A constante mutação, numa geografia em perpétua reformulação
Sem esquecer também a “regeneração permanente” (esta linguagem de dermo-cosmética é um bocadinho pirosa) e a “possibilidade de contágio” mas chegados ao fim a senhora ministra quer dizer o quê neste texto que publicou hoje no PÚBLICO?
«Questionar-se o apoio do Estado à regeneração permanente do processo criativo (que exige o seu processo próprio de experimentação) é colocar em causa a criação, pura e simplesmente. Satisfazer-se com os cânones determinados pelos intermediários do circuito do objecto artístico é abdicar da possibilidade de contágio que cada nova criação contém. Os cânones da arte querem-se em constante mutação, numa geografia das artes em perpétua reformulação.
Mas isto é tão verdade para quem questiona a pertinência dos méritos da criação contemporânea como para quem a faz. Também nos criadores se observa, por vezes, a tentação por cânones nascidos de vanguardas extintas. Às vezes por dogmatismos, outras vezes por cansaço, e outras vezes por subestimação dos públicos, que, contrariamente ao que se julga, estão cada vez mais disponíveis para se surpreenderem. Aos artistas se pede total inconformismo na criação, e se pede aquilo que não se pode pedir a mais ninguém – que criem, que corram riscos. Pelo contacto com a arte, diversa, plural, descomprometida e ultrapassando-se em cada nova incursão no desconhecido, o público sai enriquecido, mesmo que seja apenas com novas questões e novas inquietações – das questões surge a busca pelas respostas e é na demanda que se faz caminho, não na chegada ao destino.
A velha querela que habitualmente distingue as políticas culturais de direita das de esquerda, e que assenta na importância da preservação do Património para uns e na aposta na criação para outros, na verdade, não faz sentido. Basta olharmos para as políticas culturais dos outros países europeus, de ambos os lados do espectro político, e concluímos que nem a esquerda negligencia o Património (em Portugal, estamos a assistir a uma progressiva regeneração silenciosa neste domínio, mas como “as pedras não falam” não se tem dado por isso), nem a direita se atreve frontalmente a menorizar a criação, como princípio (como poderia?). O que alguma direita portuguesa sofre é de um temor indisfarçável pela liberdade absoluta que a arte comporta, e resiste a ela porque a teme. Por isso, argumenta a favor dos cânones, para a rebater.
Dito isto, a repartição dos apoios do Estado às artes surge secundária neste debate. Serve apenas de mote para a discussão, esta sim verdadeiramente ideológica (será eventualmente uma das poucas questões ideológicas que subsistem na discussão política) – entrámos num domínio que está para além dos princípios neo-liberalistas que se perfilam, e que é mais profundo do que a simples decisão sobre por onde repartir o orçamento da Cultura: estamos na discussão pura e dura sobre a liberdade da criação, e se ela deve, ou não, ser subsidiada pelo poder.
A obrigação do Estado, num governo socialista, é garantir a liberdade, a pluralidade, a diversidade, a memória, o passado e o futuro da nossa identidade cultural – património herdado e aquele que queremos legar, em permanente regeneração.
Essa é a grandeza e imprescindibilidade da arte – porque corresponde à dimensão e diferenciação de cada um dos seus criadores, como pessoa única e livre que cada um é.
Haverá riqueza maior do que esta?» Gabriela Canavilhas. Ministra da Cultura
Esta “regeneração permanente” atinge o seu paroxismo quando se expõem poios de m. num local público, como “arte”. É disso que a Canavilhas fala, mesmo em sentido metafórico?
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Ou se financiam e projectam filmes mudos, sem imagem. Como já aconteceu.
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Gosto de Lou Reed, como artista e compositor musical, por causa do que fez nos Velvet Underground e a solo ( Coney Island Baby, por exemplo, de 76). É um artista da tal “regeneração” e acompanhou marginalidades de costumes.
No entanto, em 75 publicou um disco que intitulou Metal Machine Music cujo interesse artístico se resumia à capa. O som era pura e simplesmente ruído. A música pode ser isso, ou seja, a sua contradição?
Há quem diga que sim: os da tal “regeneração”.
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A senhora falará sempre nessa linguagem?
Estou mesmo a ouvi-la:
Olha querido, eu exijo o teu processo proprio de experimentação. Olha que eu não me satisfaço com os cânones determinados pelos intermediários do circuito
Aqui na cama eu quero os cânones em constante mutação, numa geografia das artes em perpétua reformulação.
Gosto da coisa diversa, plural, descomprometida e ultrapassando-se em cada nova incursão
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Isto é paleio para justificar tachos em vez de defesa do Património.
Mas o que eu gostei mais foi dos “públicos cada vez mais disponíveis para se surpreenderem”.
