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um sentido de humor assinalável

7 Dezembro, 2010
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O Nuno Santos Silva, num exercício de humor necessariamente voluntário, elencou aquilo que considera serem os “condicionalismos constitucionais” à liberdade contratual, no âmbito das relações de trabalho dependente, previstas no texto da nossa Constituição. Com uma ironia surprendente, ele transcreve o artigo 59º, nº 1 da Constituição (1. Proibição de discriminação em função da idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas; 2. Impossibilidade de renúncia à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade; 3. Organização do trabalho em condições socialmente dignificantes; 4. Impossibilidade de renúncia das condições de higiene, segurança e saúde na prestação do trabalho; 5. Impossibilidade de renúncia ao repouso, ao descanso semanal e às férias; 6. Impossibilidade de renúncia à assistência material em situação de desemprego; 7. Impossibilidade de renúncia à assistência e justa reparação em situações de acidente de trabalho ou de doença profissional) e por aí se fica. Apesar de eu ser um apreciador do bom humor, sobretudo na versão nonsense em que o Nuno Santos Silva parece ser especialista, não quero deixar de aproveitar a oportunidade que ele me proporcionou para lhe acrescentar mais algumas coisas à lista:

 

“CAPÍTULO III
Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores


Artigo 53.º
Segurança no emprego

 É garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.

 

Artigo 54.º
Comissões de trabalhadores

1. É direito dos trabalhadores criarem comissões de trabalhadores para defesa dos seus interesses e intervenção democrática na vida da empresa.

2. Os trabalhadores deliberam a constituição, aprovam os estatutos e elegem, por voto directo e secreto, os membros das comissões de trabalhadores.

3. Podem ser criadas comissões coordenadoras para melhor intervenção na reestruturação económica e por forma a garantir os interesses dos trabalhadores.

4. Os membros das comissões gozam da protecção legal reconhecida aos delegados sindicais.

5. Constituem direitos das comissões de trabalhadores:

a) Receber todas as informações necessárias ao exercício da sua actividade;
b) Exercer o controlo de gestão nas empresas;
c) Participar nos processos de reestruturação da empresa, especialmente no tocante a acções de formação ou quando ocorra alteração das condições de trabalho;
d) Participar na elaboração da legislação do trabalho e dos planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector;
e) Gerir ou participar na gestão das obras sociais da empresa;
f) Promover a eleição de representantes dos trabalhadores para os órgãos sociais de empresas pertencentes ao Estado ou a outras entidades públicas, nos termos da lei.

 

Artigo 55.º
Liberdade sindical

1. É reconhecida aos trabalhadores a liberdade sindical, condição e garantia da construção da sua unidade para defesa dos seus direitos e interesses.

2. No exercício da liberdade sindical é garantido aos trabalhadores, sem qualquer discriminação, designadamente:

a) A liberdade de constituição de associações sindicais a todos os níveis;
b) A liberdade de inscrição, não podendo nenhum trabalhador ser obrigado a pagar quotizações para sindicato em que não esteja inscrito;
c) A liberdade de organização e regulamentação interna das associações sindicais;
d) O direito de exercício de actividade sindical na empresa;
e) O direito de tendência, nas formas que os respectivos estatutos determinarem.

3. As associações sindicais devem reger-se pelos princípios da organização e da gestão democráticas, baseados na eleição periódica e por escrutínio secreto dos órgãos dirigentes, sem sujeição a qualquer autorização ou homologação, e assentes na participação activa dos trabalhadores em todos os aspectos da actividade sindical.
4. As associações sindicais são independentes do patronato, do Estado, das confissões religiosas, dos partidos e outras associações políticas, devendo a lei estabelecer as garantias adequadas dessa independência, fundamento da unidade das classes trabalhadoras.

