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Provedor (II)

23 Março, 2009
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Toda a querela  (em certo sentido,  mesmo sem grande sentido!)  que se desenvolveu a propósito do Provedor de Justiça, fez-me tentar perceber a sua efectiva relevância.

Qual o seu papel interventor/garantístico dos direitos dos cidadãos? Será mesmo um cargo que pouco ou nada adianta ao funcionamento das Instituições?  Terá , ao invés, alguma capacidade para desenvolver  uma espécie de “magistratura de influência” na garantia dos direitos dos cidadãos?  Como é encarado pela administração pública e pelos serviços do Estado, em geral?

Nada melhor do que passar os olhos pela  respectiva página oficial.

Destaco duas coisas: o organigrama (complexo e prenchidinho de coordenadores e de assessores) e o Relatório relativo a 2007, apresentado á Assembleia da República (o último publicado).  E adianto já a conclusão a que, numa primeira vista de olhos e sem grande preocupação de rigor, cheguei:  grande parte dos portugueses reclamantes ou não sabem para que serve o Provedor, ou não sabem reclamar ou então, reclamam sem razão!

Assim:

Notei, por exemplo, que em 2007, houve 10 021 reclamantes, tendo sido abertos 6737  processos nesse mesmo ano.  Avançando um pouco mais – uma vez que estes números, assim em bruto, pouco dizem –  salto para o Quadro 8, no qual verifico que existe uma estatística relativa aos processos arquivados (quer dizer, terminados) “com intervenção essencial do Provedor“.

Destes e segundo o dito Relatório, em 2007,  19 processos (ou seja, 0,3%), foram resolvidos com a dita intervenção e com a respectiva Recomendação acatada, sendo que 31,9%  foram resolvidos sem Recomendação.  Por outro lado, 4,4 % dos processos não foram resolvidos.

Mas, e os outros ?…. quer dizer, se cerca de 40% dos processos foram arquivados por terem sido resolvidos (com ou sem intervenção essencial do Provedor), o que é feito dos restantes (mais ou menos) 60% de processos entrados em 2007?

Ora, o dito Quadro 8 responde, indicando, detalhadamente, os motivos de arquivamento…que são  muitos e variados!  Mas há dois que me chamaram a atenção:

34,4% dos processos foram arquivados, desde logo ,  por falta de fundamento da respectiva queixa  e  –16,7%  mereceram  um arquivamento liminar

No total – e imagino que o arquivamento liminar também corresponda a uma imediata verificação da falta de fundamento da respectiva reclamação – mais de 50% de tais reclamações que originaram processos, em 2007, efectuadas pelos cidadãos ao Provedor,  não tinham fundamento!  Parece-me muito e, sobretudo, parece-me um dado merecedor de reflexão.

Por outro lado – e como alguém já trouxe à colação esse ítem, nas discussões, aqui, no Blasfémias – verifica-se que houve, em 2007,  5 processos relativos a Pedidos de  Fiscalização da Constitucionalidade.

Enfim,  é certo que o cargo dependerá, em certa medida, de quem o desempenhar….por isso, acho que, apesar de tudo, este tipo de Relatório (e de Informação)  não será muito conclusivo!

 No entanto,  se cerca de 50% das reclamações que originaram a abertura de processos não tinham fundamento, a primeira conclusão a tirar  é que grande parte dos portugueses reclamantes ou não sabem para que serve o Provedor,  ou não sabem reclamar ou então, reclamam sem razão!

18 comentários leave one →
  1. 23 Março, 2009 19:09

    Excelente!

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  2. Edite permalink
    23 Março, 2009 19:29

    “apresentado á Assembleia”

    “á” – ai, ai, ai! O acento não é este!

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  3. 23 Março, 2009 19:38

    O Provedor não resolve nada. Aconselha.

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  4. Santo Pragal permalink
    23 Março, 2009 20:09

    1.º Magalhães Godinho, indicado pelo PS;

    2.º Pamplona Côrte-Real, indicado pela AD;

    3.º Almeida Ribeiro, indicado pelo PS;

    4.º Mário Raposo, indicado pelo PSD

    5.º Menéres Pimentel, indicado pelo PSD, a pretexto de que o anterior provedor não tinha terminado o mandato;

    6.º Menéres Pimentel (PSD), reeleito a pretexto de que o Governo passou a ser do PS, não obstante o provedor ter sido até aí da cor da maioria;

    7.º Nascimento Rodrigues, indicado, de novo, pelo PSD, a pretexto de que o Governo continuava a ser do PS;

    8.º Outra vez Nascimento Rodrigues, militante do PSD, a pretexto de que se tratava de uma reeleição, não obstante o executivo já ser novamente do partido do provedor.

