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Nada disto importa, tudo isto é fado

25 Setembro, 2019

Impostos mais baixos é uma ideia excitante. Crescimento económico também, apesar de não me excitar tanto como a outros por se tratar de uma mera corrida inevitavelmente perdida atrás de dívida estratosférica sem qualquer reserva real de valor, só de uns números num jogo de monopólio em economês que não têm qualquer relação com o esforço do sapateiro ou do marceneiro em meter comida na mesa. Contudo, não é nada disso que vai a eleições. O que vai a eleições é o grau de conformidade dos portugueses a um modelo global de corrida atrás da própria cauda. Longe vão os clusters estratégicos, os empreendorings e os grandes desígnios nacionais: não há desígnios nacionais onde apenas há a tragédia que é definhar com a UE ou definhar mais ainda sem a UE. Quando uma civilização está em colapso, constroem-se pirâmides. Como tal, votamos no indivíduo que melhor nos assegure que amanhã não pareça particularmente pior que hoje.

Deixamos de ter filhos: é um problema real, pelo menos para mim, que espero envelhecer rodeado de brincadeiras de crianças. Consideramos condicionar velhos doentes para que desamparem a loja, poupando despesa: é um problema real, que espero envelhecer e não andar aqui a chatear ninguém sem sequer saber que o faço. Consideramos construir casas de banho para acomodar construções mentais que fizemos para dissociar biologia de preferência sexual e esta da individualidade de cada um: é um problema para mim, que quero poder ter uma vida sexual em privado, sem que o estado me coloque etiquetas de identificação. Assimilamos a previsão de Nietzsche da morte de Deus: é um problema real, pelo menos para mim, que fico desprovido do formalismo da autoridade, com o risco desta ser açambarcada por seitas rousseaunistas que a atribuem à abstracção “estado”, algo que é inerentemente absoluto (não há “um bocadinho de autoridade”, há autoridade ou não há). Engolimos a treta cientóide das alterações climáticas baseados em modelos apocalípticos em busca do colmatar de um sentimento de culpa renovado previamente atribuído ao “privilégio do homem branco”: para mim é um problema real, dada a quantidade de africanos puritanos que a Europa recebe impedindo a beleza da mini-saia ou do mui laissez-faire topless. Inventamos “polígrafos” e outros códices da verdade absoluta: para mim é um problema, que a busca da verdade absoluta é a própria tragédia da condição humana, coisa que sou (humano, isto é). Banimos livros porque uns bonecos aparecem a pinar com outros, não vá um miúdo deixar o YouPorn para ir a uma biblioteca ver tamanha badalhoquice: para mim é um problema, que a liberdade de publicar seja o que for é sagrada (na vossa casa, não na minha, idiotas, é sempre bom reforçar). Podia continuar por aqui fora.

Infelizmente, não vamos votar para resolver o que descrevi no segundo parágrafo. Assim sendo, para o que descrevi no primeiro, só me ocorre como solução para o jogo a opção de não participar nele.

Também sei que tinha dito que não voltaria a escrever até acabar a febre das eleições. Que seja então essa a promessa quebrada que têm contra mim. De volta à caverna.

9 comentários leave one →
  1. 26 Setembro, 2019 01:42

    No geral concordo consigo. Só que a alma Lusitana exige morrer a defender os nossos valores e não a repousar na Caverna (será a de Platão?)

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  2. Weltenbummler permalink
    26 Setembro, 2019 09:11

    acaba quando tiverem os pulmões cheios de cavernas

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  3. Martim Moniz permalink
    26 Setembro, 2019 10:16

    “Só que a alma Lusitana exige morrer a defender os nossos valores e não a repousar na Caverna”——————————————– E onde existe hoje essa alma?na Beira baixa?em Lisboa e afins não a vejo há bastantes anos(mesmo os que não alinham activamente com os “valores modernos” andam passivamente a assistir à decadência total).

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    • 26 Setembro, 2019 10:36

      No Nuorte Carago! Do Mondego para cima, calma silenciosa tal como sempre foi desde a Idade Média mas que acorda e ataca em Ourique, tomada de Lisboa, Aljubarrota, Restauração, defesa dos Franceses de Bonaparte no Buçaco e nos campos a cortar as linhas de abastecimento desde a Espanha conquistada por eles, Mapa cor de rosa (Harggg!!!) ou no 28/05/1926 …

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      • Os corruptos que se cuidem permalink
        26 Setembro, 2019 12:22

        Era bom, era. Mas os portugas foram bem amolecidos pela canalhada. Acho que a derradeira reacção vai acontecer mesmo mas só quando a moirama lhes começar a violar as filhas (como em Espanha agora) e a atacar em toda a parte. Aí, os tugas acordam e reagem. Os políticos já não os fazem reagir.