5. As associações sindicais têm o direito de estabelecer relações ou filiar-se em organizações sindicais internacionais.

6. Os representantes eleitos dos trabalhadores gozam do direito à informação e consulta, bem como à protecção legal adequada contra quaisquer formas de condicionamento, constrangimento ou limitação do exercício legítimo das suas funções.

 

Artigo 56.º
Direitos das associações sindicais e contratação colectiva

1. Compete às associações sindicais defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem.

2. Constituem direitos das associações sindicais:

a) Participar na elaboração da legislação do trabalho;
b) Participar na gestão das instituições de segurança social e outras organizações que visem satisfazer os interesses dos trabalhadores;
c) Pronunciar-se sobre os planos económico-sociais e acompanhar a sua execução;
d) Fazer-se representar nos organismos de concertação social, nos termos da lei;
e) Participar nos processos de reestruturação da empresa, especialmente no tocante a acções de formação ou quando ocorra alteração das condições de trabalho.

3. Compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei.

4. A lei estabelece as regras respeitantes à legitimidade para a celebração das convenções colectivas de trabalho, bem como à eficácia das respectivas normas.

 

Artigo 57.º
Direito à greve e proibição do lock-out

 1. É garantido o direito à greve.

2. Compete aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender através da greve, não podendo a lei limitar esse âmbito.

3. A lei define as condições de prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis.

4. É proibido o lock-out.

TÍTULO III
Direitos e deveres económicos, sociais e culturais

CAPÍTULO I
Direitos e deveres económicos


Artigo 58.º
Direito ao trabalho

 
1. Todos têm direito ao trabalho.

2. Para assegurar o direito ao trabalho, incumbe ao Estado promover:

a) A execução de políticas de pleno emprego;
b) A igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do sexo, o acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais;
c) A formação cultural e técnica e a valorização profissional dos trabalhadores.Artigo 59.º
Direitos dos trabalhadores1. (…)2. Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente:

a) O estabelecimento e a actualização do salário mínimo nacional, tendo em conta, entre outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas, as exigências da estabilidade económica e financeira e a acumulação para o desenvolvimento;
b) A fixação, a nível nacional, dos limites da duração do trabalho;
c) A especial protecção do trabalho das mulheres durante a gravidez e após o parto, bem como do trabalho dos menores, dos diminuídos e dos que desempenhem actividades particularmente violentas ou em condições insalubres, tóxicas ou perigosas;
d) O desenvolvimento sistemático de uma rede de centros de repouso e de férias, em cooperação com organizações sociais;
e) A protecção das condições de trabalho e a garantia dos benefícios sociais dos trabalhadores emigrantes;
f) A protecção das condições de trabalho dos trabalhadores estudantes.

3. Os salários gozam de garantias especiais, nos termos da lei.”

17 comentários leave one →
  1. será's avatar
    será permalink
    7 Dezembro, 2010 14:22

    o direito ao trabalho é um direito complexo,mas diferente daquele direito à felicidade da constituição americana, esse de densificação cristalina para os ruis a.

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  2. lucklucky's avatar
    lucklucky permalink
    7 Dezembro, 2010 14:29

    Como se vê na lista os Patrões não têm direito à Greve. Só um lado é que tem.
    .
    Não há direito nenhum à felicidade na Constituição Americana.
    .
    “As associações sindicais são independentes … dos partidos e outras associações políticas. Pois.”

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  3. será's avatar
    será permalink
    7 Dezembro, 2010 14:53

    no preambulo da const. eua fala-se em ´estabelecer a justiça, assegurar a tranqüilidade interna, prover a defesa comum, promover o bem-estar geral, garantir para nós e para os nossos descendentes os benefícios da Liberdade’
    a doutrina fala em direito à felicidade,mal ou bem.
    mas essa canhestra constituição tem pérolas destas:
    Não haverá, nos Estados Unidos ou em qualquer lugar sujeito a sua jurisdição, nem escravidão, nem trabalhos forçados, salvo como punição de um crime pelo qual o réu tenha sido devidamente condenado.

    emenda XIII

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  4. rui a.'s avatar
    rui a. permalink
    7 Dezembro, 2010 14:59

    Não é a “doutrina” homem de Deus! Nem “bem” nem “mal”. É a Declaração de Independência, do Jefferson. Isto de se falar do que não se sabe dá nisto.