    Quem é dá de “comer” aos comilões,

    Quem precisa dos tachos do estado e dar comer aos boys.

    Quem é precisa de dar comer as empresas Laranjas

    Esse é problema

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  5. orabolas permalink
    23 Março, 2009 20:09

    ora aí está mais uma ótoridade que faz muita falta: aos que lá vão buscar o salário ao fim do mês…

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  6. 23 Março, 2009 20:12

    Não sei se o título é o mais adequado para o post, uma vez que este nada demonstra quanto à utilidade da função do Provedor, apenas quanto à eventual ignorância de quem para si recorre (não sabem para que serve o Provedor, ou não sabem reclamar ou então, reclamam sem razão). A eficácia das funções da provedoria medir-se-á sim em função do número de queixas com fundamento que foram objecto de resolução com intervenção do provedor (com ou sem recomendação), número esse que fica acima dos 80%.

    Bastava não ter sido selectivo nos números do relatório que citou: as percentagens de eficácia vêm logo a seguir, na tabela que se segue àquela que citou amplamente no post.

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  7. 23 Março, 2009 20:53

    #6 . Pedro Delgado Alves,

    Não concordo consigo: as competências do Provedor já foram, aqui e em post’s antecedentes, debatidas. De resto, houve, em certo sentido, uma tendência para considerar-se, em termos genéricos e de comentários, que tais competências eram reduzidas. Reduzidas, desde logo, em termos de impacto efectivo no funcionamento das instituições, sob o ponto de vista da defesa dos direitos dos cidadãos. Assim,

    1 – Ora, claro está que a eficácia num universo limitado (por definição, bastante limitado, caso as tendências e conclusões referidas estejam correctas – e noto, por exemplo, os casos/processos relativos á fiscalização da constitucionalidade), diz-nos sempre pouco quando o que está em causa é, precisamente, averiguar a relevancia da instituição, das respectivas funções , etc., em termos populares, a respectiva presença da instituição na vida dos cidadãos.

    Quero dizer, se o que se pretende saber é se é ou não relevante a função em causa, então e face ao quadro limitado de competências, há que tentar perceber como é que os cidadãos utilizam a instituição. Passei, por isso, por cima dos dados relativos á eficácia (todos com índices acima dos 80%, é certo), porque achei, desde logo, reduzido o universo de actuação.

    Sinceramente, acho que há uma lógica de “funil” na possibilidade de acesso consequente (quadro de respectivas competências) ao Provedor e, por isso, dizer, sem mais, que a eficácia da intervenção é de x ou y% dos processos – sem cuidar de saber se são muitos, poucos, assim-assim – não diz nada sobre a importância real e sociológica da função/instituição.

    2 – Por outro lado, dizer que “nada demonstra quanto à utilidade da função do Provedor, apenas quanto à eventual ignorância de quem para si recorre (não sabem para que serve o Provedor, ou não sabem reclamar ou então, reclamam sem razão)” – também não me parece correcto.

    A utilidade concreta mede-se neste caso – parece-me – em função das necessidades gerais da população. Se esta não entende a função, então isso também diz alguma coisa/muito sobre a respectiva utilidade, numa lógica democrática. Diz, pelo menos, que se a sua utilidade é grande em teoria, mas na prática ninguém a conhece, então, ou tal utilidade não será tão grande como isso, ou será preciso ter uma política de divulgação e de cidadania que não tem havido…julgo eu de que…!

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  8. 23 Março, 2009 21:01

    #6 – Pedro Delgado Alves – (cont. do comentário antecedente):

    ….Repare, uma possível conclusão a retirar desses número poderá ser a de que há necessidade de se alargar, precisamente, as competências (em rigor, atribuições e competências) do Provedor.

    Porque não analisar tais queixas sem fundamento que, pelos vistos, são em grande número? Será que isso é demonstrativo da necessidade de uma maior fiscalização e/ou poderes de análise/investigação do provedor? Ou será que é simplesmente ignorância? Ou então, será que é um índice de descontentamento? (tipo: apesar de saber que ele não pode resolver o meu problema, nem intervir, eu queixo-me na mesma?)

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  9. 23 Março, 2009 21:07

    Acabo de ouvir António Vitorino, na brincadeira apologética semanal com Judite de Sousa, dizer que o Governador de BENGALA (sic), em Angola, lhe pediu para usar os seus poderes de então-Ministro para demitir o então-treinador escocês do Benfica, SORENSON (sic).

    Foda-se e refoda-se, ver esta merda paga pelo meu dinheiro é aviltante.