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“Não busques pensamentos esquisitos,
Em denegridas nuvens embrulhados;
Não tragas, não, metáforas violentas,
Imitando esse corvo do Mondego,
Que entre os cisnes do Tejo anda grasnando;
Usa da pura língua portuguesa
Que aprendido já tens no bom Ferreira,
No Camões imortal, um Sousa e Barros.”
Correia Garção
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Isto só tem uma explicação: a cultura está pela hora da morte!
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O que a socialista-ministra quer dizer está aqui mais clarificado por um dos tais malvados defensores “dos princípios neo-liberalistas que se perfilam” (tem tudo que ver com a distribuição das telas, dos pincéis e das tintas pelos burocratas):
…
O que importa aqui é conhecer um pouco o funcionamento do mercado de arte sob o regime socialista da antiga União Soviética e como ele floresceu finalmente na Europa a partir de 1989. A primeira coisa a ressaltar é que os pintores eram assalariados do Estado. Assim, tanto o gênio artístico quanto o pintor medíocre recebiam praticamente o mesmo valor mensal. Afinal, sob o socialismo, há poucas diferenças salariais. Se houvesse um “Rembrandt” na URSS, ele jamais ficaria rico. Aliás, seu salário não seria muito superior a de um pintor de paredes…
Alguns artistas conseguiam aumentar a renda de forma indireta, recebendo cupons que davam acesso a lojas exclusivas, ou mesmo direito de utilizar uma dacha, ou casa de campo, nos arredores de Moscou. Mas esses privilégios não eram obrigatoriamente um reconhecimento. Ao contrário, decorriam de boas relações com a burocracia do Partido Comunista. Nesse tempo, não havia qualquer relação entre reconhecimento artístico e remuneração. Muitos pintores sem nenhuma capacidade tiveram obras encomendadas para exposições públicas (até permanentes) graças a vínculos pessoais com algum burocrata que muitas vezes não tinha a menor noção sobre arte. Por outro lado, grandes artistas sem relações políticas se viram relegados e só agora, graças à abertura para o Ocidente, estão sendo consagrados. Muitos desses artistas já morreram e seus herdeiros negociaram suas obras sem conhecimento necessário, vendendo-as a preços extremamente baixos. O sistema soviético deixou o melhor da produção artística sem ser comercializada e o que terminou em exposições permanentes nas cidades russas e nas demais repúblicas que compunham a URSS não é o que melhor se produziu.
Mas o artista não dependia só do salário do Estado. O burocrata também fornecia as telas, pincéis e as tintas. E aí, mais uma vez, entravam as relações pessoais. Um dissidente dificilmente seria admitido como artista. Aqueles que se tornavam dissidentes podiam simplesmente ser excluídos da profissão. Nesse caso, significaria abandonar o ofício, pois o Estado controlava o material de pintura. Aqueles artistas não favorecidos pela burocracia recebiam material para pintar de péssima qualidade. Assim, hoje se encontram obras-primas pintadas sobre telas de má qualidade, quando não em cima de cartolina ou de compensado. São trabalhos de artistas dissidentes ou então daqueles que não conseguiam (ou sabiam) cair nas graças de um burocrata. As galerias de arte estão fazendo o possível para salvar da deterioração esses trabalhos, através de restaurações. Mas estima-se que um número incalculável de obras foram perdidas por falta de conservação.
…
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É apenas a extensão a este ministério da prática já instalada noutros (com especial destaque para o das Obras Públicas) da distribuição das encomendas “graças a vínculos pessoais com algum burocrata”.
Os amanhãs deixaram de cantar apenas e passaram a pintar, dançar, representar, fazer projectos, e por’i adiante…
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Ops! Esqueci-me do linque do texto transcrito parcialmente no meu primeiro comentário. Aqui fica agora:
http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:NmtigdLfVwAJ:www.institutoliberal.org.br/conteudo/download.asp%3Fcdc%3D967+socialismo+arte&cd=10&hl=pt-PT&ct=clnk&gl=pt
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Há quem não saiba e por outro lado quem saiba demasiado bem de onde vem toda esta ideologia.
Vem daqui, desta utopia dançante e permanente que nos oferece canções como esta cujo refrão transcrevo:
Je voudrais, sans la nommer,
Vous parler d’elle.
Bien-aimée ou mal aimée,
Elle est fidèle
Et si vous voulez
Que je vous la présente,
On l’appelle
Révolution permanente.
A Canavilhas conhece esta cançoneta de cor, aposto. Gostava de saber por onde andou na sua juventude revolucionária…
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IH! IH! IH!
intelectualismo bacoco, snob e pedante…
típico de cabeças ocas…muito palradoras
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