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  5. será's avatar
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    7 Dezembro, 2010 15:03

    eh eh eh

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  6. Por outra's avatar
    Por outra permalink
    7 Dezembro, 2010 15:05

    Um cidadão citizen dos USA tem esse direito à sua felicidade, instituído por lei, é verdade, que ainda lá seja matar-se, da forma que seja, como lhe apeteça, que ninguém tem que ver com isso, nos USA.
    Nós, cá, sem instituirmos tão genuína liberdade, sem a impedirmos, embora, em nenhum caso, assentamos que não seria injustiça deixar-se aos patrões a capacidade de supervisar o momento preciso em que tais e tais cidadãos trabalhadores deveriam sujeitar-se a abate sem justa causa, sem mais.

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  7. será's avatar
  8. joao's avatar
    joao permalink
    7 Dezembro, 2010 15:16

    Resposta ao Por Outra quando pensamos que só os outros é que são maus e se matam :
    “Portugal com maior taxa de homicídio da Europa Ocidental Com 2,15 homicídios por 100 mil habitantes, Portugal surge como o país com a mais alta taxa de homicídios da Europa Ocidental em 2006, segundo estatísticas do Departamento de Drogas e Crime das Nações Unidas, que apresenta uma lista com dados de 74 países de todo o mundo.

    18.02.2009 – Por Mariana Oliveira Jornal O Público”

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  9. Nuno Santos Silva's avatar
    7 Dezembro, 2010 15:28

    Caro Rui A.,
    Em que aspecto os artigos relativos às organizações de trabalhadores têm que ver com a liberdade contratual entre trabalhador e empresário?
    Quanto à proibição do despedimento sem justa causa, que efectivamente é um condicionalismo à liberdade contratual que não referi, o mesmo não tem conteúdo constitucionalmente definido; como sabe, o conteúdo foi sendo preenchido ao longo dos anos pela jurisprudência e doutrina, e o seu conteúdo é provavelmente mais “pesado” do que deveria ser. Mas a necessidade de estabilidade contratual (neste e nos outros contratos, seja de fornecimento de bens, seja de empreitada, etc.), ou de não sujeição dos contratos de trabalho às flutuações de humor de uma das partes, implica a existência de uma justa causa para a dissolução unilateral. O que nos traz à greve, que é uma suspensão violenta dos deveres contratuais de uma das partes e que – por isso mesmo – apenas deve ser utilizada em último recurso e sempre numa perspectiva racional de que o melhor para o trabalhador é o melhor para a empresa e vice-versa.
    As limitações constitucionais à liberdade contratual devem assim funcionar como uma barreira civilizacional para prevenir o eventual “abuso de posição dominante” de uma das partes da relação contratual.

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  10. PAULO CESAR's avatar
    PAULINHO permalink
    7 Dezembro, 2010 16:10

    Prefiria que eu não tivesse direito ao trabalho.

    http://www.informartins.wordpress.com

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  11. Nuno Branco's avatar
    7 Dezembro, 2010 18:03

    Nos EUA tem-se direito à PROCURA da felicidade e não à felicidade propriamente dita. São coisas bastante distintas.

    “Life, liberty and the pursuit of happiness”

    E já agora, esta frase está na declaração de independência e não na constituição.