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  4. Jornaleca permalink
    26 Setembro, 2019 20:10

    O crescimento económico é muito importante.
    Só que a esquerda nada percebe do mesmo.
    A prova empírica demonstra sempre o mesmo resultado.
    Quando a carroça anda à frente dos bois, nada funciona (bem muito tempo).

    Uma “sociedade” que adora a tal ciência (como um religião, e muito pior ainda), e que ao mesmo tempo dela nada percebe, não merece um futuro risonho.

    E só saber censurar a liberdade de expressão, e contrariar as blasfémias, nada ajuda. Os hereges só gostam fazer escárnio dos outros, mas não aguentam o mesmo dos outros. Ergo?

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  5. André Silva permalink
    26 Setembro, 2019 21:49

    Um dos melhores textos de sempre. Deveria ser leitura e análise obrigatória a partir do 10.º ano e em todos os cursos universitários.
    Muito, muito, obrigado, Vítor Cunha.

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  6. JCA permalink
    27 Setembro, 2019 17:32

    .
    Hoje nem concordo nem discordo,
    .
    nem os ‘profs catedraticos tão provincianos que para se incharem com razão ajoelham altar estrangeiros, mesmo que dentro da terra destes sejam corridos a pontapé pelos locais ou o tão amador no caso de Tancos numa misturada de ‘elites catedraticos/advogados/juízes/generais’
    ,
    nem o certíssimo teórico advogalês sobreposto ao ‘Politico aos Políticos, A justiça à Justiça’, mas nenhum sabe o que é o Politico nem o exatamente Justiça confluentes a gosto na ‘pororoca’ demolidora do teórico das leis dos ‘políticos’ que domina a Politica e simultaneamente a Justiça tão longe do pensamento racional e matemático mais perfeito e muito mais povo que o Direito que totalitariza e proíbe o Politico, mas isso são outras conversas ..
    .
    (quiçá tretas dos enjeitados do salazarismo na lua das efemérides, nem invoco o complexo de Edipo desses gajos relativamente ao Salazar que mal ou bem sempre os meteu no bolso, sabia mais a dormir que eles acordados, só meteu àgua nos fins civilizacionais e no totalitarismo et pour cause ..)
    ,
    acrescento apenas o que somos hoje Setembro de 2010, sec XXI do povo genético forjado desde o sec XI batido nesta treta toda,:
    .
    das autonomias
    .
    dos meus beirões que apanham tortulhos na serra, dos pátios de mato com o quartilho de sardinha assada ou o caçoilo de chanfana com morangueiro (o mais exótico vinho a nível mundial, e proibido desde 1928 pelos demais vinhos ‘de marca’ portugueses),
    .
    da rapaziada da Serra da Estrela das sopas de castanhas ou ortigas, o queijo e as mantas da lão das ovelhas da serra, os minhotos do verde tinto da serra de Agra que não presta se não deixa a malga bem borrada, a lampreia ou a das tripas enfarinhadas
    .
    do pessoal da beira interior das cerejas e do bacalhau cozido em bom azeite, os campinos do Ribatejo se o boi chora com o ferro não presta para um churrasco digno, os alentejanos do gaspacho e da bolota para o presunto do porco preto, os algarvios dos xerens, das conquilhas, das laranjas e do lingueirão,
    .
    dos açorianos do leite com malaguetas e do soalho de junco bem cheiroso, os madeirenses do vinho de cheiro com espetadas e estrelícias,
    .
    .
    o Povo Português racionalmente não vota em branco. Seja formado na Primaria no Secundarão ou no Universitário, salvo as raras excepções dos interessados no mais no mesmo relacionarias ao desenvolvimento e ao Portugal impor-se no mundo por criatividade e o rasgo genético dos Descobrimentos que ora continuam a proibir como Salazares/Marcelos-Caetanos totalitários.
    .
    E votam abstenção em vez de votarem em branco porquê ?
    .
    Simples, não têm garantia democrático que 3 ou 4 de Partidos (e pagos) garantam à porta fechada um boletim em branco não apareça com uma cruzinha que não existia. Funciona aqui outra vez a genética do Português, do manguito. Proíbem a transparência a 100% no boletim de voto, ou há quadradinho onde quem vota em barnco mete lá a cruzinha ou então a conferencia dos votos tem de ser publica, o eleitorado que queira vai lá a vigiar a contagem. Argumentos contra ?
    .
    Nem o Povo percebe que não haja Democracia, transparência ou liberdade nem que não seja mais do mesmo de Salazar ou Caetano que os palco se arranhavam contra …. mas afinal acabam por fazer o mesmo ….. E não há crise o Sistema continuaria na mesma mas menos amadoristamente ‘à padeiro?
    .
    E agora outra vez o quê ?
    .
    Respeito as decisões legais mas não estou de acordo.
    .

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