Saltar para o conteúdo

Prescrições

19 Março, 2014

Afinal parece haver um tema consensual entre os partidos do governo e da oposição: “é preciso apurar responsabilidades” e “as coisas não podem continuar assim” em matéria de prescrição da responsabilidade criminal e contra-ordenacional. Sempre que se gera um consenso deste tipo, a consequência é sempre a mesma: entre grandes proclamações a propósito da justiça, da igualdade ou do Estado de Direito, muda-se a Lei.

No entanto…, a alteração das regras da prescrição da responsabilidade penal ou contra-ordenacional, sobretudo em resposta a casos mediáticos, é das alterações legislativas mais perversas e, em regra, também mais contraproducentes, como prova a história recente: a entrada em vigor do Código Penal de 1995 (que alterou substancialmente as regras da prescrição) conduziu a uma jurisprudência infindável, com reflexos em processos ainda hoje pendentes, em virtude do princípio da aplicação da lei mais favorável (veja-se, a titulo de exemplo, este acórdão de 2013 da relação de Coimbra, proferido num processo iniciado em 1996, mas em que os factos ocorreram em meados de 1995).

Milhares e milhares de outros processos foram, ao longo dos últimos 18 anos, objecto de recursos (muitos deles até ao Tribunal Constitucional) em que a única questão a apreciar era a da prescriçã0, apenas se justificando porque a alteração das regras, a par da obrigação imposta aos tribunais de aplicarem a lei concretamente mais favorável,  multiplicou as dúvidas interpretativas e as decisões contraditórias.

Se há matéria em que a estabilidade legislativa é especialmente importante, a das regras da prescrição é seguramente uma delas.

Por outro lado, embora não seja essa a sua função principal, as regras de prescrição servem de incentivo ao andamento dos processos. O aumento dos prazos de prescrição poderá fazer com que os processos demorem ainda mais tempo a decidir (continuará a haver prescrição de processos, só que ainda mais tarde).

Nos últimos anos, Portugal tem sido condenado com frequência no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em virtude da demora excessiva dos processos judicias. Alargar os prazos de prescrição não contribuirá para melhorar esta triste estatística, bem pelo contrário.

Por último, a prescrição de um processo não significa necessariamente que o Estado “deixou de receber” o valor de uma determinada coima ou que “um criminoso escapou da prisão”. Significa apenas que o mérito do caso acabou por não se apreciado. É possível que, se o tivesse sido, o arguido acabasse por ser absolvido ou condenado numa coima ou numa pena bem menores do que as que fazem manchetes dos jornais. Isto é especialmente verdadeiro nos casos de coimas aplicadas por diferentes entidades reguladores, como são os casos do Banco de Portugal ou da Autoridade da Concorrência, entre outras.

A existência de eventuais crimes ou outros actos ilícitos que escapam impunes, por o Estado ser incapaz de os investigar e julgar nos prazos mais do que razoáveis que a lei portuguesa prevê actualmente, é um problema (embora não seja um dos maiores problemas do país, nem sequer dos maiores problemas da justiça) que merece reflexão e acção para o minimizar. No entanto, alterar a lei, como oposição e situação parecem pretender, é um caminho errado.

29 comentários leave one →
  1. politologo permalink
    19 Março, 2014 18:31

    para divulgar aos quatro ventos

    Gostar

  2. Zé da Póvoa permalink
    19 Março, 2014 19:30

    Passados 3 anos de governo em que prometeu mudar radicalmente para melhor a Justiça, com a inefável ajuda da ministra mais oxigenada que há memória, PPC aparece na AR a lamentar-se dos problemas surgidos, como se nada tivese a ver com o caso, prometendo agora tomar medidas que evitem idênticas situações no futuro. Só para quem anda a “nanar” pois hà processos que envolvem grandes tubarões laranjas e grandes amigos de Cavaco (ex: Oliveira Costa, Dias Loureiro, João Rendeiro, Duarte Lima e muitos outros) que estão em banho-maria à espera do melhor momento para serem arquivados por falta de provas ou então para prescreverem. A justiça portuguesa no seu melhor! Como diz um velho ditado popular “quem tem amigos não morre na cadeia”!!!