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  10. Santo Pragal permalink
    23 Março, 2009 21:28

    Um pouco tento da lingua.

    O Partido não te ensina? o camarada quanto esta bebado na Soeiro , ainda vá lá.

    Agora aqui

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  11. 23 Março, 2009 22:25

    Não deve haver político mais neutro/sem sal/enjoativo do que o Vitorino. Era preferível uma missa diária do MRS.

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  12. MJP permalink
    23 Março, 2009 23:04

    Não percebi a intenção declarada deste post. A intenção escondida fica à vista logo com o primeiro comentário!
    Considera, então, que é preferível extinguir o lugar de Provedor? se não serve para nada…
    Acha, porventura, que é de manter mas a pessoa que ocupa o lugar é indiferente? que pena que o Vital já tenha poleiro!
    Ou quer simplesmente dizer que o povo é tão burro que não sabe para que serve o Provedor? mas, claro, o lugar é para manter.

    Passo a explicar a revolta que não querem ver: a AR tem atribuições que são sucessivamente canalizadas para os directórios dos partidos. Acontece com todos, mas que alguém se revolte por uma só vez já é sinal positivo. Encolher os ombros porque é só mais uma, não faz a mudança.

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  13. 23 Março, 2009 23:55

    MJP, supra #12

    Quanto a intenções:

    1) apenas ler e por as pessoas a ler a informação oficial do Provedor de Justiça. Mete-me um pouco de confusão que haja tamanha discussão – antecedida ou precedida de impasse político – e, com dados disponíveis, ninguém se dê ao trabalho de balizar a corrente de opiniões e de contra -opiniões, em dados.

    2) Peceber aquilo que pergunto no post. E, se leu com atenção, não tem nada de escondido.

    3) Suscitar a discussão relativamente aquilo que me intrigou – sem ter lido a integralidade dos dados disponíveis e sem ter analisado, sequer, exaustivamente, todo o Relatório (já só falo de 2007): parece-me exagerado o número de processos arquivados por falta de fundamento; parece-me muito curta a actividade do Provedor e/ou o recurso a ele. Porquê?

    O resto que pensa, pensa que pensa, imagina, ou seja lá o que for, creia-me, é-me de todo indiferente. Já agora, também acho que este é um dos cargos que é (e muito) feito por quem o ocupa; também acho que o actual Provedor tem sido muito discreto, quando comparado o seu desempenho com antecedentes (ex. Meneres Pimentel e a sua causa/chamada de atenção para a situação nas prisões portuguesas).

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  14. 24 Março, 2009 00:09

    A avaliar pela estatística, estas pessoas não passam de meras figuras decorativas, assim como os organismos que os acolhem; núcleos de empregabilidade para as altas esferas da política e de certa camada da “sociedade civil”, unicamente destinadas a “engrossar” as fileiras elitistas dos partidos.
    O mesmo se poderá dizer da prática funcional das comissões parlamentares de inquérito que não passam de autênticas feiras de vaidades para cidadão ver.

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  15. 24 Março, 2009 01:41

    #7

    Caro PMF,
    Começo por discordar da sua réplica quando afirma que por aqui se discutiram as competências do Provedor. Na sequência de post de CAA, o que efectivamente se abordou foram os limites à actuação do Provedor. Se atentarmos ao que dispõe o respectivo estatuto poderemos verificar que o leque é considerável e o impacto significativo.

    Assim sendo, e em primeiro lugar, quanto às competências, aqui fica o elenco (peço desculpa pelo lençol que se segue, mas penso que faz falta para enquadrar o debate):

    1) Dirigir recomendações aos órgãos competentes com vista à correcção de actos ilegais ou injustos dos poderes públicos ou melhoria dos respectivos serviços;
    2) Assinalar as deficiências de legislação que verificar, emitindo recomendações para a sua interpretação, alteração ou revogação, ou sugestões para a elaboração de nova legislação, as quais serão enviadas ao Presidente da Assembleia da República, ao Primeiro-Ministro e aos ministros directamente interessados e, igualmente, se for caso disso, aos Presidentes das Assembleias legislativas Regionais e aos Presidentes dos Governos das Regiões Autónomas;
    3) Emitir parecer, a solicitação da Assembleia da República, sobre quaisquer matérias relacionadas com a sua actividade;
    4) Promover a divulgação do conteúdo e da significação de cada um dos direitos e liberdades fundamentais, bem como da finalidade da instituição do provedor de Justiça, dos meios de acção de que dispõe e de como a ele se pode fazer apelo;
    5) Intervir, nos termos da lei aplicável, na tutela dos interesses colectivos ou difusos, quando estiverem em causa entidades públicas.
    6)Requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade de normas
    7) Requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação e verificação de inconstitucionalidade por omissão

