfim , os portugueses têm os politicos que merecem……..
    Já agora aquela que dizem ” Geração á Rasca ” no dia 5 Junho fiquem em casa como têm feito nestes ultimos anos……..os polticos de Portugal agradecem.

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  4. CMO permalink
    11 Abril, 2011 18:08

    No post Rui A, afirma que “Nobre não foi catapultado para as listas do PSD pelo meritório trabalho que fez à frente da AMI (se assim fosse, já se podiam ter lembrado dele há mais tempo)”. Mas sendo o cargo de deputado um cargo de um órgão político representativo, só faria sentido o PSD integrar Nobre nas suas listas se este representasse algum grupo ou causa. Ora Nobre só deu esse salto quando ele próprio se candidatou a um cargo político recentemente.

    Rui A. avança ainda que ” O PSD não foi, por isso, buscar um «independente» à sociedade civil, mas um cacique eleitoral à periferia do sistema partidário, desejoso, de resto e como se viu, de passar para o seu núcleo”. Esta ideia tem um senão. Acha Rui A. que se Nobre estivesse desejoso de entrar para o core de um partido não tinha tido oportunidade anteriormente? Acha que o PS, o BE ou até o PP o rejeitariam?

    Principalmente Rui A. parece contradizer-se quando após sugerir que Nobre se vendeu por um prato de lentilhas afirma que “quer dizer que foi o PSD quem aderiu à augusta personagem e àquilo que ela eventualmente poderá representar, e não o contrário”. Aqui parece ter sido o PSD a vender-se a Nobre. Parece mais linear pensar que se venderam um ao outro – ou seja chegaram a acordo após negociação.

    Já concordo com Rui A. quando este considera que o convite a uma personagem de centro esquerda apesar de ter a vantagem de dificultar a mentira de Sócrates (que descreve Coelho como “ultra-liberal” e destruidor do estado social), contribui para dificultar uma ” higiénica separação das águas”.

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  5. rui a. permalink*
    11 Abril, 2011 18:44

    CMO,

    Compreendo os seus pontos de vista e acho-o pertinente quando diz que Nobre e o PSD chegaram a um acordo após terem-no negociado. Isso, por si só, não legitima, porém, o acto. Mas já não lhe garanto razão quando pergunta se eu acho que o PS, o Bloco ou mesmo o PP o rejeitariam como candidato. Primeiro, porque ele já foi candidato do Bloco. Segundo, porque se prestou a ser protagonista de uma candidatura presidencial apoiada (senão mesmo lançada) por um sector do PS descontente com a candidatura de Alegre. Terceiro, porque me parece estranho que o homem tenha vindo de um percurso político tão à esquerda, com expressa adesão aos «princípios» do Bloco em matérias tão fundamentais quanto a participação do estado na economia e na vida social, por exemplo, para, agora, aterrar num partido considerado de direita, liderado por alguém que diz (bem) que um dos problemas do país é ter estado a mais. Precisamente o partido que se antevê com mais probabilidade de ganhar as próximas eleições. Há qualquer coisa aqui que não bate bem, não lhe parece?

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  6. Arlindo da Costa permalink
    11 Abril, 2011 20:10

    Independentes=Mamões e chulos.
    Tenho dito.

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  7. Miguel permalink
    12 Abril, 2011 10:21

    “Independentes=Mamões e chulos.
    Tenho dito.”

    Os dependentes é só amor à camisola 😀

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