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  12. ricardo's avatar
    ricardo permalink
    7 Dezembro, 2010 18:05

    Com tantos direitos e salvaguardas o que se faz a alguém que quer receber o ordenado mas não produz o suficiente para o justificar? Ou que pelo seu comportamento prejudica e empresa e os colegas que querem trabalhar? Ou que se revela incompetente e desleixado?
    A quem fala em trabalhadores eu digo que não há dois trabalhadores iguais e que cada pessoa tem um mérito diferente e capacidade diferente e que há muitos que não merecem o que ganham (desde o porteiro ao administrador) e há outros que mereciam muito mais do que ganham.
    Estes que ganham mais do que merecem é que são os exploradores que vivem à custa dos outros defendidos por lei.

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  13. uma qualquer's avatar
    uma qualquer permalink
    7 Dezembro, 2010 18:53

    bem , percebi que o estado me proibe de trabalhar , pelo menos 82 dias por ano. mesmo que eu rogue por tudo ao meu patrao por precisar mesmo do dinheiro e passar bem sem ferias e com uma folga por mes enquanto durar o aperto. o sehor ate alinhava , escusava de contratar outra pessoa pras faltas , poupava uns cobres em ss e seguros. mas o estado nao deixa, que e que se ha-de fazer?

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  14. rui a.'s avatar
    rui a. permalink
    7 Dezembro, 2010 23:48

    Prezado Nuno,
    Antes de mais, as minhas desculpas por só agora lhe responder, mas – sem ironias – passei todo o dia a trabalhar.
    Quanto à questão que coloca, o despedimento por justa causa – que a lei e não apenas a jurisprudência e a doutrina define taxativamente -, ele é, a meu ver, o maior impedimento à liberdade contratual e ao crecimento do emprego. O salário mínimo é, como também já escrevi, um impedimento sério ao desenvolvimento de um mercado de trabalho de primeiro emprego e de emprego precário, muitíssimo útil numa sociedade desenvolvida e economicamente desenvolvida. Veja, por exemplo, o que sucede nas grandes metrópoles do mundo, como São Paulo, e analise as dezenas de empregos que são criados a partir de ordenados baixos, a maior parte em tempo reduzido, que empregam milhares de jovens, desempregados ocasionais e reformados com renda baixa. Verá que são um verdadeiro benefício social, que abre portas a outras oportunidades, em vez de mandar os jovens e os desempregados para as bichas do subsídio de desemprego ou do rendimento mínimo. Quanto ao resto do que lhe transcrevi você encontrará um pouco de tudo, mas sempre com a mesma tónica classista e marxista da protecção dos «eexplorados» em relação ao patronato «explorador»: os sindicatos e ass suas prerrogatigas de negociação colectiva, as limitações ao tempo de trabalho, as protecções dos trabalhadores estudantes e por aí fora. Tudo isto são, na verdade, mecanismos que inibem a liberdade contratual e, consequentemente, a reduzem em vez de a aumentar.
    Cumprimentos cordiais,

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  15. PMP's avatar
    PMP permalink
    7 Dezembro, 2010 23:56

    Outra vez o Sr. Rui A. defender a eliminação do salario minimo como principio macro-economico, sem querer perceber os efeitos nefastos a longo prazo que isso traz, ao reduzir a procura total numa economia estagnada e que está a destruir emprego.
    .
    Na cidade de S.Paulo e no Brasil a economia está a crescer a 8% ao ano e o emprego cresce muito.
    São situações muito diferentes ou até opostas.

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  16. rui a.'s avatar
    rui a. permalink
    8 Dezembro, 2010 00:20

    «Na cidade de S.Paulo e no Brasil a economia está a crescer a 8% ao ano e o emprego cresce muito.»
    Ai sim? E será por quê?

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  17. PMP's avatar
    PMP permalink
    8 Dezembro, 2010 11:51

    Sr. Rui A.,
    .
    A economia cresce devido ao aumento da procura total.
    Tem de tentar entender ou aceitar a seta da causalidade senão a economia, que é altamente dinâmica e complexa, nunca faz sentido.
    .
    No Brasil a procura externa está a subir (exporta matérias primas) e a interna também (consumo, investimento e o estado todos a contribuir).

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