    Gostar

    • Tiradentes permalink
      19 Março, 2014 20:46

      Pois tiveram 37 anos a mudá-la e a culpa é deste governo que prometeu. Como se nenhum dos outros o tivesse feito e até as prescrições são responsabilidade da lei feita pelo Coelhone da Damaia

      Gostar

    • 19 Março, 2014 21:28

      Zé da Póvoa,

      Hà processos que envolvem grandes tubarões laranjas e grandes amigos de Cavaco, como envolevem bogas enormes como o (PAulo Teixeira Pinto) ex da minitra e amigos do ex como Jardim Gonsalves.
      Ou pensas que com o divoricio a Minstra não trouxe nenhum dos 100 milhões que o marido mamou???.
      Se começas a puxar o fio á meada chegas a uma simples conclusão. São lá metidos para tratar de algumas encomendas e depois…Gaspar foi disso exemplo enquanto 5ª elemento da troka. Mas há mais-….

      Gostar

      • Zé da Póvoa permalink
        19 Março, 2014 23:04

        Julgava que o Gaspar é que era o 4º. elemento da troika e o 5º. seria o Moedas, mas afinal a troika tem mais capatazes disfarçados!

        Gostar

    • JorgeGabinete permalink
      19 Março, 2014 23:27

      O Zé da Póvoa é realmente burro, energúmeno, ou dá-lhe jeito neste caso (Bolota incluído)?. Desconhece pois o princípio da não retroactividade, que qualquer mudança de lei só se aplica em caso futuros? Mais, olimpicamente faz um esforço para abranger quem lhe convém na mesma problemática sem sequer comentar o tema do post. Com trauliteiros como vocês é que o país não vai a lado nenhum, seguros que resolvem o défice e tudo o mais entre uma cerveja e dois tremoços, pobres de espírito que são. Já agora podem tentar saber quem de facto está a acabar com os expedientes dilatórios, se é que a verdade não vos atazana, seus imprestáveis comentadores de bitaite.

      Gostar

      • Zé da Póvoa permalink
        20 Março, 2014 08:42

        Espero que quando estiver sóbrio possa rever aquilo que escreveu!

        Gostar

      • JorgeGabinete permalink
        20 Março, 2014 21:04

        Até bêbado (não era e não é o caso) sei que o Governo (ou a Assembleia da República) não tem qualquer capacidade de solucionar/evitar prescrições para processos e para “crimes” anteriores à legislatura e a qualquer eventual lei que pudesse criar. Repito, julga que resolve os problemas entre uma cerveja e dois tremoços com o bitaite, ou é burro ou faz-se. Não só a retroactividade não é admissível, em geral, como a sê-lo, seria sempre e só em benefício do réu.

        Gostar

  3. @!@ permalink
    19 Março, 2014 19:45

    Prescrevem porquê? Processos demasiado complexos e extensos para o nº de pessoas afectas ao processo?

    Gostar

  4. 19 Março, 2014 20:12

    O problema parece estar mais na demora excessiva dos processos judicias, do que no prazo das prescrições.
    O que vai dar à eventual corrupção nos processos dilatórios.
    A desculpa é por exemplo a falta de mobiliário.

    Gostar

    • Tiradentes permalink
      19 Março, 2014 20:47

      falta de juízes…emigraram todos para Inglaterra para lavar pratos.

      Gostar

    • licas permalink
      20 Março, 2014 17:59

      A demora excessiva não pode ser imputada ao Piscoiso no seu afã
      de cumprir com a sua missão de robô comandado à distância.
      Foi o caso do Sócrates ter proferido a mensagem na TV: Eleiçóes Já!
      A personagem em foco tinha escrito aqui na véspera que o governo
      actual deveria prosseguir em exercício . . .
      JULGAM que ele se conteve? NEM PENSAR , no dia seguinte, um
      CRIADO ATENTO, VENERADOR E OBRIGADO postou sem
      qualquer indício de pudor: Eleições Já!

      Gostar

  5. 19 Março, 2014 20:41

    Os três pilares de uma democracia são; a educação, a saúde e a justiça.
    Em Portugal são uma desgraça completa.

    Gostar

    • Tiradentes permalink
      19 Março, 2014 20:47

      foi um esquecimento das amplas liberdades do 25A

      Gostar

      • 19 Março, 2014 21:35

        Tiradentes,

        Amplas liberdades seria, as medidas que venham a ser tomadas ter efeitos rectroativos e assim limpar o Milhão ao Gonsalves, não , não é o Companheiro VAsco, é o Gonsalves mas o Jardim aquele que se fartou de pagar campanhas eleitorais á quadrilha. Aposto que á CDU não dei nem um pataco.

        Gostar

      • Tiradentes permalink
        19 Março, 2014 23:02

        Sim Bolota.
        Por isso mesmo disse que foi um esquecimento das amplas liberdades.
        Não tenho dúvidas que se o Gonçalves Jardim tivesse financiado a CDU estaríamos muito melhor hoje, talvez com uns cartões de racionamento embora tenha a certeza que o sol brilharia muito mais aqui no rectangulo e que o Campo Pequeno seria mesmo pequeno.