    De seguida, realçaria que, para o exercício das referidas competências, o provedor se encontra dotado de amplos poderes de intervenção:

    a) Efectuar, com ou sem aviso, visitas de inspecção a todo e qualquer sector da actividade da administração central, regional e local, designadamente serviços públicos e estabelecimentos prisionais civis e militares, ou a quaisquer entidades sujeitas ao seu controlo, ouvindo os respectivos órgãos e agentes e pedindo as informações, bem como a exibição de documentos, que reputar convenientes;
    b) Proceder a todas as investigações e inquéritos que considere necessários ou convenientes, podendo adoptar, em matéria de recolha e produção de provas, todos os procedimentos razoáveis, desde que não colidam com os direitos e interesses legítimos dos cidadãos.
    c) Procurar, em colaboração com os órgãos e serviços competentes, as soluções mais adequadas à tutela dos interesses legítimos dos cidadãos e ao aperfeiçoamento da acção administrativa.

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  16. 24 Março, 2009 02:04

    Continuação da resposta a #7

    Atentas estas competências, as suas conclusões no ponto 1 parecem-me apontar baterias para o local errado. O universo limitado de casos de sucesso a que se reporta não se mede no contexto dos processos de fiscalização da inconstitucionalidade por acção ou omissão (em relação aos quais, o provedor é apenas um de vários órgãos constitucionais com legitimidade processual), mas sim no seu papel na resolução de litígios entre a administração e particulares. É esta a sua função com directo impacto na vida concreta dos cidadãos.

    Assim sendo, mais do que referir dados percentuais, será interessante apontar para números absolutos, para os mais de 2300 cidadãos que, em 2007 apenas, mediante intervenção do provedor, resolveram os problemas que estiveram na origem da queixa (números também disponíveis no relatório). Francamente, não me parece um resultado de todo menor ou insignificante. Acrescentaria ainda que, para além dos referidos 2300 casos concretos, a intervenção do provedor tem ainda um significativo efeito pedagógico multiplicador, prevenindo a repetição da actuação ilegal da Administração em casos análogos. É aqui que reside a maior parte do peso da sua magistratura de influência.

    Quanto ao seu segundo ponto, concordo com o que afirma na parte final, quanto à necessidade de divulgação dos meios de defesa graciosos ao dispor dos cidadãos e de reforço das componentes de formação cívica no sistema de ensino. Dito isto, mantenho integralmente o que afirmei: a existência de pedidos sem fundamento ou para os quais o provedor é incompetente apenas aponta para um grau de desconhecimento de quem recorreu e nada revela sobre a utilidade da função de provedor. Desde logo, porque muitos dos casos em que não houve intervenção do provedor se reconduzem a casos de falta de fundamento da queixa e não de incompetência do provedor para conhecer a queixa (que se limitam a 2,2% dos casos). Nestes casos, os cidadãos compreenderam a função do provedor e recorreram à sua magistratura de influência. Só não tinham razão. Assim como não teriam se tivessem recorrido hierarquicamente ou se tivessem impugnado judicialmente a decisão em causa.

    Finalmente, quanto às suas dúvidas no comentário #8, não conhecendo o teor dos pedidos infundados não me poderei pronunciar cabalmente. Contudo, daí não retiro logicamente qualquer necessidade de rever as competências do provedor: queixas e pedidos sem fundamento é algo que não falta na actividade de qualquer órgão da administração. Daí que as suas questões finais quanto ao índice de descontentamento venham precisamente confirmar o que comecei por dizer: esse é um problema que respeita não à caracterização das funções do provedor, mas sim à eventual falta de informação de quem se queixa…

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  17. 24 Março, 2009 11:06

    Eu pensava que a relevância e importância dos Ombudsmen (que recebeu em Portugal a tradução Provedor) já estava mais que comprovada desde os anos 60, quando a figura apareceu nas democracias nórdicas. Pelos vistos enganei-me.

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  18. 24 Março, 2009 16:59

    #17 Bloom:

    Pois está. A questão é que mesmo institutos que têm relevância em tese, podem perdê-la, em concreto, quando, porventura, desconhecidas, mal conhecidas ou quando elas próprias funcionam ou mal ou aquem do que potencialmente poderiam fazer! E o que se discute é isso mesmo, e não a “ratio” do Ombudsmen, em tese!

    PS – (note – não digo, nem deixo de dizer, que esse será o caso em Portugal! Por isso, é que a discussão surgiu, para tentar perceber….)

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