Telómeros (políticos) ou “Portugal 2020” *

“Os nossos genes e os nossos telómeros não ditam necessariamente o nosso destino”. Quem o diz é o Professor Ornish, um médico e investigador norte-americano que liderou um estudo científico, recentemente publicado numa revista da especialidade.

Ora, mas o que é que são os ditos telómeros? E o que é que o referido estudo concluiu? Os telómeros estão na ponta dos cromossomas humanos e, de certo modo, são os responsáveis pela preservação do nosso material genético. O envelhecimento está relacionado com a degradação e com a diminuição dos ditos telómeros. À medida que se vão deteriorando, o nosso material genético vai sendo concomitantemente afetado; vamos morrendo. Porém, o referido estudo pôde observar e concluir que esse processo de degradação dos telómeros foi retardado em homens que mudaram radicalmente o respetivo estilo de vida. No fundo, a comprovação científica de que uma vida mais saudável e descansada, tem mesmo consequências… Enfim, “deitar cedo e cedo erguer” não só “dá saúde e faz crescer”, como, pelos vistos, retarda o nosso envelhecimento. Mais: afinal, não vivemos ditatorialmente subjugados pelos nossos genes; o livre arbítrio existe mesmo e, também, com capacidade para trocar algumas voltas ao relativo determinismo da natureza. Pelo menos será estimulante pensar-se assim! A divulgação deste estudo, na imprensa (p.ex., “Público”, 17.09.13) entusiasmou-me. Por vezes, há, no nosso dia-a-dia, pequenos grandes pormenores, normalmente imprevistos, que têm esse efeito, animando-nos e pondo-nos bem-dispostos! Penso que, politicamente, dever-se-ia prestar atenção à saga dos telómeros.

Se o Estado e as Instituições funcionam como telómeros da nossa sociedade, então, a classe política tem uma especial responsabilidade enquanto catalisadora privilegiada dessa parte das nossas células, do nosso estado de vida. Talvez excessivamente entusiasmado e otimista com o estudo e a supra transcrita frase de Ornish, detetei, também esta semana, aquilo que parece ser um sinal de mudança, de “responsabilidade política telomérica”. A proposta feita pelo Governo, em Bruxelas, do próximo “QREN” (agora denominado “Portugal 2020”), prevê que a quase totalidade do investimento através dos fundos da União seja feito, no período de 2014-2020, nas quatro regiões mais empobrecidas e oneradas com o flagelo das nossas assimetrias regionais. Assim, Norte, Centro, Alentejo e Açores deverão receber cerca de 93% da totalidade daqueles fundos (21 mil milhões de Euros). Simultaneamente, prevê-se uma aposta prioritária na formação das pessoas e no estímulo à economia, através das PME’s (ou seja, da nossa economia real) e não nas obras públicas… Como a procissão ainda não saiu sequer do adro, esperemos que essa proposta não se desvirtue com algum P.I.N ou outro qualquer “gene” centralista do costume…

* GRANDE PORTO (semanário), sexta-feira, 20.09.13