        Gostar

  6. 19 Março, 2014 21:09

    Prescreve, não prescreve – também…o que cai no erário é manteiga em focinho cão.

    Sem falar dos que se vão lambuzando, à compita.

    Faz de conta que é a justiça divina…

    Gostar

  7. 19 Março, 2014 21:09

    Prescreve, não prescreve – também…o que cai no erário é manteiga em focinho de cão.

    Sem falar dos que se vão lambuzando, à compita.

    Faz de conta que é a justiça divina…

    Gostar

  8. JorgeGabinete permalink
    19 Março, 2014 22:27

    Tenho por certo que os expedientes dilatórios existem não por acaso, tal como pouca coisa acontece por acaso na nossa justiça. Veremos se a destruição de escutas não anulará o julgamento Face Oculta (por ex) e se daí (da repetição do julgamento) não resultará a inconsequência de qualquer condenação. Neste tema não se fazem comissões parlamentares de inquérito para saber, quem mudou que lei e em benefício de quem veio a resultar, interessantes padrões se encontrariam. Quando o expediente dilatório não expia certos réus, temos sempre o indulto. Mais uma conquista de Abril.

    Gostar

  9. Fincapé permalink
    19 Março, 2014 22:40

    Afinal, aconteceu apenas aquilo que toda a gente “previa” que ia acontecer. Como toda a gente “prevê” desfechos parecidos para muitos outros processos .
    Além disso, com tantos furtos de sabonetes em supermercados…

    Gostar

  10. Alexandre Carvalho da Silveira permalink
    19 Março, 2014 22:47

    Uma vez ouvi uma história sobre um empresário de sucesso que depois de conseguir que lhe emprestassem uma pipa de massa de maneira fraudulenta, engendrou um esquema de roulement de cheques, ferrou o calote em duas ou três instituições de crédito, tudo com a conivência dos respectivos responsáveis a nivel intermédio, digamos assim.
    Descoberta a moscambilha, foi tudo parar ao tribunal.
    Não sei o que aconteceu aos bancários, mas o empresário em causa safou-se da seguinte maneira: arranjou como advogado o melhor especialista na matéria, que para principio de conversa lhe disse quanto é que aquilo lhe iria custar: um milhão e meio de dólares. Ele disse ao advogado que era muito dinheiro ao que o advogado respondeu que comparado com dez anos na prisão não era nada; e depois disse-lhe para que é que o dinheiro servia: 500 mil para pagar os serviços dele, advogado, 500 mil para pagar ao médico que iria ao tribunal jurar que o homem era inimputável, e 500 mil para o juíz acreditar no que o médico dizia.
    É evidente que nada disto se passou em Portugal, não seria possivel, e também não tem nada a ver com prescrições de processos judiciais. Lembrei-me agora desta história nem sei bem porquê.

    Gostar

    • 20 Março, 2014 00:48

      É decalcada da seguinte.
      A NASA abriu concurso para mandar um homem a Marte.
      Respondeu um alemão e pediu 3 milhões de dólares explicando, um é para a minha mulher, outro para o meu filho e outro para o meu partido.
      Respondeu o francês, um é para a minha mulher, outra para a minha amante e outro é para dar ao meu clube de futebol.
      Respondeu o português, um é para mim, outro é para si e o outro é para dar ao fulano que vai no meu lugar.
      Quem foi escolhido?

      Gostar

  11. Portela Menos 1 permalink
    19 Março, 2014 23:28

    Um primeiro passo para acabar com este e outros escândalos seria rever o estatuto dos “fazedores” de leis (na AR), impedindo que deputados “fazedores” de leis durante a manhã, pudessem exercer advocacia durante a parte da tarde, principalmente nos escritórios de advogados que “prestam serviços” ao governo. Quanto aos “fazedores” de decretos-leis (no governo) o assunto já será mais difícil de controlar. Em ambos os casos, há sempre a possibilidade de saber o estatuto profissional dos que se propõem a votos…

    Gostar

  12. JorgeGabinete permalink
    19 Março, 2014 23:32

    O regime de concubinato entre certos magistrados, advogados, funcionários judiciais e juristas permite a filtragem quando necessária. Que lei (suponhamo-la “honesta”) resiste a esta máfia?

    Gostar

  13. Ze Gneiss permalink
    20 Março, 2014 17:42

    A forma mais fácil de atenuar o problema é proceder à interrupção da contagem do tempo.
    Isso só é possível alterando a lei, até porque a ser feito tem que ter limites.

    Gostar

Indigne-se aqui.