Urina na caverna ou o primeiro crítico segundo Mel Brooks
O meu último post originou um comentário curioso.
Rui Veloso parece-me mais um Tony Carreira para betos.
É curioso porque porque não sei quem é o vilão da frase. Serão os betos? Será o Tony Carreira? Será o Rui Veloso? Soa-me a uma comparação em tudo idêntica a “António Costa é o xerife de Nottingham dos esquimós”; ou ainda a “Cristiano Ronaldo é o Michael Jordan dos manetas”.
Como em Portugal é costume dizer mal de tudo, principalmente por aqueles que não metem o pescoço no cepo para apresentar alguma coisa, expondo-se o seu trabalho a um desdém pelos que em nada se sujeitam à humilhação pública, este tipo de frases sai constantemente, como um incentivo a que qualquer pessoa criativa se entregue mas é ao silêncio. Aquilo que vulgarmente se designa como pérolas a porcos.
Nunca estive num espectáculo em que não aplaudisse efusivamente os intervenientes. Eles estão lá em cima, num palco, a dar o seu melhor, e eu quero mostrar-lhes que aprecio o esforço, a dedicação e a coragem de se apresentarem em público. Tanto faz serem os Rolling Stones como a banda de garagem com instrumentos desafinados. Eu não tenho que gostar, mas aprecio o empenho e sinto obrigação moral de aplaudir alguém que, no mínimo tenta, em média consegue, comunicar com alguém. O Tony Carreira é um excelente intérprete. É um caso de sucesso, por mérito próprio, quer no cuidado com a produção, quer na capacidade de fidelizar um público que aprecia imensamente o seu trabalho. Não é tipo de canção que vos atrai? Não tem mal, mas escusais de desdenhar aqueles a quem as canções de Tony Carreira algo dizem.
Às tantas, se passássemos mais tempo a aplaudir o esforço dos que conseguem, de facto, tocar pessoas anónimas com o seu esforço, e menos a afagar o nosso ego sobranceiro de crítico, o país não seria a trampazinha que é. Até porque, já se sabe, quem sabe fazer, faz; quem não sabe vai para crítico ou professor.
Je suis Tony Carreira. E a parte do beto dou completamente de barato.
Aplaudo de pé este post.
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Apesar dos meus gostos musicais estarem nos antípodas de Tony Carreira (e já agora Rui Veloso), concordo em absoluto com o que foi dito. Qualquer processo de criação consome um pouco do seu criador e só por isso merece o nosso respeito.
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Porto Sentido é um retrato romântico do Porto, e provavelmente a melhor canção portuguesa de sempre.
O Anel de Rubi é a história mais elegante e sentida de um desgosto.
Etc.
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Curioso choradinho do pobre artista.
No caso da maioria dos artistas, que são mesmo pobres, consigo partilhar do sentimento do post: há que dar valor a quem se expõe, a quem tenta, etc. Mas quando falamos de artistas e entertainers consagrados que ganham milhões, isto soa ingénuo, para não dizer otário.
Tony Carreira é um cantor medíocre que mama há décadas numa carneirada de fraco gosto, muita dela emigrante e sôfrega por historietas como as que ele finge cantar, e como a que inventou para si próprio: contos de sofrimento e perseverança. Os filhotes já mamam na mesma teta.
Entertainers de topo como ele têm vastas equipas que lhes tratam de tudo, das viagens ao marketing, dos contratos milionários ao Auto-Tune, das melodias estafadas às letras que sacam daqui e dali. “Fidelizar o público” não me parece só por si digno de louvor; qualquer traficante tem público fiel.
Rui Veloso pode realmente ser o Tony dos betos. Daqueles betos entradotes, geralmente bem de vida, que parecem saídos dum anúncio do BES.
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Tony Carreira, apesar de, indubitavelmente, cantar pouco, pilhar músicas (más) e letras (piores), e viver de um público com escasso gosto, é, de facto, um excelente profissional, que contrata e paga a excelentes músicos e técnicos, para produzir espectáculos (que, sendo, para mim, horrorosos) têm uma execução irrepreensível (tive de gramar com um da janela do meu escritório), e são pagos por quem lá vai (ou vá, pela Sonae), e não pelos contribuintes. Assim, sendo este blog liberal, não se percebem as críticas contra um empresário que fez muito do pouco que a natureza lhe deu e não depende da teta pública para nada. Quanto ao Rui Veloso, tendo gasto várias das minhas primeiras semanadas no “Ar de Rock”, não estou em condições de o criticar objectivamente. Gostei, deixei de gostar, voltei a gostar, agora não gosto. Já quem não considera o Carlos Tê um dos melhores autores da língua portuguesa nos últimos 40 anos, tem ainda menos gosto do que uma fã do Tony Carreira.
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Nada contra as letras de Tê; Veloso é que é um choninhas, um beto, uma seca. Talvez alguns o vejam ainda pelos olhos da juventude. Mas para mim sempre foi uma seca.
Tony Carreira já deve ter mamado mais na teta pública do que toda a família Soares, em centenas de concertos pagos por câmaras por todo o país, fora comícios e afins.
Os liberocas têm uma reverência bacoca aos ‘empresários de sucesso’, seja o que for que estes façam. São os heróis da fábula capitalista com que gostam de sonhar, onde atrás de cada fortuna há sempre, não um crime como constatou Balzac, mas esforço e mérito.
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Por pouco me pareceu neste seu post, que estava a ler as mariquices sentimentais de um manifesto wokista de um adolescente, a quem lhe foi negado os pronomes e as experiências emotivas do seu fantasiado género e do seu grupo woke identitário.
E não há dúvida nenhuma que isso era o que as bandas músicais em grande medida na altura providenciavam aos adolescentes. Talvez isso explique a sua semelhante reação .
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Temos cientista social.
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Temos crítico .
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Bom post.
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O mundo das artes causa sempre este tipo de discussão, porque só se consegue atribuir real valor à obra uns bons anos após a criação. Um bom exemplo disso será até o Rui Veloso que atualmente beneficia essencialmente do período criativo dos primeiros anos de carreira, ou de uns Xutos & Pontapés que atualmente não são mais que uma empresa/banda de tributo a eles próprios. Outro bom exemplo é o artista “Emanuel”, sugiro o visionamento do documentário “O Pimba é Nosso” para perceber que 99% do que se faz na música é trabalho.
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Pois eu já tive ganas de metralhar pelo menos o encenador.
Uma pessoa dana-se toda para, ao fim de uns anos, se ir deliciar com um Nabucco de Verdi produzido num lugar reputado, à espera de encenação deslumbrante e coros vibrantes.
E depois leva nas trombas com uma estética Varsóvia 1942, nazis e prisioneiros, e parecia que estavam a cantar à fome e chateados por terem perdido o telemóvel.
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